Parece que o Senado quer tolher a Lava Jato, diz Moro
Para o Juiz federal, independentemente da intenção dos senadores ao alterarem a Lei de Abuso de Autoridade, o momento atual não é o mais adequado para mudanças
O juiz federal Sérgio Moro disse que este não é o momento adequado para fazer alterações na Lei de Abuso de Autoridade (4.898/65), pois pode passar para a população a ideia de uma tentativa de tolher investigações em curso.
A declaração foi dada nesta quinta-feira (1/12), quando o juiz participou de debate sobre o tema no plenário do Senado.
Responsável pelas investigações da Operação Lava Jato na primeira instância, Sérgio Moro sugeriu a inclusão de salvaguardas no texto para garantir que agentes da lei não sejam punidos por uma interpretação equivocada no exercício da função.
Moro explicou que faz a observação sem intenção de censurar ou dizer o que deve ser feito pelo Senado. Para o juiz, modificar a lei pode passar uma mensagem equivocada do Senado para a sociedade brasileira.
Ele disse que é preciso considerar o contexto de que existe uma investigação importante, não só a chamada Operação Lava Jato, mas várias outras investigações importantes.
Independentemente das intenções dos senadores, uma nova Lei de Abuso de Autoridade poderia ser interpretada no presente momento como tendo o efeito prático de tolher investigações e persecuções penais, disse o juiz.
Ele acrescentou que a sociedade quer agora o enfrentamento mais efetivo desse tipo de criminalidade. "A aprovação do projeto no presente momento poderia dar uma mensagem equivocada à sociedade.”
Sérgio Moro, que já fez críticas à proposta de mudanças na lei, entregou ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), autor do Projeto de Lei nº 280, de 2016, que modifica o texto da Lei de Abuso de Autoridade, um ofício sugerindo a inclusão do trecho: não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal, ou na avaliação de fatos e provas.
“Com essa salvaguarda, eu diria que grande parte dos receios de uma aplicação equivocada desse projeto de lei provavelmente possam ser evitados”, disse o juiz.
Sérgio Moro ressaltou que nenhum juiz ou autoridade judicial é conivente com o abuso de autoridade e que qualquer legislação para aprimorar e reduzir desvios é bem-vinda.
Ele observou que, no entanto, é preciso ter cuidado para que, a pretexto de evitar o abuso de autoridade, a legislação não tenha o efeito contrário de prejudicar o cumprimento do dever.
“Ainda que a legislação seja movida pelas melhores intenções, o que vai acontecer com ela no futuro, como ela vai ser aplicada, como vai ser interpretada é uma questão em aberto que o legislador tem poucas possibilidades de antever”, disse.
DEFASADA
O senador Renan Calheiros apresentou o projeto por considerar que a legislação sobre abuso de autoridade vigente está defasada e, por isso, precisa de aprimoramentos. A expectativa é votar a matéria no plenário do Senado no dia 6 de dezembro.
O texto prevê punição para servidores públicos e membros do Judiciário e do Ministério Público, no caso de determinadas prisões “fora das hipóteses legais", como, por exemplo, quando presos são submetidos ao uso de algemas quando não há resistência à prisão e quando são feitas escutas sem autorização judicial, atingindo “terceiros não incluídos no processo judicial ou inquérito.
A proposta de Renan provocou reações contrárias de magistrados, como Sérgio Moro e da Associação dos Juízes Federais do Brasil que classificou a iniciativa de tentativa de intimidação de juízes.
IMAGEM: Agência Brasil