Índice de Tendência de Consumo-FGV: 2025 será pior, mas não de todo ruim

Ricardo Meirelles de Faria, responsável pelo indicador, diz que a economia caminha em velocidade acima do potencial por causa da dívida pública crescente

Edson Rossi - DC News
27/Dez/2024
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Publicado em primeira mão pela AGÊNCIA DC NEWS, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), acaba de sair a segunda edição do Relatório Tendências do Varejo e de seu Índice de Tendência de Consumo (ITC) – indicador que alia projeções de comportamento do setor varejista em correlação a dados macroeconômicos.

O levantamento é preparado pelo professor Ricardo Meirelles de Faria, do Centro de Excelência de Varejo da Fundação Getulio Vargas (FGVcev). Nos cálculos, o ITC cairá de 4,23% (2024) para 1,16% (2025).

“O pilar da conjuntura econômica permanece bastante acelerado, e esse cenário teria gerado somente efeitos positivos não fosse a incapacidade do lado da oferta de atender a toda essa demanda”, afirmaram Meirelles e Maurício Morgado, que é coordenador do FGVcev, na introdução do documento. “Em termos técnicos, a nossa economia caminha em velocidade acima do potencial.” O motivo? Uma dívida pública que só cresce devido aos elevados déficits fiscais, primário e nominal.

Como acontece a todo crescimento artificialmente acelerado, uma hora a bolha estoura e a freada chega. Não se trata mais de ‘se’, mas de ‘quando’ e ‘como’ o freio virá. Em resumo, o varejo vai sentir saudade de 2024 e precisa estar pronto para os desafios de 2025.

Segundo Meirelles, o ano que se encerra será lembrado pela renda farta, desemprego em queda recorde, crédito abundante, desembocando num nível de atividade agregada, o PIB, crescendo 3% no ano, nas projeções. “Não é pouca coisa”, disse Meirelles. O problema é a qualidade desse crescimento e seu preço para o ano que vem. Com Selic a 12,25% e projeção de novas altas ao longo de 2025, o juro real esperado é de 8,5%. “As implicações para o varejo serão desafiadoras. Com um custo do crédito tão elevado, tanto para empresas quanto consumidores, há possíveis impactos sobre emprego, inadimplência e endividamento.”

Para Meirelles, o primeiro e maior desafio do ano que vem é conseguir gerar um consenso nacional quanto ao “corte de gastos públicos, subsídios, penduricalhos e privilégios” capazes de conduzir a trajetória do resultado primário do setor público para a estabilidade. Ele faz um paralelo do déficit público com a contabilidade empresarial. “O déficit primário representaria o Ebit do setor público”, disse. “Quando se inclui nesse resultado primário as despesas de juros, temos o resultado nominal.”

No último indicador divulgado pelo Banco Central, ele está em 9,52% em relação ao PIB, patamar que Meirelles diz estar “fora de base para qualquer economia razoavelmente ajustada”.

A seguir, as principais conclusões da segunda edição do relatório, que é dividido em quatro grandes blocos: Varejo Restrito, Varejo Ampliado, Contas Nacionais e Índice de Tendência de Consumo (ITC).

 

1.VAREJO RESTRITO

“Deverá fechar o ano com crescimento bastante expressivo, na casa de 4,52%, pouco acima de nossa previsão anterior (relatório de outubro), de 4,18%, e também superior ao acumulado em 12 meses até outubro, divulgado pelo IBGE, de 4,4%. É mais de três vezes o crescimento médio dos anos de 2020 a 2023. Para 2025, entretanto, nossa projeção é de que o varejo restrito encerre o ano em 1,7%. Nada mal frente aos grandes desafios a serem enfrentados – ligeiro aumento do desemprego, redução da massa de renda das famílias, aumento da inadimplência e do nível de endividamento. O alerta também se acende em relação ao nível de endividamento das empresas varejistas e o montante de recursos despendidos com pagamentos de juros.”

Hiper & Supermercados, Alimentos & Bebidas e Fumo – “Este setor tem peso de aproximadamente 54% na composição do varejo restrito e 32% na estrutura do varejo ampliado. No acumulado em 12 meses encerrado em outubro, o crescimento é de 5,2%. Projetamos fechar o ano em 4,6%. Para 2025, crescimento de 1,2%. Isoladamente, apenas no recorte Hiper & Supermercados a previsão é de alta de 5,2% (2024) e de 1,6% (2025).”

