Varejistas que ensinam e inspiram
Na NRF Big Show três empresas mostram como se diferenciam por meio de estratégias de fidelização, novos serviços e hospitalidade
A convenção anual da National Retail Federation, em Nova York, sempre inclui inúmeras histórias de varejistas novos ou estabelecidos.
Essas experiências compartilhadas são um dos maiores aprendizados para os mais de 30 mil participantes do evento.
O Diário do Comércio mostra alguns dos cases mais interessantes exibidos na NRF 2017. Marque esta página, pois ela vai ser atualizada constantemente durante os três dias do evento.
GAMESTOP: UM NOVO CONCEITO DE FIDELIDADE
Mike Mauler, presidente da rede de lojas de videogames Gamestop, descreveu a importância central do seu programa de fidelidade – que vai além do acúmulo de pontos e troca por prêmios.
FACHADA DA GAMESTOP. FOTO: DIVULGAÇÃO
Segundo Mauler, a ideia do programa Power Up é monitorar a relação com os 50 milhões de inscritos de forma mais próxima, para entender suas necessidades, atendê-los de forma mais personalizada e eventualmente abrir novos negócios – um deles, criado há cinco anos, deve chegar a US$ 1 bilhão em 2019.
A Gamestop é a maior rede de varejo de jogos eletrônicos do mundo, com sete mil lojas nos Estados Unidos, na Europa e na Austrália.
A empresa começou vendendo consoles e jogos, mas hoje, dos US$ 8 bilhões de receitas anuais, US$ 500 mil vêm de um novo tipo de loja, dedicado a produtos relacionados à cultura pop e geek - como bonecos de desenhos animados e séries de TV.
A ideia para as novas lojas, diz Mauler, surgiu graças a informações colhidas juntos aos consumidores, que queriam mais diversidade de produtos além dos videogames tradicionalmente vendidos pela empresa.
O experimento começou na Austrália e foi um sucesso absoluto. As lojas Zing, que já chegam a 80, e o site ThinkGeek, adquirido em 2015, ajudaram a diversificar a clientela da empresa, tradicionalmente composta por homens jovens – no novo negócio, 65% dos clientes são mulheres ou famílias.
“A força do nosso programa de fidelidade não está simplesmente na coleta de informações e entrega de prêmios”, diz Mauler.
“Inclusive, os pontos não podem ser trocados por nada fora dos Estados Unidos. Mesmo assim, observamos um grande envolvimento dos nossos consumidores.”
A Gamestop usa as informações coletadas pelo programa Power Up para, por exemplo, avisar um gamer que seus jogos velhos podem ser vendidos (a empresa tem um negócio substancial de venda de usados).
Cerca de um terço dos emails da empresa são abertos, uma taxa altíssima quando se consideram os índices de resposta desse tipo de comunicação.
A Gamestop também já colheu mais de 1 milhão de respostas para pesquisas realizadas com seus clientes.
THE VITAMIN SHOPPE: DE VENDEDORES A CONSELHEIROS
A The Vitamin Shoppe, rede de lojas de suplementos alimentares fundada há 40 anos em Nova York, está passando por uma profunda transformação.
Colin Watts, CEO e “entusiasta-de-saúde-chefe” da empresa, falou no Big Show 2017, o evento da federação nacional do varejo americano, sobre a mudança de perfil de suas lojas.
“Saúde e bem-estar sempre estiveram associados a regimes e exercícios da moda. Mas, hoje, esses temas fazem parte da vida de todos”, diz Watts.
Isso vai da comida que escolhemos no supermercado ou nos restaurantes a ideias associadas a qualidade de vida e consumo consciente.
“É um estilo de vida que está virando uma obsessão, como os celulares e a internet banda larga.”
Ao mesmo tempo em que a vida saudável passou a ser parte integral do nosso dia-a-dia, os produtos tradicionalmente vendidos pela The Vitamin Shoppe estavam virando commodities.
“Queríamos deixar de ser vendedores de comprimidos e fórmulas em pó e sermos vendedores de soluções”, afirma Watts.
A empresa então decidiu tornar-se uma espécie de consultoria de saúde.
