Até quando vai a febre do pistache?

Infinidade de produtos feitos à base da oleaginosa vai do setor de alimentos ao da beleza e deve movimentar a indústria nos próximos anos com a expansão do ingrediente para outras categorias. Até novembro de 2024, as importações da semente cresceram 80% na comparação com igual período de 2023, um ano que, por sua vez, já havia visto um crescimento de 70% na comparação com 2022, segundo estatísticas do governo federal

Mariana Missiaggia
15/Jan/2025
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Até quando vai a febre do pistache?

Com vitrines cada vez mais verdes, padarias, sorveterias e docerias nunca consumiram tanto pistache. Na moda desde 2023, o potencial desse ingrediente não se restringe ao segmento de alimentos e bebidas, ele tem chamado a atenção de outro mercado: o da beleza. Perfumes, maquiagens, xampus, óleos e outros cosméticos ganharam suas versões.

Nos últimos meses, a hashtag #PistachioPerfume teve mais de 1 bilhão de visualizações no TikTok. Os vídeos são relacionados ao perfume Fluy Pistachio Intense, que rendeu outra série de reproduções de fragrâncias com pistache, como o body splash, da WePink, e o perfume Tropicália, da Granado.

Ao que parece, o apelo nutritivo e as propriedades multifuncionais do pistache funcionam bem para a crescente demanda por ingredientes naturais, eficazes e sustentáveis no ramo da beleza. Rica em vitaminas, proteínas, minerais, ácidos graxos essenciais e antioxidantes, a semente pode trazer benefícios para a pele e o cabelo.

Diante de tantas opções de uso para a semente que apareceram no mercado, o questionamento que surge para o empreendedor é: ainda vale a pena investir nessa tendência ou ela já está passando?

Tudo indica que a inundação de pistache ainda vai longe. A aposta da consultoria WGSN, especializada em comportamento e tendências, é que nos próximos anos a presença da semente será ainda mais forte. Por isso, em 2025 vamos continuar a ver o pistache nas indústrias de alimentos e bebidas e na de beleza, tanto nos aromas como em ingredientes e cosméticos.

A explicação da consultoria é a seguinte: olhando pelo viés comportamental, produtos que entram na moda costumam ser caros e pouco acessíveis. O apelo de exclusividade traz uma dinâmica similar ao desejo por itens de luxo. E não é à toa que o pistache tem essa particularidade.

Da mesma família da manga e do caju, ele é uma drupa – fruto com uma única semente, que é a parte que consumimos - e é originário da Ásia Central. Sua árvore demora até 10 anos para atingir a fase de produção completa. A partir daí, se cuidada, pode durar mais de 100 anos.

Nativa do Oriente Médio, onde há milênios faz parte da cultura alimentícia, sua indústria floresceu no Irã, mas foi nos Estados Unidos, na década de 1930, que houve o primeiro boom no cultivo comercial após o rompimento das relações com o Irã.

As sanções impostas pelos norte-americanos restringiram o acesso das empresas iranianas aos financiamentos internacionais, enfraquecendo a indústria daquele país. Em 2009, surge a American Pistachio Growers (APG), uma associação que representa mais de 800 agricultores americanos com objetivo de incentivar o consumo da semente. A partir de 2012, os Estados Unidos assumem a liderança mundial na produção do pistache.

Hoje, os norte-americanos respondem por mais de 60% da produção global e estão bem à frente do antigo líder, o Irã, e da Turquia, também um tradicional produtor. Segundo relatório produzido pelo Rabobank, banco multinacional que financia o agronegócio, o pistache é a nova queridinha no mercado de nozes e castanhas dos Estados Unidos, sendo, de longe, o produto que mais cresce, por ser muito mais rentável do que as tradicionais amêndoas e nozes-pecã - ainda muito fortes por lá.

O maior mercado comprador de pistache dos Estados Unidos é a China, onde há a tradição de consumir e presentear com a semente no Ano Novo Lunar. Com a maior procura global pelo produto, os produtores viram a possibilidade de diversificar mercados. A América Latina é um desses mercados em expansão, com exportações crescentes para o México e Brasil.