Artigos Farmacêuticos & Afins – “Representa 9,33% das vendas do comércio varejista restrito. A conjuntura econômica de 2024 fará o setor encerrar o ano com 14,4% de crescimento. Para 2025, +8,3%.”

Combustíveis & Lubrificantes – “Com forte desempenho recente, nossas projeções para o ano passaram de queda de 3,39% (relatório de outubro) para queda de 2,05%. Para 2025, projetamos crescimento de 0,5 ponto porcentual.”

Equipamentos de Escritório, Informática & Comunicação – “O setor representa 1,43% na composição do varejo restrito. Desde 2020, o crescimento é pequeno, o que é bastante preocupante dada a importância do setor para a melhoria de desempenho das empresas. Para este ano, prevemos variação positiva de 0,7% e de 1,05% para 2025.”

Livros, Jornais, Revistas & Papelaria – “Deve encolher 7,47% em 2024. Para 2025, elevação de 1,07%. O segmento representa hoje 0,33% das vendas do varejo restrito.”

Móveis & Eletrodomésticos – “O setor representa 7% do volume de vendas do varejo restrito. Deve fechar o ano com +4,4% e para 2025 espera-se crescimento de metade desse valor: 2,3%.”

Outros Artigos de Uso Pessoal & Doméstico – “Apesar do nome meio genérico, representa 9,68% do varejo restrito – terceira maior participação, atrás apenas de Hiper-Supermercados, Fumo, Alimentos & Bebidas e de Combustíveis & Lubrificantes. Deve fechar 2024 com +6,32% e quase estabilidade em 2025: -0,33%.”

Tecidos, Vestuário & Calçados – “Deve encerrar o ano com crescimento real de 2,71%. Para 2025, estimamos alta ainda mais robusta, de 6,4%. Em certa medida, efeito atrasado do crescimento mais forte da renda e emprego neste ano.”

 

2.VAREJO AMPLIADO

“Estimamos em R$ 3,05 trilhões a receita operacional líquida do comércio varejista restrito nos últimos 12 meses encerrados em outubro. Já o segmento Veículos-Motos-Partes & Peças fica na casa de R$ 740 bilhões. As estimativas para o tamanho do segmento de material de construção são mais difíceis, mas chegaríamos a um montante R$ 316 bilhões. O setor de varejo ampliado estaria, então, em R$ 4,1 trilhões. Mas ambos os segmentos do varejo ampliado (Material de Construção e Veículos-Motos-Partes & Peças) irão enfrentar um ambiente macroeconômico menos amigável em 2025. De todo modo, frente ao crescimento forte nos dois últimos meses divulgados, setembro e outubro, revisamos nossas estimativas para 2024 de 3,5% para 4,6%. Já para 2025, revisão foi de 0,24% para 1,45%. De forma separada, para a Construção projetamos crescimento de 4,86% em 2024 (ante 3,4% da projeção de outubro). Para 2025, nossos modelos econométricos projetam alta de 2,5%. E Veículos-Motos-Partes & Peças projetamos crescimento de 14,9% (era de 11,32% no primeiro relatório). Para 2025, 2,4%.”

 

3.CONTAS NACIONAIS

PIB – “O PIB do último trimestre cresceu 4,1% em relação ao mesmo trimestre de 2023 e 2,1% em relação ao segundo trimestre deste ano. No acumulado nos últimos quatro trimestres, atingiu 3,1%. Nosso modelo econométrico estima que o ano se encerre em 3,0%. Para 2025, um crescimento irrisório de 0,33%. Seria um grande banho de água fria.”

Consumo das Famílias – “No acumulado do ano, o crescimento é de 5,1%, quase o que projetamos para o ano fechado: 5,2%. No ano que vem, cairá para +0,7%. As razões para esse arrefecimento viriam de: redução no ritmo de crescimento dos auxílios assistenciais, forte aumento no custo do crédito, diminuição no ritmo de crescimento da renda das famílias e diminuição, pequena, mas existente, do volume de pessoas ocupadas – a taxa de desocupação fecharia 2025 em 7,7%.”

Consumo do Governo – “A participação do consumo do governo na composição da demanda agregada cresceu quase 1 ponto porcentual ao longo do atual governo, mas é menor do que o final do governo Dilma, Temer e início do governo Bolsonaro. O ritmo de crescimento nos últimos quatro trimestres desacelerou, de 3,5% no segundo trimestre para 2,9% no terceiro. No ano de 2024, acreditamos que o consumo do governo terá crescido 1,73%. Para 2025, uma quase estabilidade, com crescimento de parcos 0,10%.”

