Inflação leva Selic a 14,25% ao ano, maior patamar em nove anos

Esta foi a sétima alta consecutiva dos juros, mas pode ser a última de 2015, segundo avaliação de economistas. A atual taxa já é nociva para o comércio

Rejane Tamoto
29/Jul/2015
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 Inflação leva Selic a 14,25% ao ano, maior patamar em nove anos

A inflação ainda alta e os riscos de que continue ainda resistente levaram o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), a elevar a taxa básica de juros (Selic) para 14,25% ao ano. 

A alta de 0,50 ponto percentual (p.p.) foi a sétima consecutiva - levando a taxa ao maior patamar em nove anos. A autoridade monetária deixou explícito em seu comunicado que este pode ser o último aumento de 2015, o que representaria um alívio para empresas e consumidores. 

"Avaliando o cenário macroeconômico, as perspectivas para a inflação e o atual balanço de riscos, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic em 0,50 p.p., para 14,25% a.a., sem viés", diz o comunicado do Banco Central.

O comitê informou na mesma nota que entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficientemente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no final de 2016.

Para o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, o texto sinaliza que a autoridade monetária deve manter a Selic nessa faixa até pelo menos o primeiro trimestre do ano que vem. 

O comunicado sugere o fim do ciclo de alta de juros, na avaliação do economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. 

"A palavra 'manutenção' sugere que não sobe mais, 'por período suficientemente prolongado' sugere que vai demorar para cair e, por fim, o 'é necessária' não elimina eventual retomada do ciclo de alta, mas indica fortemente que o próximo passo após um 'período suficientemente prolongado' é a redução dos juros", escreveu Gonçalves em relatório.

O texto fará a economista e sócia da Tendências Consultoria Integrada, Alessandra Ribeiro, rever suas estimativas para a Selic deste ano. Ela projetava o aumento de 0,50 p.p. (já feito) e mais uma alta de 0,25 p.p. na reunião de setembro. "Com esse comunicado devemos mudar e esperar a manutenção dos 14,25% ao ano", afirmou.

A elevação da Selic veio em linha com o que os analistas do relatório Focus do Banco Central esperavam. Na última edição da pesquisa, o consenso era de que a Selic encerraria 2015 em 14,25% ao ano, ou seja, no atual patamar. 

Para o presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), Alencar Burti, a elevação da Selic vai levar a mais aumentos na dívida pública. 

A opinião é compartilhada pelo ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Luís Eduardo Assis. "O que se paga de juros sobre a dívida por mês é maior do que se gasta com o Bolsa Família ao longo de um ano", diz Assis.

Outro efeito negativo, apontado por Burti, surtirá nas finanças públicas - já que os juros altos inibem o consumo e a atividade das empresas e por consequência, há uma queda na arrecadação.  

"Consideramos que a revisão da meta de superávit fiscal afetou negativamente as expectativas dos agentes econômicos, mas que a recessão levará à redução da taxa de inflação, conforme já sinalizam os indicadores futuros”, afirma Burti.

A INFLAÇÃO E SEUS RISCOS

O que justifica uma alta tão forte dos juros, em plena recessão, são os riscos de aumento da inflação daqui para frente. Para ter uma ideia, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, a inflação oficial) chegou a 8,89% em 12 meses encerrados em junho. 

A cada semana, o relatório Focus aumenta a projeção para o índice no fim deste ano - que já está em 9,23%. A projeção elaborada pelo Banco Central em março era de 9% no fim de 2015.

O Banco Central é o responsável por assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda. E, agora, já não conta mais com o apoio do governo para atingir esse objetivo. 

Isso porque o governo reduziu a meta de superávit primário de 1,13% para 0,15% do PIB (Produto Interno Bruto, soma de bens e serviços produzidos no país). 

O superávit é a economia que o governo faz - depois de gastos e receitas - para pagar a dívida pública. Por causa da queda na arrecadação e do aumento nas despesas públicas neste ano, não conseguirá cumprir uma meta maior para ajustar essas contas, que terminaram o ano passado no vermelho. 