BRASIL

No Brasil, onde não há uma produção nacional significativa, se observa o crescimento expressivo das propostas de produtos com pistache. Até novembro de 2024, as importações da semente já eram 80% maiores em relação a 2023 - um ano que, por sua vez, já havia visto um crescimento de 70% na comparação com 2022, segundo as estatísticas de comércio exterior do governo federal.

Das mais de mil toneladas de pistache importadas em 2024, 85% desse volume vieram dos Estados Unidos, que têm batido recorde na produção ano após ano. Essas superplantações, especialmente na região da Califórnia, são outro indicativo de que essa febre tem tudo para não ser temporária, na análise de David Maganã, analista da indústria de nozes e castanhas do Rabobank.

No Brasil, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), por meio de seu escritório de comércio agrícola em São Paulo, vem desenvolvendo desde 2020 uma série de atividades promocionais para aumentar a visibilidade do pistache. O relatório de 2024 aponta o mercado brasileiro "como um terreno fértil para os exportadores".

Para dar ainda mais destaque à semente, o USDA investe em feiras internacionais de alimentos, projetos com chefs influentes no Brasil, parcerias com restaurantes renomados em São Paulo e a promoção do pistache em aulas de culinária com mais de 40 influencers do ramo de gastronomia. Ou seja, uma verdadeira campanha de marketing que permeia o poder de influência de chefs, restaurantes e receitas de TikTok a fim de promover o pistache.

Esse trabalho é acompanhado há alguns anos por José Eduardo Camargo, presidente da Associação Brasileira de Nozes, Castanhas e Frutas Secas (ABNC), que não sabe definir o quanto desse boom vem de todo um esforço e impulso do mercado americano e o quanto é um movimento natural por se tratar de algo raro, saboroso e de qualidade. O que ele acredita, de fato, é que quando se trata de um produto bom, ele vai ganhando força naturalmente.

Nas redes sociais, qualquer lançamento relacionado ao pistache tem como hábito viralizar. Sorvetes, panetones, chocolates recheados, bolos - tudo com pistache chama a atenção de quem navega na rede. Na Cacau Show, a decisão de incluir o ingrediente no catálogo foi basicamente imposta pelo cliente, segundo Lilian Rodrigues, diretora de marketing da empresa. O maior uso do pistache pode ser percebido com facilidade nas lojas e tem performado no faturamento geral da marca.

Além de ter sido o sabor de panetone mais vendido (e esgotado) em 2023, em outubro de 2024, a marca lançou um festival dedicado ao pistache. O plano era faturar R$ 100 milhões com os 10 produtos da linha em 20 dias. Hoje, os itens com a semente representam cerca de 1,5% do faturamento das operações da Cacau Show ao longo do ano, mas passaram dos 6% durante a campanha. 

Na rede de sorveterias Bacio di Latte, uma das maiores do Brasil, o sabor pistache tem sido o mais vendido desde a abertura da primeira loja, em 2011. Fundada por sócios italianos em São Paulo, a marca tem 30 produtos baseados na semente, que vão de picolés a velas. O sabor é o preferido em todas as 200 lojas, que nos últimos três anos sentiu o volume de pistache quadruplicar, de acordo com o setor de marketing da empresa.

Especialista em tendências, Mônica Sorez dá uma pista importante para os empresários que ainda não sabem se devem ou não apostar na semente. Para pequenos negócios, algumas poucas semanas de testes são suficientes para que um novo produto entre no cardápio - por isso, dificilmente eles perdem uma moda.

Já para as grandes e para a indústria em geral, fica bem mais difícil. O investimento em criação pode ser milionário, o desenvolvimento pode levar meses ou até anos e o retorno nem sempre é garantido - por essa razão, dificilmente o que se vê nas prateleiras de um supermercado se tratará de uma modinha passageira, ainda mais quando se vê isso acontecer em massa.

"O ouro está em entender uma verdadeira mudança de comportamento, não cair em relatórios tendenciosos e conhecer verdadeiramente o seu cliente", diz Mônica.

 

IMAGEM: DC

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