Crise jogou 9 milhões na pobreza. Só um milhão já saiu

Dois estudos demonstram os efeitos da recessão provocada por Dilma (2015-2016) e a tímida retomada durante o atual governo. Sem a renda anterior, recuperação consistente do comércio e serviços fica difícil

João Batista Natali
18/Dez/2017
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Crise jogou 9 milhões na pobreza. Só um milhão já saiu

Discutir o aumento da pobreza é também explicar as dificuldades para voltar a padrões mais satisfatórios de renda e consumo.

Além dos próprios interessados, os cidadãos, o comércio e os serviços saem perdendo pela evaporação dessa numerosa parcela de consumidores.

A má notícia começou na última sexta-feira, quando o IBGE publicou que 52,2 milhões de brasileiros estavam, em 2016, abaixo da linha de pobreza, definida pelo Banco Mundial.

São pessoas que vivem com menos de US$ 5,50 por dia, ou têm uma renda mensal de R$ 387, em valores do ano passado.

Novo desdobramento desse quadro negativo foi feito com um reprocessamento desses dados pelo Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), entidade com sede no Rio.

Segundo o jornal Valor Econômico, a recessão, entre 2015 e 2016, empurrou 9 milhões de brasileiros para a pobreza. Entre eles, 5,4 milhões se tornaram extremamente pobres. Estão, tecnicamente, na miséria.

A boa notícia veio do FGV Social, cujo diretor, Marcelo Neri, é um dos maiores especialistas na questão. Segundo ele, em 2017 cerca de 1,1 milhão de brasileiros conseguiram deixar a pobreza.

Não pela queda do desemprego, que se recupera com lentidão, mas porque a queda da inflação fez sobrar dinheiro no bolso dos mais pobres.

O FGV Social trabalha define a pobreza como renda mensal inferior a R$ 223 por pessoa de um mesmo domicílio.

O mesmo Marcelo Neri já havia revelado em fevereiro último que 4,3 milhões de famílias, com a recessão provocada durante o governo de Dilma Rousseff, haviam deixado a classe C e caíram novamente para a base da pirâmide de renda.

UMA NOVA RADIOGRAFIA DA POBREZA

Não existe no Brasil uma definição legal do que venha a ser a pobreza ou os limites entre as classes (de A a D) da população, por seu poder aquisitivo.

Mas todos os pesquisadores têm como bíblia o IBGE e seu mais sistemático levantamento, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Foi também na Pnad que o Iets se baseou. Segundo o instituto fluminense, a pobreza extrema (miséria) caiu regularmente entre 2004 a 2014.

Nesse período, os brasileiros com renda diária per capita de US$ 1,90 eram, de início, 23,3% da população, mas passaram a representar só 8% há três anos.

A curva se reverte a partir de 2015, quando os mais pobres subiram para 9,8%, saltando para 13,3% no ano passado.

Ou seja, voltava-se a um patamar de miséria bem próximo ao de 2008, quando a extrema pobreza representava 13,5% dos brasileiros.

Vejamos os que eram ou são apenas pobres. Ou seja, os que, pelos critérios do Banco Mundial, vivem com US$ 5,50 por dia, ou R$ 387 por mês.

A linha evolutiva é semelhante à da miséria: alta em 2004, quedas sucessivas até 2014, e em seguida ascensão em 2015 e 2016.

Em 2004, eram pobres 83,2% dos brasileiros. Essa proporção caiu para 43,1% em 2014. Mas nos dois anos seguintes ela subiu para 48,5% e 52,2%.

É na diferença entre 43,1% e 52,2% que estão os 9 milhões de brasileiros que haviam superado a pobreza e voltaram para ela.

Um detalhe importante: pobres e miseráveis não deixaram suas condições anteriores em razão das políticas assistenciais do governo – bolsa escola, dos anos FHC, ou bolsa família, dos governos Lula e Dilma.

Demógrafos e economistas do IBGE, do Ipea (Ministério do Planejamento) e do mundo acadêmico demonstram que, ao contrário, a renda que permitiu essa ascensão veio do trabalho.

E também de um salário mínimo que, a partir de 2003 (governo Lula), teve aumento acima da inflação, sem levar em conta a produtividade.

Se fosse para depender do bolsa família, a porcentagem de miseráveis permaneceria estável. Mas essa porcentagem subiu.

A propósito, o diretor da FAO (agência da ONU para a Agricultura e Alimentação), o brasileiro José Graziano da Silva, disse em entrevista ao Valor Econômico que 7 milhões de pobres não são cobertos por programas de renda, e que é possível que o Brasil volte ao mapa da fome – acompanhamento mundial da instituição sobre padrões de nutrição.

COMO CHEGAMOS AO FUNDO DO POÇO

Poderia ser anedótico, mas um site de sindicatos de oposição noticiou nesta segunda-feira (18/12) os números do IBGE e os atribui aos personagens que classifica genericamente como os autores “do golpe” contra Dilma – Michel Temer, Aécio Neves e Eduardo Cunha.

Mas a verdade é bem mais simples. Em 2014, quando Dilma se reelegeu em outubro, a recessão já estava instalada desde o segundo trimestre.

Ela surgiu em razão do desequilíbrio fiscal. Com o PIB em queda – e a arrecadação menor – a presidente, já no final de seu primeiro mandato, deu isenções de impostos para favorecer o consumo.

A mágica, que havia funcionado durante a rápida queda do PIB em 2008 (crise do subprime americana), desta vez não funcionou. As famílias estavam excessivamente endividadas.

Com Dilma reeleita, o Partido dos Trabalhadores bombardeou a política responsável do então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que pretendia cortar responsavelmente os gastos públicos.

O governo passou a se financiar nos bancos públicos e no FGTS, praticando as pedaladas fiscais que agravaram ainda mais a situação do Tesouro.

Em lugar de reduzir seus gastos, o governo, já com Nelson Barbosa no comando da equipe econômica, os aumenta, para beneficiar grupos ligados ao governo, cujo dinamismo era pífio.

Ao mesmo tempo, o grande fator de geração de reservas cambiais, a China e suas importações de soja e ferro, passou a registrar crescimento menor. Não precisava mais tanto dos produtos brasileiros.

A chamada “tempestade perfeita” estava montada. E, com ela, o governo perdeu sua capacidade de investimento que poderia dinamizar a economia.

Mas a retórica petista permanecia incólume. O Brasil, dizia ela, era o país em que “40 milhões deixaram a pobreza”. Não era verdade. A pobreza voltava a crescer.

É esse o quadro agora fotografado pelo IBGE e por instituições que trabalham com as estatísticas da Pnad. E elas não são apenas ruins para o PT. São ruins para todo o país.

 

FOTO: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

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