Moody's rebaixa nota do Brasil, mas mantém grau de investimento
Baixo desempenho econômico, tendência de crescimento dos gastos e a falta de consenso político sobre reformas fiscais levaram à redução da classificação de risco de crédito brasileira

A agência de classificação de risco de crédito Moody's rebaixou a nota de crédito (rating) brasileira de Baa2 para Baa3. A agência também mudou a perspectiva da nota de negativa para estável.
Com a alteração, o país mantém o grau de investimento, conferido a países considerados seguros para investir, mas fica a um degrau de ser rebaixado para o grau especulativo, referente a países com qualidade de crédito questionável.
O vice-presidente da Moody's, Mauro Leos, disse que, a menos que algo muito inesperado aconteça, a perspectiva estável do rating significa que não devemos ter alterações na classificação neste ano.
Ele afirmou que a perspectiva estável está seguindo uma análise sobre o que vai acontecer após o ano que vem.
"Esperamos uma recuperação cíclica na segunda metade de 2016. O crescimento continuará baixo, mas será uma recuperação, e isso deve ajudar na arrecadação. Esperamos que juros e inflação caiam. Porém, se nossa expectativa de melhora gradual no próximo ano e de estabilização nas condições em 2017 estiver errada, e os juros continuarem a subir e a economia continuar a cair, teremos de rever nosso rating", afirmou.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que a decisão da agência é uma indicação das prioridades que o governo deve ter para manter a qualidade da dívida pública.
"É uma declaração bastante detalhada, transparente e que eu acho que dá indicação das prioridades que a gente tem que ter em relação a manter a qualidade da nossa dívida pública", disse Levy.
O ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola afirmou que, apesar do já esperado rebaixamento do rating do Brasil, especialmente devido à redução da meta de superávit primário (economia que o governo faz para controlar a dívida pública) para este ano e os próximos anos, a perspectiva estável da nota soberana "dá mais ou menos seis meses" para o país evitar a perda do grau de investimento perante esta agência internacional.
"Hoje a probabilidade está dividida em 50% para que o governo consiga manter ou não evitar a perda do grau de investimento no ano que vem. Se melhorar a ação do Poder Executivo junto ao Legislativo, com a aprovação de medidas para reforçar as contas públicas, junto com o cenário mais favorável de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto, soma de bens e serviços produzidos pelo país), isso será muito importante para um desfecho favorável", disse.
Na avaliação de Loyola, os mercados devem ter uma pequena repercussão nesta quarta-feira (12/08) em relação à decisão da Moody's. "Pode ocorrer alguma volatilidade em dólar ou em bolsa, mas logo passará, pois ativos financeiros já vinham precificando a redução da nota soberana do Brasil", afirmou.
Na visão do economista-sênior do Besi Brasil, Flávio Serrano, a decisão da Moody's de rebaixar o rating do Brasil para Baa3, último nível do grau de investimento, e atribuir uma perspectiva estável para a nota, é positiva, mas isso não significa que o Brasil está fora de perigo.
"A notícia é relativamente positiva, dadas as expectativas que se criaram. O rebaixamento já era antecipado em função da deterioração recente do quadro econômico. A perspectiva estável significa que há pouca chance de alteração da nota no curto prazo", comenta. Ele aponta que a Moody's já incorpora uma trajetória negativa para a relação dívida/PIB até o fim do atual mandato da presidente Dilma Rousseff.
Mesmo assim, a perspectiva estável não significa que não há riscos para o rating brasileiro.
Para Serrano, é preciso avançar com medidas estruturantes e também para atenuar a crise política. A recente reaproximação entre o governo e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), é um passo nesse caminho, segundo o economista. "É preciso reduzir o nível de incertezas na economia e aumentar a capacidade de crescimento. Precisamos quebrar o ciclo de confiança muito baixo que se instalou entre os agentes econômicos", aponta.
OS MOTIVOS PARA O REBAIXAMENTO
Segundo nota da Moody's, os motivos para o rebaixamento da nota são a performance econômica abaixo do esperado, a tendência de crescimento dos gastos governamentais e a falta de consenso político sobre as reformas fiscais.
Para a agência, esse conjunto de fatores impedirá que as autoridades alcancem superávits primários altos suficientes para reverter a tendência de débito crescente neste ano e no próximo e desafiará sua habilidade de conseguir fazê-lo mais tarde”.
