Comércio local, como o de Campinas, ganha participação nas vendas de vestuário
Com base no cruzamento de informações de tíquetes de compras, a Varejo 360 constatou que consumidores estão comprando mais roupas e calçados nos locais onde residem

Não é de hoje que algumas empresas do varejo têm olhado o interior do estado de São Paulo como um importante mercado para a expansão de suas operações.
Afinal, o fenômeno do home office, especialmente após a pandemia, tem levado cada vez mais pessoas a residir em cidades menores, em busca de uma melhor qualidade de vida.
A pergunta que fica é: o comércio local está conseguindo atender o público crescente em cidades menores? Tudo indica que a resposta é sim, ao menos no setor de vestuário.
Levantamento da Varejo 360, com base em tíquetes de consumidores, revela que está crescendo a fatia do comércio local nas vendas de roupas e calçados em lojas físicas e virtuais.
De todo o gasto com vestuário no estado de São Paulo, a participação do comércio local, que era de 56,96% em 2021, subiu para 61,90% em 2024, chegando a 64,08% em 2023, em média.
O levantamento considera informações de cerca de 150 mil usuários no estado de São Paulo, quase 2 milhões de cupons fiscais, no período de quatro anos.
A partir do cruzamento de endereços residenciais e comerciais, a constatação é que o consumidor está comprando mais roupas e calçados no local onde reside.
Em contrapartida, a compra de roupas e calçados em cidades diferentes das do domicílio, que chegou a representar 42,79% em 2021, caiu para 28,49% em 2024.
“O comércio local, que perdeu força durante a pandemia, está reagindo, o que revela um amadurecimento de lojistas independentes”, diz Fernando Faro, diretor da Varejo 360.
Em alguns municípios do interior do Estado, o aumento da participação do varejo de vestuário local, em quatro anos, supera dez pontos percentuais.
Em Campinas, as compras no comércio local representavam 61,1% em 2021, percentual que subiu para 72,12% em 2024. Em Santos, a alta foi de 49,35% para 66,40% no período.
Em outras cidades paulistas, como Jundiaí, o aumento foi de 55,61% para 64,88%. Em Ribeirão Preto, de 64,49% para 73,56%.
Em São José dos Campos, de 67,75% para 82,26%. Em São José do Rio Preto, de 67,37% para 78,57%. Em Piracicaba, de 64,69% para 68,15%.
O levantamento revela, diz Faro, que os lojistas locais estão mais preparados para enfrentar até o e-commerce de grandes redes nacionais e sites estrangeiros.
“Num primeiro momento, especialmente durante a pandemia, as lojas de vestuário foram umas das que mais perderam vendas. Hoje, até por uma questão de sobrevivência, os comerciantes estão mais preparados também para vender pela internet”, diz.
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A reação de lojas de vestuário no interior de São Paulo foi constatada pela FecomercioSP.
No ano passado, o comércio de vestuário no interior cresceu 10,7% em relação a 2023 e o da capital, 7,2%, invertendo posições dos dois anos anteriores.
Em 2023 e em 2022, as lojas de roupas da capital tiveram melhor desempenho que as do interior.
Em 2023, os percentuais de crescimento são de 9,8% para a capital e 7,8% para o interior e, em 2022, de 23,1% e 19,7%, respectivamente. A comparação é com igual período do ano anterior.
“O que já aconteceu antes com alguns setores, perda de força na capital, começa agora a se verificar no setor de vestuário”, afirma Fábio Pina, economista da FecomercioSP.
Lojistas de cidades do interior, diz ele, entenderam que, para sobreviver, eles tinham de investir em tecnologia. “A velocidade das mudanças é grande e a adaptabilidade tem de ser rápida.”
Para Marcelo Prado, sócio do IEMI - Inteligência de Mercado, os dados citados acima são resultado de investimentos de vários setores no interior paulista.
“A pandemia acelerou esse movimento, que já vinha acontecendo. Muitas das cidades paulistas já possuem shoppings centers e/ou outlets”, diz Prado.
A lei que estabeleceu alíquota de 20% para as compras internacionais até US$ 50, chamada de ‘taxa das blusinhas’, pode ter favorecido, de acordo com Pina e Prado, o comércio local.
Algumas pesquisas apontam para esse cenário. Pesquisa do banco UBS BB constatou, por exemplo, que diminuiu a intenção de compra dos brasileiros em alguns sites chineses.
Ao considerar 15 quesitos que influenciam a intenção de compra, como preços e troca de produtos, a Shein viu a sua pontuação cair de 44,6 para 40 em um ano.
Redes brasileiras, como C&A e Renner, ao contrário, ganharam pontuação, de 34,4 para 36, e de 33,3 para 34, respectivamente, no período.
No cruzamento de informações feito pela Varejo 360, Faro notou que lojistas de cidades mais distantes da capital estão ainda mais confortáveis no processo de conquistar o cliente local.
Os municípios mais próximos de capitais, diz, ainda conseguem se beneficiar de entregas em 24 horas, mesmo optando por compras fora dos locais onde residem.
Em Presidente Prudente, distante de São Paulo quase 570 quilômetros, a participação do comércio local na venda de vestuário foi de 65,10% em 2021 e de 74% em 2024.
O forte dos comerciantes do interior, de acordo com Paulo Matos, diretor da Tommy Hilfiger no Brasil, é o relacionamento com os clientes.
Em uma cidade de 120 mil habitantes, diz ele, são poucos os consumidores com poder aquisitivo para comprar peças do segmento premium, no qual atua a marca.
“Os lojistas locais são profissionais, têm influência na cidade e relacionamento forte com os clientes. Eles já sabem para quem vão oferecer parte da compra que fazem”, diz Matos.
No segmento de produtos em que atua, diz, isso sempre foi assim. O que está acontecendo, mais recentemente, é que as marcas descobriram o mundo das multimarcas.
“Hoje, tem menos lojas multimarcas do que marcas querendo vender em multimarcas”, diz ele.
Na cidade de São Paulo não houve mudança significativa em relação à participação do comércio local nos últimos quatro anos, de acordo com a Varejo 360.
A fatia do comércio local sobre o total dos gastos dos clientes com vestuário e calçados, que era de 75,72% em 2021, subiu para 76,92% em 2024.
IMAGEM: Marcos Peron/DC