Julho, um mês histórico para a ACSP
A entidade teve papel importante durante as Revoluções de 1922, quando presidida por José Carlos de Macedo Soares, e de 1932, na gestão de Carlos de Souza Nazareth, que dá nome à principal honraria oferecida pela associação (foto)
Em julho, em diferentes anos e circunstâncias, a ACSP foi partícipe de dois acontecimentos relevantes de sua história, que marcaram também o estado de São Paulo e o Brasil.
Em episódio pouco conhecido pelos mais jovens, no dia 5 de julho São Paulo foi tomada por um grupo de militares rebeldes, remanescentes da chamada “Revolução Tenentistas” de 1922, que pretendiam derrubar o presidente de então, Arthur Bernardes, considerado representante das oligarquias. Eram jovens de média e baixas patentes, que desejavam melhorar as condições do exército, o voto secreto para romper a hegemonia dos grupos que controlavam o Poder e promover a modernização do país.
Em São Paulo esse movimento foi liderado pelo General Isidoro Dias Lopes, que assumiu o controle da cidade, obrigando a fuga do governador Carlos de Campos para a Zona Leste da capital.
As tropas do exército que se mantinham féis ao governo entraram em São Paulo, mas sem entrar em confronto como os revoltosos, passaram a bombardear aleatoriamente diversas regiões da cidade, com canhões sem precisão, provocando mortes de civis e destruição de empresas e residências.
A cidade foi tomada pelo caos, com a população desnorteada, sem saber para onde ir. Muitos deixaram a cidade e grupos de aproveitadores passaram a promover saques no comércio. Os incêndios se alastravam.
Em 7 de julho, a ACSP divulgou um manifesto afirmando que “somente dentro da ordem era possível prosperar” e manifestou apoio ao governador em carta entregue aos chefes dos rebeldes, os responsabilizando pela situação caótica e pelos danos à população.
Apesar disso, o presidente da ACSP, José Carlos de Macedo Soares, e o prefeito Firmiano Pinto, procuraram os revoltosos, que eram o poder efetivo na região central, visando conseguir autorização para tomar medidas para enfrentar os problemas que afetavam os empresários. O contato com os rebeldes era a única alternativa, porque eram de fato os que controlavam a região e, também, porque não tinham qualquer informação, ou possibilidade de contato com o governador.
O General Dias Lopes, comandante dos invasores, afirmou que reconheceria a autoridade do prefeito nos assuntos de administração da cidade, mas que nada poderia fazer para evitar os riscos e inconvenientes que assolavam a população.
A ACSP e o Prefeito, com a colaboração de diversas entidades, organizaram a Guarda Civil e o Corpo de Bombeiros, como medidas para conter os saques e os incêndios, embora a cidade continuasse a sofrer com os disparos aleatórios das forças federais.
Quando surgiu a informação de que São Paulo sofreria um bombardeio aéreo, José Carlos Macedo Soares e um grupo de empresários e outras personalidades tentaram demover o Ministro da Guerra do bombardeio da cidade, mas este respondeu, devidamente autorizado pelo Presidente, que não poderia evitar, pois era uma alternativa necessária para derrotar os rebeldes.
Tentaram, então, convencer os rebeldes a abandonar a cidade, mas o bombardeio aconteceu antes que isso ocorresse. São Paulo foi bombardeada pela aviação do Exército, mas as áreas ocupadas não foram atingidas, apenas os bairros industriais e operários, como Tatuapé, Mooca e Vila Maria e Pari, com grandes danos materiais e perdas de vida.
Na madrugada do dia 28 os rebeldes abandonaram a cidade em direção ao interior, deixando atrás um rastro de destruição e mortes, mas a maior parte provocada pelas forças federais. Esse, no entanto, não foi o fim desse episódio que marcou o mês de julho na história da ACSP. Em 30 de julho, Macedo Soares faz um relatório para a diretoria sobre sua atuação e as medidas que a entidade adotou visando reduzir os problemas e dificuldades enfrentadas pelos empresários e pela população.
Em 4 de agosto, no entanto, o presidente da ACSP é intimado a comparecer ao Rio de Janeiro, sendo preso, acusado de ter colaborado com os rebeldes, sendo depois exilado. Em seu exílio na França, José Carlos Macedo Soares escreve um livro, Justiça, no qual relata os acontecimentos, justifica suas ações e apresenta dois pareceres. O primeiro, de um Jurista que demonstra que o ataque aéreo às populações civis contrariava as Convenções Internacionais, e outro de um Perito Militar que mostrava que o bombardeio de São Paulo foi absolutamente inútil do ponto de vista militar, sendo usado para aterrorizar a população e colocá-la contra os rebeldes para que pressionassem a se render.
José Carlos Macedo Soares, após a volta do exílio, continuou na vida pública, tendo sido presidente do Instituto de Estatística, hoje IBGE, interventor em São Paulo, Ministro da Justiça e das Relações Exteriores, membro das Academias Paulista e Brasileira de Letras.
O período de contestações e rebeliões de grupos civis e militares, iniciado pelos “tenentes” em 1922 no Rio de Janeiro, e que ficou conhecido como “A Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, continuou em São Paulo em 1924 e foi sucedido por diversas tentativas de revoltas em outros estados.