Na nota, a Moody's informou que, em relação às expectativas anteriores, o volume e a capacidade de pagamento da dívida do país continuarão a se deteriorar em 2015 e 2016 a níveis piores do que o de outros países classificados no patamar Baa.
“A Moody's espera que a crescente carga da dívida se estabilize apenas no fim desse governo”, diz o comunicado da agência de classificação.
De acordo com a Moody's, o Brasil tem pontos fortes que justificam a classificação em Baa3, ainda considerada grau de investimento. Leos diz que a Moody's manteve a perspectiva estável do País porque há um equilíbrio entre os fatores positivos e negativos.
"O Brasil é resistente a choques externos. Quando olhamos para a categoria Baa, vários países têm problemas no balanço de pagamentos e choques externos podem ter impacto significativo na economia. O Brasil é o oposto, é muito forte em termos de contas externas. A maior parte do déficit é financiada por investimento estrangeiro direto. Há um nível elevado de reservas internacionais", afirmou.
Ele lembra que para cada dólar que precisa pagar de dívida externa, o Brasil tem quatro dólares em reservas, uma das maiores relações em economias emergentes. E que o governo tem uma exposição relativamente baixa à dívida externa. Assim, esses elementos compensam os fatores negativos.
No fim de julho, a agência de classificação de risco Standard & Poor's (S&P) já havia anunciado mudança da perspectiva da nota de crédito brasileira de estável para negativa.
Pela S&P, o Brasil está a apenas um degrau acima do nível especulativo. Para a agência Fitch, o rating do país é BBB, com perspectiva negativa, dois degraus acima do grau especulativo.
BRASIL: RECESSÃO EM 2015 E ESTAGNAÇÃO EM 2016
A Moody's avalia que o crescimento do Brasil deve permanecer fraco neste e no próximo ano.
No texto que acompanhou o rebaixamento do rating do Brasil para Baa3 e a alteração da perspectiva de negativa para estável, a agência informou que o país terá recessão em 2015 e enfrentará estagnação econômica em 2016.
Depois disso, segundo a agência, o PIB deverá registrar taxas anuais de crescimento de cerca de 2% em 2017 e 2018.
A agência também fez um alerta sobre a relação entre a dívida pública e o PIB. Segundo a Moody's, para que o país estabilize os índices da dívida, é necessário um crescimento do PIB e superávits primários de pelo menos 2% e, segundo a nota, a agência não espera que o Brasil cumpra estas condições este ano ou no próximo.
Leos cita ainda os resultados fiscais mais fracos do que o previsto. Não apenas a arrecadação, que, diz ele, é importante, mas também os gastos no médio prazo. Boa parte dessa fraqueza fiscal , avalia, está relacionada à tendência dos gastos obrigatórios.
Para a Moody's, os índices da dívida do governo continuarão a aumentar durante a atual administração, permanecendo em níveis historicamente elevados em termos absolutos e em comparação com o grupo de pares do Brasil com rating Baa, que são aqueles que têm grau do investimento.
No entanto, a agência alerta que a dívida continuará a piorar, em termos absolutos e em relação a seus pares.
A agência estima ainda que a relação dívida/PIB subirá para 67% em 2016 e continuará a aumentar lentamente depois, se aproximando de 70% em 2018.
"Seria preciso um crescimento maior ou uma correção fiscal mais significativa do que a atualmente incluída no cenário oficial revisado do Brasil para reverter a trajetória de aumento da dívida durante este governo", avaliou a agência.
Segundo a Moody's, as condições ruins do mercado de trabalho, a queda no emprego e a redução dos salários, que impactam o consumo, devem se estender para 2016.
"A baixa capacidade de utilização, a fraca confiança dos empresários e os desdobramentos relacionados à Petrobras afetarão negativamente as perspectivas de investimentos neste ano e no próximo", acrescentou.
Ainda para a Moody's, as condições no âmbito fiscal também seguirão. "A redução do gasto discricionário não compensou adequadamente o impacto do crescimento mais fraco que o esperado sobre as receitas do governo. Essa tendência seguirá assim, particularmente tendo em vista as despesas obrigatórias que continuarão a aumentar em termos reais", divulgou.
Apesar das dificuldades fiscais, a Moody's não projeta, no momento, uma grave deterioração das métricas de dívida do Brasil, o que sustenta a perspectiva estável da nota e o grau de investimento do país.
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* Com informações de Agência Brasil e Estadão Conteúdo