Os dois lados das ciclofaixas paulistanas

De um lado, as ciclovias prejudicam lojistas, mas, de outro, alguns tentam se adequar à situação e enxergam nos ciclistas a possibilidade de novos clientes

Redação DC
22/Nov/2014
  • btn-whatsapp
Os dois lados das ciclofaixas paulistanas

Uma das faixas de rolamento é pintada de vermelho, e o espaço é cercado por tachões que o demarcam. Assim nasce mais uma ciclofaixa em São Paulo. Pelos menos é dessa forma que os comerciantes da região central da cidade descrevem a implantação das faixas exclusivas para as bicicletas:

“Da noite para o dia, eles simplesmente passaram a tinta, e o espaço para estacionamento ou para o tráfego de veículos foi transformado em ciclovia. Não houve uma consulta à comunidade”, afirma Marcelo Flora Stockler, conselheiro da distrital do Centro da Associação Comercial de São Paulo e proprietário da óptica Foto Roxy.

Nos últimos meses, a Prefeitura de São Paulo abriu 112,5 km de vias exclusivas para bicicletas na cidade – a meta é atingir 400 km em 2015. A medida, argumenta ela, visa ampliar o uso da bicicleta não apenas como lazer, mas também como meio de transporte.

A iniciativa, comemorada por alguns, prejudicou outros. É caso de Vanusa do Carmo Freitas, gerente do restaurante O Bonde, localizado na Rua Boa Vista, no centro da cidade. A ciclofaixa – que foi instalada há dois meses na região – passa pela frente do estabelecimento, local que antes era destinado à carga e descarga de veículos. “Nossos fornecedores não têm onde estacionar, e as entregas dos nossos produtos estão sendo prejudicadas; às vezes os entregadores ficam rondando a rua até achar um local”, diz.

"Perdi muitos clientes", diz lojista de Moema

O problema se repete em outras partes da cidade em que as faixas foram implantadas.  Em Moema, na Zona Sul, José Basto, gerente da loja de produtos cosméticos Abaeté, localizada na avenida Pavão, registrou queda de faturamento: “Nos fins de semana, quando o movimento é grande, nossas vagas de estacionamento ficam todas preenchidas, e os consumidores não podem parar na rua por causa da faixa de bicicletas. Perdi muitos clientes e as vendas caíram em cerca de 20%. A ciclovia aqui atrapalha o negócio."


Vinicius Aguiar, entregador de água do bairro de Moema, se sente mais seguro para fazer entregas com as ciclofaixas
Foto: Redação DC

Os comerciantes Stocker, Vanusa e Basto não são contra os ciclistas e nem repudiam uso de bicicletas como meio de transporte, mas questionam a forma como as ciclofaixas foram introduzidas em São Paulo.

É a mesma opinião da Associação Comercial de São Paulo. “Todos os veículos são importantes para a mobilidade urbana, mas no caso das faixas de bicicletas não houve um estudo de viabilidade ou uma pesquisa sobre os possíveis usuários. As ciclofaixas foram colocadas de forma impositiva e sem uma análise apropriada”, afirma Antônio Carlos Pela, vice-presidente da ACSP e coordenador-geral do Conselho de Política Urbana da entidade.

Um exemplo de que os estudos apropriados não foram feitos é a situação da ciclofaixas de Higienópolis, na Zona Oeste. A via exclusiva de bicicletas havia sido colocada primeiramente do lado direito da Rua Armando Penteado e da Praça Vilaboim.

Nessa parte da rua, há uma grande quantidade de restaurantes e lojas que estavam sendo prejudicados: os manobristas dos serviços de valet não conseguiam atender os clientes, e não havia locais apropriados para carga e descarga de passageiros e mercadorias. Os lojistas organizaram abaixo-assinados, e a Prefeitura mudou o trajeto da ciclofaixa para o outro lado da rua. Em nota, a CET informou que a alteração foi feita por causa de ajustes no local.


Ciclofaixa da Avenida São Luís, no centro de São Paulo, foi instalada na calçada
Foto: Estadão Conteúdo

PARA RECEBER BEM OS CICLISTAS

As bicicletas e os comerciantes não são inimigos. Em outros países, onde as ciclovias são bem planejadas, elas podem ser benéficas para comércio de rua. Foi o que mostrou um estudo do Departamento de Transportes de Nova York. Pelo documento, o faturamento do varejo em alguns pontos de Manhattan aumentou em até 49% depois da implantação das ciclovias.