Na eleição de 1930, Washington Luiz rompe a “política do café com leite”, em que se alternavam na presidência mineiros e paulistas, e impõe a candidatura de Júlio Prestes para presidente, que foi eleito. O resultado da eleição foi contestado e serviu de motivo para a deposição de Washigton Luiz 16 dias antes da posse de Júlio Prestes, que não assumiu. Com a ruptura do pacto com os paulistas, os políticos mineiros se uniram aos do Rio Grande do Sul e oposicionistas de outros estados e fundaram a Aliança Liberal. Os militares tomaram o poder e nomearam Getúlio Vargas como presidente provisório.
Era o fim da chamada “República Velha” das oligarquias e da chamada “política do café com leite”, com a vitória da Aliança Liberal, chefiada por Getúlio Vargas em 1930.
A Aliança Liberal anistiou os revoltosos de 1922, 24, 25 e 27 e prometia o voto secreto, a modernização da economia e o avanço dos direitos sociais.
Ao assumir o Poder, Getúlio Vargas se comprometeu a fazer uma nova Constituição, atendendo aos anseios dos grupos que o apoiaram, mas não cumpriu a promessa, se transformando em ditador, com o apoio de alguns militares que participaram da campanha para derrotar o governo anterior.
Começava um novo ciclo da vida brasileira, com a revogação da Constituição de 1891, que dava alguma autonomia aos estados, o fechamento do Congresso, das Assembleias Legislativas estaduais e Câmaras Municipais. A substituição de governadores por interventores nomeados por Getúlio, sem levar em conta as lideranças locais, inclusive indicando desconhecidos sem qualquer vínculo no estado, acabou gerando desencontros. Além disso, as dificuldades econômicas resultantes da crise de 1929 aumentaram a insatisfação da população paulista, e as críticas ao presidente.
Os apelos da ACSP e demais entidades paulistas pelo restabelecimento da normalidade institucional, com a volta do regime constitucional, foram inúteis.
Os protestos se sucediam e um episódio serviu de estopim para que as lideranças de São Paulo se mobilizassem para exigir uma Constituinte e o restabelecimento do regime democrático. Em uma manifestação estudantil, realizada na noite de 23 de maio de 1932, quatro estudantes, Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo, foram mortos por tropas federais (um quinto, Orlando de Oliveira Alvarenga, faleceu posteriormente), dando origem ao grupo MMDC.
Depois de esgotadas todas as tentativas de sensibilizar o presidente provisório a convocar a Constituinte, e a exigência de que fossem ouvidos para nomeação do interventor, a sociedade paulista passou a se mobilizar para tentar a derrubada do governo pela via militar. Contavam os defensores que à medida que as tropas paulistas avançassem, outros estados se uniriam a elas.
A ACSP desempenhou importante papel na Revolução Constitucionalista, desde a mobilização até a logística, e na captação de recursos para o esforço bélico. Organizou a campanha “OURO PARA O BEM DE SÃO PAULO”, que contou com grande participação de todos os extratos da sociedade, desde os mais humildes às camadas mais abastadas. Todos procuravam colaborar de acordo com suas posses. Joias de família, alianças e objetos pessoais eram entregues na entidade e os doadores recebiam um anel de ferro com a inscrição “Ouro para o Bem de São Paulo”.
No dia 9 de julho de 1932 teve início a Revolução Constitucionalista, com a partida das tropas rumo ao Rio de Janeiro, sob aplausos de uma grande multidão, mas com poucos armamentos, nenhum treinamento e sem um plano bem elaborado porque contavam com a adesão de outros estados. Apenas Mato Grosso aderiu, enquanto outros estados aguardados foram convencidos por Getúlio de que se tratava de um movimento separatista, e reforçaram as tropas federais.
Quem tiver interesse em conhecer as ilusões, esperanças e desafios dos jovens que se alistaram para ir lutar, sem imaginar o que era uma “guerra real”, pode ler o Diário de Joral, jovem paulista que largou seu emprego e, contra a vontade de sua família e de sua noiva, partiu para o front. Ele conta em detalhes a vida desses jovens idealistas. A ACSP tem o original do Diário e o reproduziu.
Com a rendição em 4 de outubro, sem ter ultrapassado o Vale do Paraíba, as tropas voltaram, derrotadas no campo de batalha face à disparidade no número de soldados e da quantidade e qualidade de armamentos.
Apesar da derrota militar, São Paulo pode se considerar vencedor quando em 1934 Getúlio convocou a Constituinte e passou a indicar interventores paulistas e afinados com as lideranças do estado. Os recursos da campanha Ouro para o Bem de São Paulo foram doados à Santa Casa, que construiu um prédio no centro de São Paulo, com 13 andares e o formato da bandeira paulista.
A ACSP era presidida em 1932 por Carlos de Souza Nazareth, bacharel na Faculdade do Largo São Francisco, que assumiu toda a responsabilidade pela atuação dos empresários paulistas no levante, sendo preso e posteriormente exilado. Através dos diretores da ACRJ, que lhes prestaram toda assistência durante o período de prisão no Rio, encaminhou carta a seus companheiros da ACSP afirmando que partia para o exílio tranquilo com a certeza do dever cumprido, e termina com uma exortação que virou lema da entidade” NÃO ESMORECER PARA NÃO DESMERECER”.
IMAGEM: Paulo Pampolin/DC