Netshoes aposta no 'fisital' para se aproximar dos clientes
A proposta de unir o físico e o digital tem crescido a fim de oferecer uma experiência completa ao consumidor; o e-commerce esportivo abriu um outlet dentro do Magazine Luiza e prepara uma loja conceito na Avenida Paulista

Nos últimos anos, uma tendência tem ganhado força no mercado varejista: grandes empresas que nasceram no digital e operavam exclusivamente no e-commerce estão investindo cada vez mais em lojas físicas.
O movimento, que pode parecer contraditório à primeira vista, tem como base a necessidade de fortalecer a relação com os clientes e ampliar as opções de experiência de compra. Mas a ideia é operar nos dois ambientes, o chamado “fisital”.
Como destaca Luiz Marinho, sócio-diretor da Gouvêa Malls, o físico-digital tem dois lados da moeda. “Manter um único ponto de venda é restringir demais o negócio. Hoje, é possível fazer live streaming para vender nas redes sociais, assim como os e-commerces terem um ponto físico para se relacionar com seus clientes.”
Prova disso é a recente inauguração da loja física da Netshoes em São Paulo - o tradicional e-commerce especializado em produtos esportivos.
A unidade tem um formato de outlet em um espaço de 2 mil metros quadrados dentro do Magazine Luiza da Marginal Tietê. Segundo a empresa, são mais de 18 mil peças em exposição e com descontos médios de 45% sobre os preços originais dos produtos.
A Netshoes já teve uma loja física no passado, mas não vingou. A jornada começou em uma garagem, no ano 2000, quando a primeira loja foi inaugurada na rua Maria Antônia, na Vila Buarque, em São Paulo.
O crescimento acelerado levou a Netshoes a migrar totalmente para o online, revolucionando o mercado e se tornando referência no segmento esportivo. Em 2019, passou a fazer parte do Grupo Magalu.
Para Graciela Kumruian, CEO da Netshoes, a decisão de abrir um ponto físico é uma maneira de se aproximar ainda mais dos consumidores, oferecendo a experiência de ver e provar os produtos antes de realizar a compra.
“A loja física sempre esteve em nossos planos. Queremos estar mais próximos dos nossos consumidores, oferecendo a oportunidade de ver e sentir de perto os produtos antes de decidir a compra. Essa opção é para aqueles que preferem essa experiência e representa uma chance de atrair novos clientes”, diz Graciela.
A expansão para o offline é uma estratégia alinhada ao modelo de omnicanalidade, que integra diferentes canais de venda. No segundo semestre deste ano, a Netshoes vai inaugurar uma loja conceito na Avenida Paulista, no endereço onde antes era a Livraria Cultura.
Migração
A Netshoes é apenas uma das marcas que apostou na migração do digital para o físico. A Mobly, uma startup fundada em 2011 e especializada na venda de móveis e artigos de decoração, se aventurou no meio físico em 2015 com a inauguração de uma loja na Marginal Pinheiros.
Na época, foram investidos milhões em uma área de 4,5 mil metros quadrados que abrigou milhares de itens disponíveis para pronta entrega. Hoje, já são mais de 20 lojas e, em agosto de 2024, a Mobly adquiriu a Tok&Stok a fim de ampliar sua presença no setor.
Recentemente, o Grupo Mobly anunciou que passou a se chamar Grupo Toky e que as duas marcas vão operar de forma independente, mantendo suas identidades.
A empresa entendeu que muita gente tinha medo de comprar um móvel sem ver o produto, já que o setor de móveis, se comparado a outros, ainda é mais atrasado e tem um caminho grande para crescer no online.

Outro exemplo é o da WePink, que tem a influenciadora Virgínia Fonseca como uma das sócias. Criada em 2015, inicialmente focada no e-commerce, a marca explodiu nas redes sociais. Faturou milhões e inaugurou sua primeira loja física em 2017, em São Paulo.
Com o crescimento da marca, Virgínia percebeu que a presença física das lojas seria uma maneira de fortalecer sua relação com o público e proporcionar uma experiência mais próxima.
Em novembro de 2024, impulsionada pela Black Friday, a marca faturou R$ 114 milhões no mês. A influenciadora divulgou um extrato do faturamento nas redes sociais onde mostrava que foram vendidos mais de 723 mil produtos com ticket médio de R$ 158,70.
Atualmente, a WePink possui 75 unidades físicas entre próprias e franqueadas. Em 2024, expandiu internacionalmente, inaugurando sua primeira franquia em Orlando, nos Estados Unidos.
Conexão
De acordo com Marinho, da Gouvêa Malls, as pessoas têm novas necessidades, muitas delas emocionais, que não podem ser supridas apenas com produtos. “As lojas físicas são mais importantes do que nunca. No entanto, precisam evoluir. Usar a loja apenas como um PDV é extrair menos do que ela pode oferecer e desperdiçar oportunidades”, avalia.
Para ele, a loja física gera fluxo, aumenta a recorrência de visita e eleva a receita. Ela também funciona como um canal de divulgação da marca porque ajuda a disseminar o conceito junto aos consumidores e parceiros, apoiando o desenvolvimento dos negócios em todos os canais.
“A loja física pode ser um centro de distribuição avançado, onde as pessoas podem retirar ou devolver produtos comprados online. Isso consolida muito a convergência entre o físico e o digital. E, por fim, cria conectividade. A conexão humana está se fazendo necessária, e vemos muito isso em shoppings”, avalia o sócio da Gouvêa.
Para Marcelo Marani, especialista em gestão, o movimento da Netshoes e outras marcas digitais segue uma tendência global de fusão entre os canais físico e digital. “Eu acredito fortemente que a movimentação da Netshoes segue uma tendência crescente de omnicanalidade. A experiência sensorial proporcionada pelo espaço físico é fundamental para gerar confiança e fortalecer a relação com a marca.”
Apesar de o e-commerce ter revolucionado o consumo, Marani defende que a loja física ainda é um ponto estratégico para aquisição e fidelização de clientes. “Isso acontece em diversos segmentos, não só no de moda. Restaurantes que cresceram no delivery, por exemplo, perceberam que o espaço físico pode fortalecer a marca e ampliar a experiência do cliente. O desafio está na execução, porque operar no varejo físico exige uma logística bem diferente do online.”
Hubs logísticos
Já o especialista em gestão Marcus Marques destaca que a estratégia da Netshoes visa principalmente criar uma experiência integrada. “Ao adotar essa estratégia, as marcas digitais conseguem não só fortalecer sua presença no mercado, mas também otimizar a logística e reduzir custos, já que muitas dessas lojas físicas funcionam como hubs de retirada e devolução.”
Para os especialistas, o movimento de abrir lojas físicas, embora desafiador do ponto de vista logístico, pode ser uma jogada acertada, principalmente quando as marcas conseguem oferecer um atendimento personalizado e uma experiência de compra que combine o melhor do digital e do físico. Se bem executado, esse modelo híbrido pode criar um ecossistema de vendas mais sólido.
Marques lembra que, no varejo global, a Amazon fez algo parecido ao adquirir a rede de supermercados Whole Foods, criando assim pontos físicos para complementar suas vendas online.
IMAGENS: divulgação