Onde as vendas deixaram de pipocar
Na avenida Celso Garcia, no Belenzinho, quem fabrica e comercializa carrinhos de pipoca e cachorro quente, como Paulo Ferreira, dono da Kit Pol (na foto), sente falta de clientes

Em época de crise, vender doce, pastel, pipoca e cachorro quente nas ruas torna-se uma alternativa para a sobrevivência de muitas famílias. Diferentemente do que ocorreu em outros períodos de retração econômica no país, este é um movimento que não se vê, ao menos por enquanto, em São Paulo.
Na avenida Celso Garcia, no bairro do Belenzinho, perto do número 1.000, faltam clientes para as duas dezenas de fábricas e lojas que comercializam equipamentos para ambulantes e para quem quer vender comida na garagem de casa.
“Normalmente, em época de desemprego, como agora, o pessoal corre aqui. Neste ano, o comércio está parado. Tive 22 funcionários. Hoje tenho dez”, diz Paulo Ferreira, dono da Kit Pol Máquinas, que comercializa kits completos para a venda de batata frita, churrasco grego e outros alimentos nas ruas.
Com duas lojas na avenida, especializadas em equipamentos para autosserviço, como balcões refrigerados e máquinas para fazer pão, André Luis Moreira, dono da Comercial Bonsucesso, diz que as vendas caíram 30% neste ano em relação a igual período de 2014.
“Aquela situação em que o trabalhador, assim que rescindia o contrato de trabalho, corria para montar uma mini padaria nos fundos da casa, não se vê neste ano”, diz Moreira.
O ritmo de vendas da Kit Pol e da Bonsucesso é praticamente o mesmo das concorrentes Makitel, Tucano, Refrigeração Avenida e Comercial Vitória, que estão na mesma avenida.
“O pessoal está com muito medo de arriscar. Em outros tempos, o telefone da loja não parava de tocar. Escuta! O telefone não toca”, diz Jarbas Costa, vendedor da Tucano, que comercializa carrinhos para venda de pipoca e cachorro quente.
Até que na manhã da última segunda-feira (10/08) ele deu sorte. O casal Débora e Milton Bonifácio, de Jundiaí (SP), adquiriu um carrinho de pipoca na loja por R$ 2.200.
“Quero estudar e ficar mais com meus filhos. Vou colocar alguém para vender pipoca para mim. Se der certo, vamos comprar mais quatro carrinhos”, diz Débora. Para Jarbas, é bem provável que este plano do casal fique só na intenção.
Quando a economia perde o fôlego, costuma aumentar o número de vendedores ambulantes interessados em aderir a um plano de saúde ligado à categoria de trabalhadores, como reflexo da perda de emprego com carteira assinada.
“Em julho, houve desistência de 30%, em vez de crescer a procura pelo plano de saúde”, afirma Eduardo Montalto, diretor da AVVASP (Associação dos Vendedores Autônomos e Ambulantes do Estado de São Paulo).
“O que escutamos dos ambulantes é que as vendas em locais que sempre foram de grande movimento, como a rua 25 de Março e ruas do Brás, caíram assustadoramente”, diz ele.
FALTA CONFIANÇA NA ECONOMIA
“A confiança no país, de maneira geral, foi abalada. Não dá para negar que estamos em um período difícil no Brasil”, diz Alfredo Firmino de Carvalho, consultor do Sebrae-SP.
Quem confirma a dificuldade que o país enfrenta é Nilda Consolação da Silva, 66 anos, que trabalha há 36 anos com uma barraca na esquina das ruas José Paulino com Ribeiro de Lima, no bairro do Bom Retiro.
"Cheguei a faturar R$ 600 por dia aqui neste lugar com a venda de cachorro quente. Hoje, não posso mais vender cachorro quente, está proibido pela prefeitura de São Paulo. Com a venda de doces dá para tirar R$ 180 a R$ 200 por dia", diz Nilda. "Não aconselho ninguém a entrar hoje neste negócio".
Para o consultor do Sebrae SP, em período recessivo, o empresário tem de trabalhar mais. "Na crise, em qualquer lugar do mundo, as pessoas vão continuar se vestindo e comendo. A demanda por alimentação fora de casa não vai deixar de existir”, afirma Carvalho.
Neste momento de crise, na sua avaliação, quando há um desânimo geral, o empreendedor, seja pequeno, médio ou grande, precisa inovar. “O que o carrinho de pipoca ou de cachorro quente oferece de diferente para o cliente?”, diz Carvalho, referindo-se às lojas, por exemplo, da avenida Celso Garcia.
A fábrica e a loja precisam inovar na hora de oferecer os equipamentos para os potenciais empreendedores, assim como esses precisam inovar para atrair os consumidores.
A Mix Barracas, na mesma avenida Celso Garcia, entrou no e-commerce há quatro anos. Nos dois primeiros anos, o resultado foi pífio. Hoje, as vendas pela internet representam cerca de 40% da receita da loja.
“Decidimos também fazer barracas e carrinhos diferenciados, com um material de melhor qualidade do que o usado pelos concorrentes, e estamos conseguindo manter, neste ano, as vendas parecidas com as do ano passado”, afirma Carlos Figueiredo, dono da Mix, que produz e vende barracas e carrinhos para cachorro quente.
Com crise ou sem crise, os pequenos empreendedores, na avaliação do consultor do Sebrae-SP, possuem enorme vantagem em relação aos grandes: a proximidade com o cliente.
Para exemplificar, ele conta o caso de um ambulante que vendia paçoca nas ruas do Rio de Janeiro e que acabou virando palestrante em eventos para discutir empreendedorismo.
“Para ele, todo o consumidor sempre tinha razão. Ele possuía um cadastro de clientes, que eram presenteados com uma caixa de bombom no dia do aniversário. Ele dizia: ‘o cliente gasta R$ 1.000 comigo por ano e uma caixa de bombom custa R$ 6’”.
CRIATIVIDADE
É possível um vendedor de pastel na rua se dar bem, na avaliação do consultor do Sebrae-SP, mesmo que esteja em uma área de concorrência acirrada e em um mercado em crise. “Não precisa gastar um caminhão de dinheiro para se diferenciar. É preciso ser criativo.”
Sem mexer no preço, o dono de um trailer adaptado para o comércio de lanches fez uma promoção. Quem conseguisse comer, em dez minutos, quatro do maior cachorro quente (com três salsichas) do cardápio, ganharia uma passagem com direito a acompanhante.
“Tinha fila para comer o sanduíche no trailer. Ninguém conseguiu comer os quatro sanduíches, mas o empreendedor saiu trailer e hoje está em uma loja física”. Este caso é o da Charles Dog, casa de lanches especializada em cachorro quente, que fica na avenida Braz Leme, zona Norte de São Paulo.
INTERNET
Não importa o tamanho do negócio, estar na internet, hoje, é questão de sobrevivência do negócio, na avaliação do consultor do Sebrae SP. “O que a gente percebe nessas ruas que reúnem fábricas e lojas de equipamentos para pequenos empreendedores é que os empresários não têm nem site institucional.”
No universo das micro e pequenas empresas, diz ele, apenas 22% delas possuem site institucional e apenas 14% delas vendem pela internet. “Se o cliente não vem até nós, nós vamos até o cliente”. Esta tem de ser a filosofia dos empresários, especialmente neste período de crise. O Sebrae SP (www.sebraesp.com.br) está preparado para orientar os empresários em processos de gestão administrativa e financeira.