Clique aqui e leia o estudo completo (em inglês)

No Brasil, mesmo com a falta de estrutura e planejamento, alguns empresários tentam se ajustar a situação.

Alguns estabelecimentos da cidade começam a perceber nas ciclovias uma oportunidade de conquistar novos clientes e investem em infraestrutura para receber esse público. “O processo de adaptação às ciclovias não vai acontecer do dia para a noite, mas as empresas podem e devem se beneficiar dessa nova realidade”, diz Eduardo Grigoletto, da Ciclomídia, consultoria especializada em marketing esportivo e soluções de mobilidade.

O tradicional reduto paulistano Estadão Lanches, conhecido pelo sanduíche de pernil, quer atrair os grupos de bikers noturnos que passam pela ciclofaixa em frente à lanchonete.

“É estratégico ter esse público aqui. São grupos de 50 a 80 pessoas”, disse Rogério Cesar, representante do estabelecimento. Em outubro desse ano a lanchonete instalou paraciclos, que são estacionamentos de bicicleta. Está também desenvolvendo um leque de promoções, como vauchers para lanches leves ou descontos em garrafas de água mineral, para clientes que cheguem de bicicleta.

Em Moema, a farmácia de manipulação HN Cristiano, localizada em frente a uma ciclofaixa, também tem recebido clientes que chegam de bicicleta. “O movimento é maior aos finais de semana. Ganhamos novos clientes e estamos pesquisando como colocar estrutura adequada para as pessoas estacionarem as bicicletas”, disse Brenda Santos, gerente da loja.

Também em Moema, a lanchonete The Fifities, além do paraciclo, oferece cadeados para os clientes que chegam de bicicleta. “É uma oportunidade pra gente. Não e só quem vem de carro que come”, disse Paulo Henrique, gerente de marketing da rede.

No centro da cidade, o ortodontista Regis Rossi oferece um desconto de 10% para clientes que chegam de bike, e com isso têm recebido novos e antigos clientes. “Meus pacientes estacionam em frente ao consultório no paraciclo da Biblioteca Mário de Andrade”.

Os estabelecimentos consultados ainda não conseguem mensurar o impacto das ciclovias em suas lojas e empresas, mas a percepção é de que o investimento para atrair os ciclistas pode compensar: “Sem sombra de dúvida o movimento já aumentou, temos ciclistas novos parando aqui”, avaliou Rogério da Lanchonete Estadão.

DICAS PARA TER UM ESTABELECIMENTO BIKEFRIENDLY

Ciclistas apontam para a “força do boca a boca do grupo” como forte elemento de divulgação para estabelecimentos que recebem bem clientes de bicicleta, ou bikefriedly, como são chamados. A seguir dicas simples do BikeIT, mapa virtual colaborativo que avalia estabelecimentos pelo Brasil, para melhorar a estrutura do seu negócio: 

1) Invista em uma estrutura adequada para estacionar suas bikes. A melhor forma são os paraciclos. Para implantar uma estrutura para duas bicicletas, o investimento necessário é de aproximadamente R$ 400,00 e requer uma área de menos de 2 metros quadrados.

2) Ofereça um copo de água para quem chega da rua em bicicleta. Acredite, ele estará com sede, e você vai ganhar sua simpatia.

3) Tenha cadeados para emprestar, como fez o Fifities; é uma imensa gentileza.

4) É provável que o ciclista chegue suado e com calor. Deixar que ele use um banheiro para lavar as mãos e o rosto também fará a diferença.

5) Sinalize que seu estabelecimento é bikefriendly. Ele não tem como adivinhar.

6) Se você não tiver como instalar um paraciclo, pode fazer uma parceria com estacionamentos privados para que a estrutura esteja disponível.

 

O Diário do Comércio permite a cópia e republicação deste conteúdo acompanhado do link original desta página.
Para mais detalhes, nosso contato é [email protected] .

Store in Store

Carga Pesada

Vídeos

Alexandra Casoni, da Flormel, detalha o mercado de doces saudáveis

Alexandra Casoni, da Flormel, detalha o mercado de doces saudáveis

Conversamos com Thaís Carballal, da Mooui, às vésperas da abertura de sua primeira loja física

Entenda a importância de planejar a sucessão na empresa