O Nove de Julho hoje
‘Muitos consideram que o avanço da deterioração política e institucional já atingiu um ponto irreversível, que a ruptura da sociedade é definitiva, sendo que não há nada que se possa fazer. Recuso-me a aceitar esse diagnóstico. É preciso unir a sociedade brasileira, dividida de forma radical, procurando isolar os extremos e promover a convivência entre os que pensam diferente, mas têm como valor comum a aceitação do direito à divergência e o objetivo de dialogar na busca de soluções para os problemas nacionais’
Embora a maioria da população, especialmente os mais jovens, saiba que 9 de julho é feriado no estado de São Paulo, não sabe o que se comemora neste dia.
Acredito que, por isso, devemos lembrar as causas e o significado e desenrolar do Movimento Constitucionalista de 1932, e a mobilização da população paulista na defesa de seus ideais e da honra do estado de São Paulo.
Para a ACSP, recordar o 9 de julho, início da REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA, é reverenciar parte importante de sua história. Isso porque teve participação relevante em todas as etapas do movimento cívico pelo restabelecimento da autonomia do Estado, e pela volta do país ao regime constitucional e à democracia, usurpados por Getúlio Vargas.
A Associação, sob a presidência de Carlos de Souza Nazareth, e as demais lideranças empresariais e civis paulista tentaram, em várias oportunidades, o diálogo com o governo federal, reivindicando respeito a São Paulo e a sua autonomia, e a volta do regime constitucional, mas não conseguiram qualquer sucesso com o ditador Getúlio Vargas, apesar de suas promessas quando indicado como presidente provisório.
Além de esgotadas todas as possibilidades de acordo, um episódio, a morte de quatro jovens estudantes por tropas federais em 23 de maio de 1932, provocou a revolta da população e deu origem a um Movimento, o MMDC (homenagem à Miragaia, Martins, Dráuzio e Camargo, os jovens mortos), que passou a defender a Revolução como único caminho para livrar São Paulo e o Brasil de Vargas.
A ACSP, em consonância com o sentimento geral da população paulista, cujo entusiasmo na campanha pela defesa da Constituinte imediata culminou, em 9 de julho, com a deflagração da Revolução Constitucionalista, se engajou ao Movimento.
Assumiu diversas funções de suporte ao Movimento. Cuidou das finanças, da intendência e do abastecimento. Colaborou no alistamento e na captação e distribuição dos recursos. Criou vários departamentos e ficou responsável por procurar garantir o abastecimento da população e as finanças do movimento.
Quando o movimento militar avançou e as necessidades financeiras aumentaram, coordenou a Campanha “Ouro para o Bem de São Paulo”, que mostrou mais uma vez o entusiasmo cívico da população paulista que, sem distinção de classes, cada uma dentro de suas possibilidades, ofereceu joias, alianças e outros objetos de valor para a Campanha.
Como os recursos praticamente não foram utilizados devido à derrota de São Paulo em outubro, porque não contou com o apoio esperado de outros Estados a não ser Mato Grosso, foram doados à Santa Casa de Misericórdia, que construiu não apenas um novo pavilhão, como, também, o edifício na Rua Líbero Badaró, que tem o nome dessa campanha e cujo formato dos 13 andares lembra as treze listas da Bandeira Paulista.
Apesar de vencido no campo militar devido à grande superioridade de recursos do governo federal, São Paulo foi vitorioso no plano moral, por lutar “por São Paulo e pelo Brasil” e, porque, em 1934, foi convocada a Constituinte pela qual lutara.
Carlos de Souza Nazareth assumiu toda a responsabilidade pela participação das classes empresariais e dos empresários paulistas na Revolução e, junto com diversos líderes civis, foi preso e exilado.
Antes de embarcar para o exílio, em carta aos membros da diretoria da ACSP, disse estar preparado para suportar com dignidade todas as punições que lhe fossem impostas e encerrou sua carta com um apelo aos companheiros: NÃO ESMORECER PARA NÃO DESMERECER”.
Pelo que devemos lutar neste 9 de Julho para sermos fiéis ao apelo de Carlos de Souza Nazareth e em homenagem aos que tombaram no campo de batalha na defesa de seus ideais?
Os ideais continuam os mesmos de 32, lutar por São Paulo e pelo Brasil. Os desafios de agora, contudo, são outros, talvez até mais difíceis, mas se “não esmorecermos”, seguramente iremos vencer.
A perda da liberdade de expressão, a intervenção do Estado em todos os aspectos de nossas vidas, a crise política, econômica, social e moral que enfrentamos são problemas conjunturais que se não forem enfrentados com determinação, se tornarão estruturais e continuarão a impedir o Brasil de superar a “armadilha da renda média”, e corremos o risco de regredirmos, não apenas do ponto de vista econômico, como, sobretudo, do institucional.
Resgatar valores como Honra, Ética, Patriotismo, Família e Solidariedade, entre outros. Restabelecer a convivência civilizada são objetivos que devemos perseguir. A tragédia do Rio Grande do Sul mostrou exemplos de solidariedade que revela que, quando a causa é justa, a população responde positivamente.
É preciso unir a sociedade brasileira, dividida de forma radical, procurando isolar os extremos e promover a convivência entre os que pensam diferente, mas têm como valor comum a aceitação do direito à divergência e o objetivo de dialogar na busca de soluções para os problemas nacionais.
Restabelecer os limites, o equilíbrio e a harmonia entre os Poderes é urgente para evitar a total deterioração do ambiente institucional. Precisamos de um Movimento Constitucionalista para reformar a Constituição de 88, como propõe o professor Modesto Carvalhosa, o que exige a mobilização semelhante à de 32, mas com as armas da democracia e o uso da tecnologia.
Muitos consideram que o avanço da deterioração política e institucional já atingiu um ponto irreversível, que a ruptura da sociedade é definitiva, sendo que não há nada que se possa fazer.
Recuso-me a aceitar esse diagnóstico e prefiro ficar com o ensinamento de Santo Agostinho de que “enquanto houver vontade de lutar, haverá esperança de vencer”. Vamos nos unir para enfrentar os desafios, lembrando o apelo de Carlos de Souza Nazareth de “não esmorecer, para não desmerecer”.