O negócio ainda é vender vitaminas e suplementos, é claro, mas a abordagem está passando por uma mudança radical.
Quem já procurou se informar sobre as alternativas existentes no mercado certamente procurou parentes, amigos ou informações na internet.
“Isso significa que faltam fontes confiáveis de informação”, disse Watts.
A ideia é que as mais de 500 lojas de rede se transformem em centros de bem estar.
A primeira unidade piloto conta com um bar de kombucha (uma bebida fermentada de origem japonesa), uma estação para que os clientes provem suplementos esportivos e consultores em nutrição.
A ideia é que os consumidores tenham uma experiência mais completa na loja. A The Vitamin Shoppe quer fazer com as lojas de suplementos o mesmo que a rede Starbuck fez com os cafés.
UNION SQUARE HOSPITALITY GROUP: ESPECIALISTA EM HOSPITALIDADE
Quem vem a Nova York e não experimenta pelo menos um dos restaurantes de Danny Meyer, o fundador e presidente do Union Square Hospitality Group, não sabe o que está perdendo.
Não só porque a comida é excelente, mas também porque Meyer, há 30 anos um dos restaurateurs mais celebrados da cidade, tem a reputação de abrir casas com serviço impecável.
Em uma das principais capitais da gastronomia do mundo – com 26,5 mil restaurantes – , é uma distinção com significado especial.
Meyer fez a apresentação final do segundo dia do Big Show, o evento anual da associação dos varejistas americanos.
Restaurantes não são exatamente o foco do evento, mas Meyer é um dos grandes especialistas dos Estados Unidos quando o assunto é hospitalidade, o que, no caso do varejo, pode ser entendido como atendimento.
“Estou cansado de ouvir que hospitalidade tem a ver só com restaurantes e hotéis”, disse Meyer.
“As pessoas esperam hospitalidade em todos os lugares a que vão.”
Meyer disse que a receita para um bom negócio no seu ramo de atuação é muito simples. São somente dois os ingredientes: 49% de produto e 51% de hospitalidade.
Com relação ao produto, Meyer disse que a tendência mais importante no mundo dos restaurantes hoje em dia é a edição.
“Damos opções demais para os clientes. É melhor escolher algumas poucas coisas e fazê-las extremamente bem.”
Num mundo de abundância de produtos e escolhas, a ideia de que uma loja tenha um ponto de vista, nas palavras de Meyer (ou uma boa curadoria, como se ouve muito no Big Show), pode fazer toda a diferença.
Evitar a comoditização é parte importante dos 49%, mas é claro que só isso – além de produtos de boa qualidade – não vai garantir o sucesso. Aí entram os 51% da hospitalidade.
Para Meyer, tudo começa com o respeito pelos funcionários. Uma das chaves é procurar pessoas que tenham habilidades emocionais que as permitam se sentir felizes quando servem bem.
“Gosto de pedir um exercício para os meus garçons. Na hora de levar a conta para a mesa, imaginem que a comida e a bebida foram de graça. O cliente está pagando apenas pelo serviço.”
Outra iniciativa de Meyer diz respeito à gorjeta. Os restaurantes americanos têm uma cultura particular: o salário dos garçons é muito baixo, e boa parte da remuneração vem das tips.
Meyer lidera um movimento para acabar com a gorjeta em seus restaurantes (em seis deles, uma taxa fixa de serviço é aplicada à conta).
Segundo Meyer, a ideia tem dois objetivos. O primeiro é tornar mais justa a remuneração dos funcionários (os cozinheiros, por exemplo, não dividem o bolo das caixinhas no fim do dia).
O segundo é incentivar as pessoas a crescer. “Em muitos restaurantes, um bom garçom ganha de 20% a 30% mais que o gerente. Por que ele vai querer ser promovido?”
Tudo isso tem impacto direto na experiência – ou no serviço, no atendimento, na hospitalidade.
“Você não vende só produtos. Você vende para o cliente a sensação de que ele faz parte de algo”, afirmou Meyer.
Das lojas mais exclusivas às de preço mais baixo, a expectativa dos clientes é sempre a mesma: “As pessoas querem se sentir amadas”.
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