Denúncias abalam confiança de clientes e açougues, diz sindicato

Advogados explicam como os comerciantes devem se defender em casos de compra de carne deteriorada e se é possível ser ressarcido de encalhes do produto

Fátima Fernandes
21/Mar/2017
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Denúncias abalam confiança de clientes e açougues, diz sindicato

Sem citar números, proprietários de açougues e supermercados afirmam que houve queda nas vendas de carnes em razão do farto noticiário a respeito da operação Carne Fraca, que investiga ações  de corrupção de agentes fiscais e irregularidades sanitárias em frigoríficos

Manuel Henrique Farias Ramos, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Carnes do Estado de São Paulo, entidade que representa cerca de 6,8 mil açougues, diz que os comerciantes estão preocupados com a queda do consumo já no final de semana.

Ramos afirma que os estabelecimentos formam a clientela com base na confiança. Sem ela, aumenta o risco de fechamento. Cada açougue fatura, em média, R$ 400 mil por ano.

Da mesma forma, os açougues compram carnes dos frigoríficos com base na confiança, uma vez que não podem avaliar o processo de produção das carnes.

“O que aconteceu agora é que foi colocada uma dúvida na nossa confiança em relação aos frigoríficos e na confiança dos consumidores em relação aos açougues” diz Ramos.

Os açougues trabalham mais com carnes frescas, que chegam quase diariamente para serem desossadas, com prazo de validade de aproximadamente três dias.

A orientação do sindicato é para que os comerciantes não comprem, ao menos por enquanto, carnes embaladas, e se limitem a adquirir produtos com o carimbo do SIF (Serviço de Inspeção Federal).

O sindicato deve pedir à Vigilância Sanitária que faça auditorias até mesmo em produtos com com o carimbo do SIF. Essa é a única forma, de acordo com Ramos, de o consumidor voltar a confiar na qualidade da carne que consome.

A confusão que a operação da Polícia Federal causou no mercado, diz ele, pode, porém, ter um efeito positivo para quem comercializa e consome carnes no Brasil.

“Há um rigor na fiscalização da produção de carnes que seguem para o exterior que não existe em relação às destinadas ao mercado interno. Pode ser que essa situação mude agora”, diz ele.

É preciso também, de acordo com Ramos, que os agentes que fazem as fiscalizações nos frigoríficos sejam independentes, não estejam ligados às empresas, como acontece hoje. "Os fiscais são cedidos pelos frigoríficos. Isso não pode mais acontecer”, afirma.

SUPERMERCADOS

 Os supermercados também não divulgaram números sobre o impacto da operação Carne Fraca nos negócios. Mas é possível dizer que algum efeito, mesmo que mínimo, houve.

Carrefour, Walmart e Pão de Açúcar foram a público para informar que estão pedindo esclarecimentos para os frigoríficos sobre a qualidade das carnes e que possuem programas de monitoramento da qualidade dos produtos que comercializam.

A ação tem como objetivo tranquilizar os consumidores e evitar redução de vendas de carne, produto que já havia sido afetado com a crise econômica que o país enfrenta.

No sábado (18/03), na seção de carnes de uma das lojas do supermercado Covabra, em Jundiaí, no interior paulista, alguns clientes estavam em dúvida se compravam ou não bandejas de carnes variadas que estampavam a marca Friboi, da JBS.

A reportagem do Diário do Comércio constatou que alguns deles foram até a seção, observaram as carnes, mas desistiram da compra.

No supermercado Futurama, da Lapa, os clientes buscavam no final de semana esclarecimentos sobre a qualidade e a origem dos produtos.

“Por enquanto, o que observamos, é que o consumidor está muito mais cuidadoso na hora de comprar carnes e embutidos”, diz Antônio Ferreira de Sousa, gerente da loja. "Não percebemos uma queda de consumo."

Lojistas afirmam que vão aguardar um pouco mais para verificar se a operação Carne Fraca vai resultar em prejuízo de vendas ao longo do mês.

Joel Oliveira, dono do açougue Paraguassú, localizado no bairro de Perdizes, disse que na sua loja ocorreu um movimento contrário: um aumento entre 10% e 15% nas vendas no último final de semana, na comparação com o final de semana anterior.

NO AÇOUGUE PARAGUASSÚ, SUBIU O CONSUMO DE CARNES ESPECIAIS

Oliveira atribui esse movimento ao fato de trabalhar com carnes especiais, que adquire dos frigoríficos Better Beef e Mondelle. Por questões comerciais, ele não trabalha há algum muito tempo com a empreas JBS.

Oliveira diz que toda a semana ele vai ao frigorífico no interior escolher as carnes que comercializa. As clientes sabem disso e, por esta razão, a loja foi beneficiada.

As carnes que vende custam até 30% mais que as comercializadas em supermercados.

RESPONSABILIDADES

O que os comerciantes podem fazer se a clientela sumiu do açougue desde sexta-feira (17/03) e o estoque de carnes encalhou? É possível reclamar com o fornecedor e pedir o valor pago de volta e ainda uma indenização por dano de imagem?

O Diário do Comércio entrevistou dois advogados especializados em Direito empresarial. Veja o que eles disseram:

Jarbas Andrade Machioni, presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB- SP

“É possível devolver a carne, sim, se estiver estragada, e pedir o valor pago de volta. É possível também pedir uma indenização, se o lojista entender que a imagem do seu estabelecimento foi abalada.

O artigo 927 do Código Civil cita que aquele que praticar ato ilícito é obrigado a indenizar a vítima. Esse artigo vale para qualquer relação privada, e pode ser aplicada neste caso.

MACHIONI, DA OAB: PRECAUÇÕES

Se o comerciante tem dúvida em relação ao produto que adquiriu, deve chamar a vigilância sanitária e pedir para que analisem as carnes, até para evitar uma situação ruim em uma eventual fiscalização em seu estabelecimento.

É bom prevenir, pois, com a força das redes sociais, essa situação envolvendo as carnes pode crescer, prejudicando os açougues, as churrascarias, os supermercados.”

Arystobulo Freitas, advogado na área empresarial  

“O comerciante deve, primeiramente, verificar se fez a compra de algum frigorífico que está envolvido na operação. Se fez, deve entrar em contato com a empresa e pedir explicações sobre os produtos, o que já estão fazendo as grandes redes de supermercados.

Se houver algum sinal de que a carne que ele comprou não tem qualidade, a primeira ação é pedir um laudo sobre o produto e fazer uma reclamação formal para a empresa, pedindo a devolução de dinheiro.

Se a carne for boa, só resta reclamar com a Polícia Federal, que falhou na comunicação da operação. Nem toda carne tem problema.

FREITAS: RISCO DE PREJUÍZOS

Se não vender o que comprou porque o consumidor cortou o consumo, terá de descartar o produto ou fazer doação, caso a carne não tenha problema.”

LEIA MAIS: Europa quer cortar a importação de carnes de empresas investigadas

FOTOS: Fátima Fernandes/ Diário do Comércio

 

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