Com a 'taxa da blusinha', prejuízo do varejo pode cair de 57% para 7%

Levantamento da CNC aponta que introdução do imposto de importação de 20% nas vendas até US$ 50 diminui dano ao setor no Brasil. Economista da ACSP alerta, porém, que mesmo com o avanço, solução não é definitiva

Karina Lignelli
06/Jun/2024
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Com a 'taxa da blusinha', prejuízo do varejo pode cair de 57% para 7%

O Senado aprovou na noite de quarta-feira (5) o PL 914/2024, que contempla o fim da isenção do imposto de importação em produtos até US$ 50 (adquiridos de plataformas classificadas no Programa Remessa Conforme), tributando-os em 20%.

Nomeada de "Taxa das Blusinhas", a medida, que se tornou uma emenda ao Projeto Mover, do Governo Federal, acatou em parte a reivindicação do varejo e da indústria por isonomia tributária em relação aos marketplaces internacionais, como Shein, Shopee e Alibaba. 

Considerada positiva, mas com ressalvas por entidades de varejo, como Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) e a Confederação Nacional do Comércio (CNC) - que elaborou estudo comparando impactos da isenção e da taxação -, a medida deve reduzir de 57% para 7% o prejuízo no volume de vendas do setor.  

De acordo com a CNC, a proposta diminui potenciais danos concorrenciais ao varejo brasileiro, e a "suavização do efeito" se explica pela renda média baixa do consumidor brasileiro, altamente sensível ao aumento de preços. Assim como a aversão desse consumidor ao imposto de importação - o que ajudaria a reduzir o volume de importações. 

Os motivos são simples. Pelo levantamento, com a proposta inicial do Remessa Conforme, em vigor desde agosto de 2023, permitindo que as plataformas estrangeiras usufruíssem da isenção, o custo tributário de importação, pago pelas empresas brasileiras nessa operações, vinha gerando um custo médio de competitividade de 117% no preço final. 

Ou seja: um produto importado de cerca de R$ 250 (ou US$ 50), importado legalmente por uma empresa nacional, seria vendido ao consumidor por R$ 630. Por outro lado, um produto importado via marketplace internacional sairia por R$ 290. 

Com isso, ainda segundo o estudo, com o Remessa Conforme em vigor, a quantidade de compra de importados até US$ 50 cresceu 35% ante 2022. Liderando as encomendas, artigos vindos da China (51,8%), seguidos por Argentina (6,2%) e Paraguai (5,9%). O levantamento se baseou em microdados de compras internacionais de 10 mil tipos de bens de consumo pela Secretaria de Comércio Exterior do MDIC, classificados pela Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM).  

Em nota, a CNC, que reiterou a importância da aplicação imediata da alíquota de 20%, não só para minimizar danos à economia brasileira, mas proteger empregos e renda no comércio, afirmou que é importante destacar que o Remessa Conforme gera uma condição de competição injusta para o varejo brasileiro, ameaçando empregos e renda gerados pelas empresas do país. 

"A taxação não configura um aumento de impostos para o consumidor final, mas uma ação necessária para garantir a sustentabilidade do comércio nacional", informou a confederação, reforçando que "acompanha com atenção a sanção presidencial para o PL que cria o dispositivo de 20%." 

PEQUENO AVANÇO

Outro estudo, da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), aponta que o ideal mesmo seria reestabelecer a alíquota de 60% em tributos federais sobre importações, no Programa Remessa Conforme, para finalmente promover isonomia tributária entre operações de marketplaces estrangeiros e o mercado nacional.  

Com opinião semelhante à da CNC, para o IDV o retorno do Imposto de Importação foi "um importante passo a caminho da isonomia tributária, contribuindo para a manutenção de milhares de empresas e empregos", gerando riqueza dentro do país.

"(...) Raramente vimos uma causa na qual a concordância com o restabelecimento do imposto teve tanto apoio do Congresso Nacional, e esperamos que a proposta seja sancionada pelo presidente da República: afinal, não estamos discutindo uma nova taxação, mas sim, a recuperação de alguma tributação para produtos antes taxados em 60%"

A entidade também considerou a medida um primeiro passo, uma vez que o percentual de 20% de Imposto de Importação foi o possível neste momento, "porém, ainda insuficiente para se estabelecer a desejada equidade concorrencial."

Mesmo considerando a medida um certo avanço, já que, em sua avaliação, "é melhor tributar os importados em 20% do que nada", o economista-chefe da ACSP, Marcel Solimeo, destaca que o que se procura é uma solução que possa contentar a todos, mas isso não é possível.  

Se a questão prejudica o comércio e a indústria brasileiros, prejudica também o emprego, afirma. "Ah, mas beneficia o consumidor, dizem. Mas só beneficia o consumidor se ele estiver empregado. Estão procurando caminhos, mas são mais complicados: seria muito mais prático fazer como os países da OCDE, que acabaram com a isenção", destaca Solimeo.

O economista lembrou das importações legais, registradas na Receita Federal, mas que ao mesmo tempo concorrem com plataformas que não estão no Brasil, não estão registradas aqui e não recolhem nem o ICMS porque os produtos chegam de pessoa física para pessoa física. 

"Você compra num site aqui, e o produto vem de fora como sendo de PF para PF, com valores claramente subfaturados. Nos países da OCDE é diferente: além de responsabilizar plataformas, eles obrigam sites sem representação local a recolher o imposto antes da remessa", destaca. "Por isso a taxação de 20% não resolve o problema, a concorrência vai continuar desigual." 

Solimeo também lembra a medida antiga, que antes previa isenção para encomendas internacionais entre pessoas físicas, pois eram "envios familiares", de valores baixos e em quantidades pequenas, que não justificavam o custo administrativo da alfândega. 

"Mas com a chegada dessas plataformas, tudo virou 'negócio'. Aqui, o problema não é só recolher ICMS: tem encargos trabalhistas, normas sanitárias... é uma tributação indireta que chega a 40%, segundo o IBPT. Por isso o mais simples seria acabar com a isenção."

Reforçando que tributar em 20% é melhor que nada, o economista da ACSP alerta que a medida impede uma solução definitiva. "Se a solução é para beneficiar o consumidor, que se reduza o imposto local para todos competirem igualmente. Do jeito que está, estamos 'exportando' emprego, mas todo mundo esquece que o consumidor vive desse emprego."

Considerada um "jabuti", já que foi incluída em um projeto com o qual não tem relação (o Mover, de mobilidade verde e inovação), a "Taxa das Blusinhas" foi aprovada em votação simbólica ontem por iniciativa de senadores governistas. Por esse motivo, mesmo já aprovada pelos deputados, o Mover, onde foi adicionada, retornará para análise da Câmara pois o relator, Rodrigo Cunha (Podemos-AL), fez alterações e tirou trechos do texto inicial do projeto. 

 

IMAGEM: Thinkstock

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