Escalada de recuperações judiciais entre médios produtores preocupa o agro

Muitos produtores se endividaram para abrir novas áreas de plantio e comprar equipamentos, mas acabaram surpreendidos pela alta dos juros

Karina Lignelli
25/Abr/2025
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Escalada de recuperações judiciais entre médios produtores preocupa o agro

O agronegócio deve bater novos recordes em 2025, especialmente no segmento de grãos, com safra de mais de 300 milhões de toneladas e um provável recorde histórico. Porém, a saúde financeira de muitas empresas do setor é preocupante.

O volume de pedidos de recuperação judicial é crescente, especialmente entre os médios produtores, que encaminharam 1.272 solicitações em 2024, alta de 138% sobre o ano anterior (dados da Serasa Experian de abril).

Além das questões climáticas, a inflação, a desvalorização cambial e, principalmente, a alta dos juros, foram alguns dos problemas que aumentaram os custos de produção e acabaram afetando o caixa dos produtores - principalmente os pessoas físicas, cuja alta nos pedidos de recuperação foi de 350% na comparação com 2023 (566 pedidos). 

"O pequeno aguenta, o grande aguenta, seja quem planta 150 mil hectares ou 10 mil. O problema é o médio, que cresceu mais do que poderia: comprou outra área, comprou equipamentos, se endividou, mas com os juros reais que estão aí, 7%, 8%, fica complicado", disse um especialista em agronegócio durante reunião do Comitê de Avaliação de Conjuntura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), realizada na quinta-feira (24). 

A pedido da ACSP, os nomes dos participantes desta reunião não são divulgados. 

O especialista também fez um paralelo com o comércio, onde o dinheiro gira muito rapidamente e até é possível gerar caixa. Porém, assim como na indústria ou na construção civil, onde o ciclo de produção é longo e depende mais de juros e financiamento de longo prazo, no agro é mais complicado. 

Dos 5%, 6% de juros que o setor pagava, com a alta agora paga entre 25% e 30%. "O produtor não aguenta mesmo: o que você ganhou vai embora no ano seguinte, no segundo não tem mais o que gastar e, com isso, ele vai para a recuperação judicial", alertou, reforçando que o problema deve continuar. 

Problema se estende

Na área de grãos, o clima favorável deve fazer a safra ser recorde, com abastecimento e crescimento das exportações garantidos. Só não se pode garantir que os preços agirão no sentido de reduzir a inflação, porque no Brasil eles são formados pela composição do câmbio e da política comercial dos mercados internacionais.

"E isso o agro não tem como controlar. Se o câmbio continuar em R$ 6, a tendência é que os preços caiam; mas com a aproximação das eleições e o clima político, vamos ver como vai ficar o seu comportamento", disse o especialista. 

Quanto à política comercial do governo Trump, que está afetando "do petróleo aos automóveis", ele lembrou que o presidente já foi advertido pelos agricultores americanos de que, se perderem o mercado da China, não terão para onde exportar os excedentes comerciais. 

"Tudo indica que os dois players mais importantes estão conversando e logo vão chegar a um acordo sobre as tarifas", disse. "Mas vale lembrar que o Brasil vai ter bastante soja e milho para vender, a produtividade está muito alta. Vai ser um bom ano para a agricultura." 

Por outro lado, no segmento sucroalcooleiro, paira o fantasma das recuperações judiciais. A perda de muitos hectares de cana com as queimadas em 2024, principalmente no Interior de São Paulo, resultou em queda nos preços na virada para 2025. A safra que terminou agora em março também foi calculada com preço menor pelo Consecana (conselho do segmento em São Paulo). "Isso pelo menos contribuiu para reduzir a inflação", lembrou.  

Mas, se por enquanto as usinas continuam "aguentando", segundo o especialista, também há muitos casos de produtores médios que se deram bem, tiveram sucesso, mas ao invés de ficarem nos 20%, cresceram 50% pegando dinheiro emprestado.

"Daí os juros sobem e não há quem resista. Ninguém é vacinado contra recuperação judicial em nenhum setor, e agora a área sucroalcooleira está economicamente exposta."

No mercado externo, o segmento depende das mesmas premissas para grãos, como o câmbio e a política comercial americana. Mas, como metade do seu faturamento vem do etanol, ainda há grande dependência de petróleo. "Já sabemos que o governo Trump vai aumentar a produção de petróleo, vai depender disso o preço continuar caindo. Nós baixamos, agora está US$ 40, mas já ficou US$ 30 o barril. Se continuar barato, vai atrapalhar novamente a lucratividade."

 

IMAGEM: Freepik

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