Precisa de vendedor? Contratar na base de ‘feeling’ já não dá mais certo

Plataformas de gestão de RH podem ajudar os pequenos varejistas a preencher vagas de forma mais rápida e assertiva, reduzindo o turnover

Fátima Fernandes
04/Nov/2024
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Se tem uma prática do varejo que não tem dado bons resultados há tempos é a colocação de plaquinhas do tipo ‘estamos contratando’ nas vitrines das lojas.

Além de serem raros os interessados nas vagas, os que aparecem para o trabalho, geralmente, não atendem às expectativas dos lojistas ou desistem do emprego em menos de um ano.

A rotatividade no varejo supera 70%, em média, no país, e em alguns setores, como o de supermercados, chega a 85%, de acordo com lojistas.

A pergunta que fica é: o que é possível fazer para que uma vaga preenchida no comércio dê bons resultados tanto para o empregador quanto para o empregado?

Com foco em pequenas e médias empresas, a Sólides, empresa de tecnologia que opera com seleção, recrutamento e gestão de pessoas dá pistas para contratações mais assertivas.

E tudo começa, de acordo com a empresa, com o uso de plataforma capaz de colher as habilidades de interessados em um posto de trabalho a partir de duas perguntas.

Uma é ‘como você se vê’ a partir de uma lista de dezenas de adjetivos (tímido, comunicador, planejador, executor) e a outra é ‘como a empresa deveria te ver’.

A partir das respostas e com o desenho do perfil da vaga, a empresa já faz uma triagem dos candidatos para afunilar a lista daqueles que realmente podem se encaixar.

“Hoje, um grande diferencial para o pequeno varejista é ter um portal de vaga dele, personalizado com o que ele precisa”, afirma Ana Claúdia Peixoto, gerente de Gente da Sólides.

Antes de anunciar uma vaga, diz, o empresário precisa fazer o desenho comportamental do cargo. No caso de um vendedor, é preciso ter habilidade de comunicação, ser rápido e proativo.

“A partir deste desenho, a plataforma faz o ‘match’. É claro que a inteligência artificial ajuda, mas não substitui o contato pessoal. Acreditamos que os processos precisam ser humanizados”, diz.

Com o uso do sistema de inteligência comportamental para ter a pessoa certa no lugar certo, o turnover de clientes já chegou a cair para menos de 50%, de acordo com Ana Cláudia.

É preciso desmistificar, diz, que todo o trabalho de inteligência no processo de seleção e recrutamento de pessoas é assunto apenas para grandes empresas.

“Ao departamento de RH (Recursos Humanos) não cabe somente contratar, mas também acompanhar desempenho e satisfação do empregado. Redução de turnover é dinheiro a mais para a empresa, até porque as saídas de pessoas têm custo”, afirma.

GRUPO NOMURA

O grupo Nomura, franqueado de 35 lojas da Adidas, duas da Arezzo e uma da Schultz, disse adeus às plaquinhas ‘estamos contratando’ em 2018.

Desde então, utiliza essa plataforma de tecnologia para divulgação de vagas, seleção e contratação de pessoas.

“Antes de abrir uma vaga, fazemos uma engenharia de cargos, isto é, o desenho daquela vaga, qual é o perfil da pessoa que preciso, mais executor, comunicador, planejador. Aí, sim, vamos atrás dos candidatos”, diz Bárbara Patrícia de Medeiros, gerente de RH do grupo Nomura.

Com o perfil da vaga, diz, o sistema já faz um filtro, um match dos melhores candidatos. “O grupo só contrata pessoas com match acima de 80% de compatibilidade com a vaga.”

Automaticamente, as pessoas que não têm o perfil para determinada vaga são desclassificadas já no sistema, ajudando a empresa a focar na lista daqueles que têm o perfil para o posto.

Aí sim, inicia-se um processo de entrevistas com gerentes para colher outros detalhes que o sistema de inteligência não é capaz de trazer, como informações mais pessoais.

Após a contratação, a empresa também utiliza a tecnologia para fazer o acompanhamento de performance e o plano de desenvolvimento do empregado com base, principalmente, em quatro perfis, executor, comunicador, analista e planejador.

“Pegamos a roda de competência da pessoa, gaps que precisam ser trabalhados e fazemos o desenvolvimento no âmbito profissional, de carreira no grupo”, diz.

Até 2018, o grupo costumava colocar as plaquinhas ‘estamos contratando’ nas vitrines ou fazia propostas para funcionários de outras lojas com base em indicações.

Com o uso de tecnologia na seleção, contratação e gestão de pessoas, o turnover da empresa, que era de 60% em 2018, caiu para perto de 50% neste ano.

Mais importante até do que a queda da rotatividade, diz Bárbara, é o indicador de produtividade dos funcionários.

“A produtividade média de um vendedor, que era de vendas de R$ 75 mil por mês, subiu para R$ 105 mil. Tem vendedor do grupo que hoje chega a ganhar R$ 10 mil por mês”, afirma.

O grupo Nomura tem cerca de 580 funcionários, destes, 64 estão em período de experiência. A média de idade é de 30 a 34 anos.

A divulgação das vagas do grupo ocorre em uma página de carreiras no site da Sólides, no Instagram do grupo, no Instagram pessoal de gerentes e em outros canais de redes sociais.

Para atender à demanda do final do ano, a empresa vai abrir, a partir deste mês, 77 vagas para a área de vendas. O salário vai depender do local da loja e de convenções coletivas.

O grupo paga uma mensalidade R$ 1,8 mil por mês para a Sólides para o uso da tecnologia. Dependendo do que for usado nessa e em outras plataformas, o valor pode chegar a R$ 6 mil.

PROPÓSITO E VALORES

Olegário Araújo, pesquisador do FGVcev - Centro de Excelência em Varejo da Fundação Getúlio Vargas, diz que a tecnologia é de fato uma aliada nas contratações.

“Mas tem de refletir o propósito, os valores e as estratégias da empresa. A descrição da função é um primeiro passo”, afirma.

A plataforma, diz ele, pode ajudar com ‘contratações cegas’, nas quais se ocultam algumas informações para evitar os vieses das pessoas.

“Mas nada substitui a entrevista pessoal. O processo seletivo é humano. Caso contrário, a empresa vai ter um empregado infeliz e improdutivo.”

Se a pessoa se identificar com o que faz, diz, o que tem muito a ver com vocação e sonhos, aumenta a probabilidade de se sentir mais feliz, criando condições para se dedicar e estudar, gerando oportunidades de crescimento pessoal e profissional.

“E isso não ocorre sozinho, vem com um plano de desenvolvimento e feedback, que pode ser de reconhecimento, orientação e avaliação. O diálogo precisa ser contínuo”, afirma.

A rotatividade de uma loja, de acordo com Araújo, é maior do que a de um escritório e varia por região do país. Quanto menor a taxa de desemprego, mais difíceis ficam as contratações.

“Há regiões como pleno emprego, como em Santa Catarina, onde a taxa de desemprego é menor do que 4%. Isso leva as pessoas a mudarem mais de emprego, especialmente porque há setores da economia que não trabalham nos finais de semana.”

Aliás, este é um dos motivos, de acordo com especialistas em varejo, que têm levado muitos empregados do comércio, especialmente os jovens, a desistirem do emprego.

Um empregado na vaga certa, satisfeito com o salário, com plano de carreira e alguns fins de semana livres, deve pensar dez vezes antes de trocar de emprego, dizem os especialistas.

 

IMAGEM: Thinkstock

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