Morre Samuel Klein, 91, fundador da Casas Bahia
Polonês de origem judaica naturalizado brasileiro, sobrevivente de campo de concentração nazista, Klein ergueu um dos maiores impérios do varejo nacional

O empresário Samuel Klein, fundador da Casas Bahia, morreu na madrugada de quinta-feira, 20, em São Paulo, devido a insuficiência respiratória. Tinha 91 anos e deixa três filhos, oito netos e cinco bisnetos. O velório ocorre no cemitério israelita do Butantã, em cerimônia reservada para família e amigos.
“Morre um dos professores do empreendedorismo”, disse ao Diário do Comércio o empresário Alencar Burti, presidente do conselho deliberativo do Sebrae-SP e membro do conselho superior da Associação Comercial de São Paulo. “É importante que o tenhamos sempre como exemplo. Era um homem simples, sem pose”
A Via Varejo, hoje controladora da Casas Bahia, divulgou nota na qual expressou seus sentimentos de pesar e agradeceu o empresário por sua contribuição ao país. "A melhor forma de honrarmos seu legado empreendedor é continuarmos crescendo e realizando os sonhos de nossos clientes e colaboradores".
Polonês naturalizado brasileiro, Samuel Klein nasceu em Lublin, na Polônia, como o terceiro de nove irmãos, filho de um carpinteiro de família judaica. Aos 19 anos foi preso pelos nazistas e mandado com o pai para o campo de concentração de Maidanek, na Polônia, de onde conseguiu fugir, em 1944.
Em 1952, decidiu mudar-se para o Brasil, onde, depois de uma rápida passagem pelo Rio de Janeiro, viajou para São Paulo, instalando-se em São Caetano do Sul, na região do ABC paulista. Com a ajuda de um conhecido que transitava pelo comércio do Bom Retiro, adquiriu uma carteira de 200 clientes e mercadorias como roupas de cama, mesa e banho. Cinco anos depois, em 1957, já tinha capital suficiente para comprar sua primeira loja, no centro de São Caetano. Chamou a loja de "Casa Bahia" em homenagem aos imigrantes nordestinos que haviam se deslocado para a região em busca de trabalho na indústria automobilística.
PIONEIRO
O fundador da Casas Bahia, foi o pioneiro em entender os desejos de consumo da nova classe média brasileira e como essa população gosta de ser tratada.
Ele descobriu o potencial de compras da população de menor renda, as classes C e D, muito antes da estabilização da economia e das consultorias especializadas em varejo avaliarem esse mercado que, aliás, foi o sustentáculo do império que construiu.
Com sua fala carregada de sotaque, esse imigrante polonês, que começou a vida vendendo artigos de cama, mesa e banho de porta em porta, pilotando a sua charrete em São Caetano do Sul, dava aulas de como se relacionar com os clientes, que ele gostava de chamar de freguês.
Uma de suas máximas, que pode parecer um lugar comum, é que o consumidor tem sempre razão.
Em 2001, aos 78 anos de idade, Klein fez pessoalmente uma campanha publicitária. Na época, os cerca de 6 milhões de clientes ativos da rede receberam mensagens telefônicas quando faziam aniversário ou quando terminavam de pagar pontualmente o crediário. Detalhe: do outro lado da linha estava o próprio dono da empresa, chamando o freguês pelo nome.
Ciente de que o maior patrimônio da sua empresa era a sua freguesia, o empresário dizia que a única riqueza de um indivíduo era o seu nome.
"Pela minha experiência, posso dizer que quanto mais pobre uma pessoa, mais honesta ela é", afirmou Klein. Na época, o varejo enfrentava uma onda de inadimplência e ele reduziu a dívida de seus clientes pela metade.
"O Fundo Monetário Internacional (FMI) poderia fazer como eu faço: dar desconto de 50% para os países devedores e refinanciar o resto. Eu não vou ficar mais pobre por causa disso", comparou. Na sua avaliação, essa estratégia traria crescimento para todos e alavancaria a economia global.
A venda a prazo no carnê, que todo mês o freguês visitava a loja para pagar, foi um dos pilares da Casas Bahia. Klein criou uma mundo a parte do crédito e certa vez declarou que o cadastro de fregueses da loja era mais importante do que a listagem de devedores do SCPC.
Ele não fazia segredo da sua receita para ter sucesso no varejo, que, aliás, era bem simples: comprar bem para vender bem. Mas ele admitia que, no trato com o consumidor, existiam coisas que matematicamente não podem ser analisadas, como a simpatia. E nisso ele foi mestre.