PEC do teto dos gastos é confusa, mas tem um valor fundamental
Economistas reunidos na ACSP -entre eles Juarez Rizzieri (foto), da USP -apontam defeitos na PEC 241, mas dizem que ela marca uma reviravolta positiva para o país

A proposta de emenda constitucional que limita os gastos públicos traz lacunas e defeitos. Mesmo assim, ela é uma espécie de divisor de águas na história recente das finanças da União, tirando o foco da arrecadação para se centrar nas prioridades que a sociedade precisa definir para os seus gastos.
Essa é uma das maneiras de resumir o debate desta segunda-feira (07/11), sobre a PEC 241 - renumerada como PEC 55 ao começar a tramitar no Senado -, promovido pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
O texto em tramitação no Congresso foi abordado em reunião do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), sob coordenação de Luís Eduardo Schoueri. Os trabalhos foram presididos por Alencar Burti, presidente da ACSP.
Participaram do encontro Juarez Rizzieri, professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA), da USP, Everardo Maciel, consultor e ex-secretário da Receita Federal, Edison Carlos Fernandes, professor de direito na PUC-SP e na GVlaw, Fernando Rezende, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) e José Maurício Conti, professor da Faculdade de Direito da USP.
Everardo Maciel qualificou a PEC de "indispensável", mas afirmou que ela perderá seu valor se não for acompanhada de uma reforma da Previdência.
Critiou também a "má qualidade técnica da redação do texto, coisa de amador" em razão de ao menos dois dispositivos.
Por um deles, o que dispõe sobre os gastos que não podem superar a inflação do ano anterior, há a óbvia dificuldade em definir a percentagem de reajuste dos gastos até 31 de agosto de cada ano, quando o ano fiscal ainda está em andamento, mas é a data até a qual o Executivo deve enviar ao Congresso sua proposta de Orçamento.
Referiu-se ainda às punições quando os gastos excederem o limite. Porém, é impossível pensar na possibilidade de o Executivo "punir" o Congresso, que terá sido responsável, por exemplo, pelo reajuste dos servidores.
José Maurício Conti afirmou que a maior qualidade do texto é a sinalização de um rumo diferente do governo anterior, marcado pelo descontrole dos gastos públicos. Foi algo interpretado como positivo pelos agentes econômicos.
Mas apontou como tópicos negativos a retomada de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que já vinha sendo desrespeitada.
O fato de se tratar agora de normas constitucionais muda muito pouco quanto à possibilidade de futuros desrespeitos, mesmo porque há o precedente dos precatórios, cujos pagamentos são explicitamente definidos pela Constituição, mas nem por isso têm sido pagos de forma conveniente.
Conti também apontou para a inexistência de iniciativas paralelas, como a melhora da eficiência dos gastos públicos e o fato de atingir apenas a União, sem que Estados e municípios sejam expostos ao mesmo conjunto disciplinar de obrigações.
Juarez Rizzieri, com a ajuda de gráficos, fez uma análise histórica dos gastos públicos nos últimos governos, numa trajetória que desembocou no governo Dilma Rousseff, "que não pagava mais as dívidas e gerava déficit primário".
DO DESENVOLVIMENTO AOS GASTOS SOCIAIS
Até os anos 1980, argumentou, o país se pautava pela questão do desenvolvimento, o que gerou investimentos importantes na infraestrutura.
A partir da Constituição de 1988, no entanto, a tônica se voltou às políticas sociais. FHC demonstrou, no caso, uma postura moderada, sem financiamento público pesado. Lula foi agressivo, mas com essa forma pesada de financiamento, enquanto Dilma partiu para o populismo, sem financiamento sustentável.
Isso gerou a maior recessão da história republicana (9% de queda do PIB entre 2015 e 2016), com a agravante de o desemprego atingir em proporção incomparavelmente maior os mais pobres.
É nesse quadro, afirmou, que a PEC 241 se fez necessária.
Edison Carlos Fernandes, apesar das críticas ao texto, qualifica a proposta de emenda à Constituição "como a PEC mais importante depois do fim do regime militar".
Isso porque o texto submete as finanças públicas a um novo critério. Em lugar de condicioná-las á arrecadação, atrelou as finanças públicas aos gastos.
"Essa PEC muda a nossa visão do direito financeiro e do direito tributário", afirmou.
Por fim, Fernando Rezende disse que a PEC tem como primeiro mérito levar a população a discutir priovidades. "É uma medida tosca, com o potencial de gerar debates positivos", afirmou.
FOTO: Fátima Fernandes