Temer afunda em sua maior crise com delação da JBS
Donos do frigorífico disseram em delação que presidente da República deu aval ao suborno para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha, preso pela Lava Jato.

O presidente Michel Temer começou a enfrentar na noite desta quarta-feira (17/05) a crise mais aguda de seu governo, com a divulgação da informação de que ele deu o aval para que os donos do frigorífico JBS comprassem o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), quando ele já estava preso, em Curitiba, pela Lava Jato.
A acusação contra o presidente da República é grave e certamente o enfraquecerá em suas negociações com o Congresso para a aprovação das reformas Trabalhista e da Previdência.
Não se trata de simples declarações de Joesley e Wesley Batista, da JBS. Os dois executivos gravaram em áudio a conversa que compromete Temer.
Eles estão em delação premiada, a partir do processo aberto contra eles por envolvimento em empréstimos fraudulentos com o BNDES.
O assunto veio a público às 19h30 desta quarta, por meio de reportagem do colunista Lauro Jardim, no jornal O Globo.
O impacto das revelações no Congresso levou os presidentes da Câmara e do Senado a encerrarem abruptamente as sessões das duas Casas para evitar que o escândalo se amplificasse nos dois plenários.
Às 21h30 o Planalto divulgou nota em que afirma que Temer se reuniu com Joesley Batista, da JBS, mas que "jamais" tomou qualquer iniciativa para comprar o silêncio de Eduardo Cunha.
Na gravação na qual se baseou a denúncia, no entanto, a voz de Temer, segundo O Globo, é claramente escutada ao dizer que "tem que manter isso, viu?", em referência ao suborno.
O presidente da República e seus mais próximos assessores estavam visivelmente em estado de choque. Fecharam-se no início da noite no gabinete do terceiro andar do Planalto para esboçar uma reação. Participaram do encontro os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, da Secretaria-Geral, Moreira Franco, e da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy.
Segundo a Globonews, a reunião foi tensa, e a partir dela chegou a circular em Brasília o rumor de que Temer havia cogitado renunciar.
Ainda com relação ao suborno a Eduardo Cunha, os empresários Joesley e Wesley entregaram as gravações que fizeram à Procuradoria-Geral da República, que as encaminhou ao ministro do STF encarregado da Lava Jato, Edson Fachin.
O ministro e o procurador Rodrigo Janot evitaram contato com a imprensa no início da noite.
Nada impede que a oposição de esquerda procure tirar proveito do clima, negativo em grau inédito, para tentar tramitar um processo de impeachment, o que levaria, na prática, ao arquivamento das reformas que estão em tramitação, com efeitos bastante negativos na economia, que se recupera lentamente da recessão em que a ex-presidente Dilma Rousseff mergulhou o país.
O futuro imediato gerou uma série de conjecturas. Por uma delas, diante do agravamento e crescimento da crise política, passaria a ser interessante aos próprios governistas que o Tribunal Superior Eleitoral cassasse a chapa Dilma-Temer, afastando o presidente e, assim, viabilizando a escolha pelo Congresso de um sucessor, que cumpriria o mandato-tampão até as eleições presidenciais do ano que vem.
Mas são apenas especulações. O jornal humorístico O Sensacionalista saiu-se com a manchete "Diretas-Já", que, no entanto, não encontra amparo constitucional.
A propósito, a partir das 21h uma manifestação convocada pelas redes sociais interrompeu a avenida Paulista, em São Paulo, em que as pessoas gritavam "Diretas-Já". O mote também era repetido em Brasília, por manifestantes que se aglomeraram diante do palácio do Planalto.
Segundo o jornal O Globo, ao negociar o silêncio de Eduardo Cunha, Temer indicou como operador do suborno e compra do silêncio o deputado Rodrigo Rocha Lourdes (PMDB-PR).
A indicação ocorreu em março de 2017. Posteriormente, o deputado foi filmado pela Polícia Federal ao receber uma mala que continha R$ 500 mil.
A mala para o transporte do dinheiro tinha um chip para que sua movimentação fosse monitorada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. As cédulas bancárias também estavam com seus números de série registrados pela polícia e pelos promotores, para acompanharem o trajeto que fariam.
O dinheiro para Cunha seria uma "mesada". O ex-deputado, que foi presidente da Câmara, foi também o grande operador do impeachment de Dilma, e o dinheiro compraria o silêncio dele.
Temer também combinou com os dois empresários subornar outro preso da Lava Jato, o doleiro Lúcio Funaro, que era o encarregado das operações clandestinas que beneficiavam o PMDB.
Em termos práticos, é difícil imaginar que Temer tenha hoje no Congresso uma tropa de choque com o engajamento semelhante ao dos deputados e senadores que em 2016 defenderam Dilma Rousseff durante o processo de impeachment. As relações do presidente com sua base aliada são mais de conveniências. O que leva a prever que Temer pode a partir de agora ingressar num período de isolamento, o que, em termos políticos, é trágico. Seria um presidente em estado vegetativo.
Os donos da JBS ainda fizeram revelações que implicam o Partido dos Trabalhadores. Segundo eles, o dinheiro encaminhado ao partido do ex-presidente Lula era entregue ao então ministro da Fazenda, Guido Mantega. A delação dos irmãos Batista traz dez anos do histórico a doações a partidos políticos.
O papel de Mantega como tesoureiro informal do PT já havia sido denunciado pelos ex-executivos da OAS.
Por fim, e se a bomba que eclodiu não tivesse feitos tantos estragos, os donos da JBS também envolveram o senador Aécio Neves, que os procurou este ano e foi gravado pedindo R$ 2 milhões para o pagamento dos advogados encarregados de sua defesa nas acusações que foram feitas contra ele pela Lava Jato.
O senador do PSDB encarregou um primo dele para a operação de recebimento do dinheiro, que também foi rastreado. Ás 22h10, assessores de Aécio divulgaram nota na qual o senador desmente ter pedido ou recebido o dinheiro.
Mas os R$ 2 milhões não foram depositados em conta corrente de nenhum advogado. O depósito ocorreu numa conta de empresa de propriedade do senador Zeze Perrella, que assumiu cadeira no Senado no lugar do ex-presidente Itamar Franco, quando este morreu, e que é considerado um homem de confiança de Aécio.
A exemplo dos demais políticos, os tucanos não deram declarações na noite desta quarta-feira. O prejuizo que o episódio provocará no PSDB, no entanto, é previsivelmente incalculável.
FOTO: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo