Para fortalecer poder de barganha, pequenos varejistas se unem
Para negociar em condições de igualdade com as grandes indústrias, as associações de compras que, floresceram nos tempos de hiperinflação, voltam a ganhar peso
Um dos principais desafios dos varejistas em época de inflação empinada, como agora, é negociar preços com os fornecedores. Se sua empresa for de pequeno porte, com no máximo quatro caixas, seu poder de barganha será próximo de zero.
Solitário, fica difícil convencer grandes indústrias, principalmente as donas de marcas líderes, a fazer qualquer concessão em relação às políticas de preços e prazos de pagamento. As melhores condições são naturalmente oferecidas aos grandalhões, como Pão de Açúcar, Carrefour, Walmart.
Para enfrentar esses tempos bicudos, os pequenos varejistas estão se unindo em associações que, em nome deles, fazem as negociações com os fornecedores.
Com gestão profissionalizada, negociam preços, prazos de entrega, produzem encartes com ofertas para os consumidores, e promovem encontros dos pequenos empresários para discutir problemas e soluções.
Na verdade, a formação de pool de supermercados para negociar preços com os grandes fornecedores se fortaleceu na fase da hiperinflação, entre 1980 e 1994. Algumas associações chegaram a reunir cerca de 50 pequenos supermercados, na tentativa de driblar os reajustes de preços.
Ainda assim, muitos desses mercadinhos não resistiram, acabaram sendo incorporados ou simplesmente passaram o ponto para os gigantes do setor. “Eles chegaram a perder o charme”, diz Álvaro Furtado, presidente do Sincovaga, sindicato que reúne cerca de 40 mil pequenos supermercados paulistas. Este movimento ocorreu, principalmente, a partir de meados da década de 90.
Agora, está formada a tempestade perfeita para que as associações voltem a ganhar peso, e atrair novos pequenos supermercadistas. A Rede Super Vizinho, união de dez supermercados, acaba de contratar um novo gestor para reestruturar a associação com o propósito de entrar na briga pela melhor barganha.
Criada em 2001, a Super Vizinho, que chegou a reunir 50 empresas, tem planos de dobrar para 20, ao menos, o número de associados até o final deste semestre.
A favor desses pequenos supermercados está o cliente. Diferentemente do que acontecia no passado, quando o consumidor preferia fazer uma compra mensal em um grande hipermercado (aliás, uma forma de escapar dos reajustes dos preços que chegavam a ser diários), hoje, ele prefere frequentar várias vezes ao mês o supermercado da vizinhança.
Desta vez, apesar de os preços estarem em alta, como no passado, os reajustes não chegam àqueles dois dígitos de antes, que ocorriam diariamente.
“A união dos pequenos supermercados é uma saída para enfrentar a crise, e não ficar tão dependente das grandes indústrias e do atacado”, afirma Dirceu Netto, gerente geral da Super Vizinho, que possui um centro de distribuição (CD) de cerca de mil metros quadrados no bairro do Jaguaré.
É para lá que os produtos são encaminhados, depois que a negociação com a indústria é concluída. A cada dia a associação negocia exaustivamente preços e prazos com cerca de 5 a 10 fornecedores.
Quando os produtos chegam ao CD, funcionários da própria associação se encarregam de fazer a separação dos produtos para cada um dos sócios que, geralmente, recebem as mercadorias entre 7 e 10 horas.
É o supermercado com cerca de dez check outs que mais sofre na hora de negociar com os fornecedores. Por ser pequena, a loja acaba não entrando na competição por preço e serviço. Vende mais caro e se limita a atender um público que reside na proximidade.
“Agora, o lojista médio precisa encontrar alternativas para sobreviver, principalmente na crise", diz Álvaro Furtado, presidente do Sincovaga. "E sua participação em um grupo, muitas vezes, significa sua própria salvação”. O processo de adesão das lojas é diferente para cada associação. Para algumas, as etapas estão citadas abaixo.
O supermercado Yamato, localizado na avenida Jabaquara, é um exemplo típico. Sócio da Rede Super Vizinho, o Yamato consegue vender as mercadorias com preços 2% a 3% inferiores aos dos rivais, por conta disso.
Os encartes com produtos em destaque, também providenciados pela associação, são fundamentais para atrair clientes para as lojas. “Hoje, muitos consumidores só entram na loja se ela possui tabloides. Eles querem preço baixo”, afirma Flávio Augusto Pandolfi, gerente do supermercado.
A Rede 10, que reúne 21 lojas em um raio de 60 quilômetros a partir de Ribeirão Preto, já centraliza a compra, recebe as mercadorias, mas são os lojistas que vão até o CD buscar as mercadorias. No caso dos produtos perecíveis, sim, as entregas são feitas diretamente nas lojas dos associados.
“Sempre tem supermercadista nos procurando para entrar no grupo de compras", diz Fernando Fidalgo, gerente de compras da Rede 10. "O fato é que ou ele fica bem pequeno ou, se tiver mais de quatro check outs, sozinho, não sobrevive. Não consegue ser atendido pela indústria, tem de comprar no atacado e, portanto, fica sem preço. O que nos ajuda muito são os encartes, com 100 a 120 produtos por semana”,
A rede Arcos, considerada uma das maiores associações de pequenos supermercadistas de São Paulo, surgiu em 1998 e chegou a ter mais de 200 lojas associadas, mas, ao mesmo tempo, são sempre 45 ou 46 lojas. Hoje, possui 43 lojas ativas.
Todo o processo de compra é informatizado. Os pedidos e a negociação são disponibilizados para os sócios via intranet. A associação trabalha com mais ou menos 80 fornecedores, entre eles Cargill, BRF, JBS, Seara, Aurora, Vigor e Ambev.
Diferentemente da Rede Vizinho e da Rede 10, a Arcos não possui centro de distribuição. A entrega dos produtos negociados em forma de pool é feita diretamente nos supermercados. Dependendo do produto, a compra conjunta permite uma redução de preços de 3% e 10%.
José Eduardo Carvalho, diretor da rede de supermercados Violeta, com quatro lojas, já precisou do grupo de compra para tocar o seu negócio. “Até duas lojas vale a pena. Mas depois, quando o negócio começa a crescer, o empresário anda com as próprias pernas”.
Em momentos de crise surgem várias alternativas para enfrentá-la. Se a economia voltar a crescer, e os preços voltarem a ficar comportados, provavelmente, essas associações podem novamente perder força, na avaliação de Fábio Pina, sócio da FFA, empresa de consultoria especializada em pesquisa e análise macroeconômica.
“O problema que vejo neste negócio de compra conjunta é que todos conhecem as encomendas de todos. Mas, em um momento de crise, pode funcionar.”