Com as contas desequilibradas, há ainda a possibilidade de que esse déficit ocorra novamente no encerramento deste ano. É como a pessoa que sempre paga os 15% de pagamento mínimo da fatura do cartão de crédito: entra em uma bola de neve financeira.

O ajuste no consumo do governo tem um efeito estrutural no comportamento da inflação.

"A situação do Banco Central hoje se aproxima muito da época do primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998). O governo tinha déficit fiscal, como temos hoje, e baixou a inflação somente com o aumento de juros", diz o economista da ACSP, Emílio Alfieri. 

Em dezembro de 1998, a Selic chegou a 19%. A consequência disso foi o aumento da dívida pública - já que o governo remunera seus títulos com a Selic. 

"Naquela época, o governo pediu ajuda ao Fundo Monetário Internacional, reajustou o câmbio e aumentou os impostos para voltar a ter superávit. Hoje não temos condição de ter novo aumento de impostos e ainda há o Congresso ameaçando a aprovar projetos que aumentam mais os gastos", avalia o economista.

O Banco Central subiu os juros olhando também para os riscos no cenário futuro. Um deles está no dólar, que subiu 5% desde a semana passada por causa do anúncio da redução da meta fiscal. O dólar valorizado eleva os preços não só de importados, mas também dos produtos brasileiros. 

A moeda norte-americana pode passar por novos repiques de alta por causa de fatores internos e externos. Dependerá do que vai ocorrer com a nota de risco de crédito (rating) brasileira, que será revisada pelas agências de classificação de riscos internacionais. 

E também da elevação dos juros nos Estados Unidos, previsto para ocorrer já em setembro, segundo o Fed (Federal Reserve, banco central norte-americano), que também se reuniu nesta quarta-feira (29/07). 

REMÉDIO AMARGO AFETA EMPRESAS

Burti, presidente da ACSP e Facesp, no entanto, lamenta que a decisão tenha sido tomada sem considerar todos os indicadores econômicos que mostram que o país já está em recessão. "Essa alta somente agravará a situação das empresas e dos trabalhadores, com queda mais acentuada das vendas e aumento do desemprego", diz.  

O remédio amargo dos juros, na opinião do professor do MBA do Insper, Otto Nogami, não surtirá mais tanto efeito na redução da demanda e do consumo - que já caiu em razão da crise e seus desdobramentos, como queda na confiança e elevação do desemprego. 

Para a economia real, o efeito é negativo porque desestimula as empresas a investir e gastar. "O lado perverso do aumento dos juros é que as empresas terão de cortar gastos fixos, inclusive a mão de obra disponível que não está sendo produtiva no momento", afirma Nogami. 

Quem também considera que quem mais vai sofrer nesse cenário são as empresas é o sócio-diretor da Méthode Consultoria e professor de finanças da ESPM, Adriano Gomes. O aumento da Selic sinaliza que os juros do crédito dos bancos devem continuar subindo, o que eleva o custo financeiro das empresas.

"O paradoxo disso é que as empresas, se quiserem sobreviver, terão de repassar os custos, inclusive financeiros, para os preços de seus produtos e serviços. E isso gera inflação", afirma Gomes. 

Segundo ele, o repasse é uma questão delicada e nada simples - já que deve levar em consideração não só a manutenção de clientes, mas a saúde financeira da empresa. 

Análise da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade) mostra que a taxa de juros média para linhas contratadas por empresas subirá 0,74 ponto percentual, para 61,40%. 

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) avalia que a alta da Selic deve retrair ainda mais a atividade industrial e aprofundar a recessão. "Os juros altos encarecem o capital de giro das empresas, inibem os investimentos e desestimulam o consumo das famílias", critica a CNI, em nota.

Foto: Thinkstock
*Com informações de Estadão Conteúdo

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