Comércio & Serviços – “O indicador de Comércio ganhou participação no PIB desde o início do século, saindo de pouco menos de 8% para os atuais 10,3%. Já o setor de Serviços representa 59,3% (na divulgação do terceiro trimestre de 2024 no acumulado dos quatro últimos trimestres). Para o Comércio, projetamos crescimento de 3,46% (2024) e estabilidade para 2025. Para o setor de Serviços projetamos crescimento de 3,89% (2024) e 0,47% (2025).”

 

4.ÍNDICE DE TENDÊNCIA DE CONSUMO (ITC)

O Índice de Tendência de Consumo (ITC-FGVcev) é, como afirma Meirelles, “a busca incessante por uma boa correlação entre varejo e variáveis macroeconômicas”. O ITC é uma média ponderada das principais variáveis macroeconômicas que influenciam o setor – a) evolução da massa de renda das famílias, b) crédito à pessoa física (deflacionado pelo IPCA), c) confiança dos consumidores, d) pelo nível de endividamento das famílias. Para 2024, o ITC será de 4,23%. Para 2025, de 1,16%.

Renda/Desemprego – “Nossos modelos econométricos apresentam projeção pessimista da evolução da renda agregada a partir 2026, utilizando-se de uma amostra longa dos últimos 20 anos. Em 2024, a massa de rendimento real deve fechar com crescimento de 7,8%. Boa parte dele vem como consequência da eclosão da pandemia em 2020, quando houve a necessidade de uma forte política fiscal através de auxílios aos agentes econômicos dos mais diversos tipos. Tal política se ampliou no governo Lula. Em 2025, tanto o ritmo de expansão fiscal quanto expansão no crédito deverão ser contidos, via política monetária bastante restritiva. A massa de renda mensal ao longo de 2025 deve crescer 1,5%. Quanto ao desemprego, a pergunta é se chegamos ao bottom line. A taxa de desocupação atingiu um recorde de baixa – na série metodológica atual iniciada em janeiro de 2012 –, de 6,2% no trimestre encerrado em outubro. Para o final de 2025, projetamos elevação de 1,5 ponto, fechando o ano em 7,7%, patamar próximo ao do início de 2024.”

Crédito – “O ritmo de crescimento do crédito à pessoa física, em termos reais – deflacionado pelo IPCA – tem sido bastante expressivo ao longo dos últimos cinco anos, representando um acréscimo de mais de R$ 1 trilhão em valores de agosto de 2024, representando 5 pontos porcentuais do PIB, chegando a 33% em agosto. Mas a política monetária em 2025 será extremamente restritiva. De acordo com nossos modelos, o crédito deflacionado fechará este ano em +6,72%. Para 2025, estimamos crescimento de 4,65%, ritmo ainda forte, fruto de uma eventual inércia no ritmo de contenção da oferta de crédito.”

Confiança do Consumidor – “O índice medido pelo FGV Ibre se encontra muito próximo do patamar 100 da data base de 7 de julho de 2010. Houve duas quedas fortes – na grande crise de 2015 e 2016 (60 pontos) e na crise pandêmica (55 pontos). É importante ressaltar que o indicador não mostra uma grande evolução nos dois últimos anos, mesmo que os indicadores macroeconômicos de emprego e renda tenham se mostrando muito positivos em 2024. O cenário mais adverso para 2025 nos faz estimar uma redução de 2,54% no índice em 2025 frente ao patamar de final de 2024.”

Endividamento/Inadimplência – “Quais seriam as implicações macroeconômicas e setoriais quando o nível de endividamento sai de 25% para quase 50% da renda nacional disponível bruta das famílias (RNDBF) ao longo dos primeiros 20 anos do século 21? Nossos modelos econométricos ainda não acusaram nenhuma piora. Projetamos que o endividamento das famílias encerre 2024 e 2025 nos seguintes patamares em relação à RNDBF, respectivamente: 48,0% e 47,6%. Já quanto à Inadimplência, na carteira de crédito total ela saiu de 2,1% (2020) para 3,2% (2023). Nossa projeção é fechar 2024 nos mesmos 3,2%. No recorte Pessoa Jurídica, foi de 1,2% (2020) para 2,5% (2023). Projetamos 2,4% no fechamento de 2024. Por fim, em Pessoa Física, a elevação foi de 2,8% (2020) para 3,7% (2023), mesmo patamar que projetamos fechar 2024. Para 2025, não projetamos variação nos níveis de inadimplência frente a 2024.”

 

IMAGEM: Freepik

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