Lefties, a irmã da Zara que rivaliza com lojas populares
A rede já vende mais do que a Zara na Europa e dá à Inditex a chance de ter uma posição neste segmento de moda acessível, enquanto mantém os preços elevados em outras marcas do grupo
Sempre oferecendo as últimas tendências das passarelas por preços acessíveis, o fast fashion é um modelo de negócio que se concentra na produção em larga escala de peças que estão no auge da popularidade. No Brasil, Renner, C&A e Riachuelo lideram esse mercado.
Outro nome importante nessa disputa por consumidores é a Zara, do Grupo Inditex, maior empresa de fast fashion do mundo em volume de vendas cotada em bolsa. Entre os brasileiros, a marca tem a fama de vender itens de luxo com um estilo europeu e custo mais baixo que os de grife. Ainda assim, a Zara é a menos competitiva em termos de preços.
Porém, não é assim no mundo todo. Além de apresentar tíquetes menores nos Estados Unidos e Europa por conta de um modelo operacional mais eficiente, a Inditex trilha um caminho paralelo ao da Zara por meio de uma marca considerada de baixo custo, a Lefties.
A rede, com lojas em 16 países, já foi tida como outlet da Zara e hoje, com uma coleção independente, cresce entre consumidores mais jovens e menos dispostos a gastar muito com moda, especialmente em mercados emergentes.
No Instagram e no TikTok, a Lefties utiliza estratégias semelhantes às da Shein, apresentando micro influenciadores na maioria das publicações — em contraste com a estética de alta moda das redes sociais da Zara.
Muito forte na Europa, Espanha e Portugal são os países em que a Lefties alcança seu maior volume de vendas. O nicho em que compete foi inicialmente aberto pela Primark, sua maior concorrente entre as lojas físicas e que foi fundada em 1969, em Dublin, na Irlanda.
Por décadas, a Primark reinou sozinha em um segmento pouco desenvolvido em países da Europa - o de preços mais baixos -, onde as grifes sempre tiveram preferência no consumo. Mesmo sem revelar seus resultados financeiros, o bom desempenho da Lefties é sentido diante de sua expansão contínua, ainda que a Inditex tenha diminuído o número de lojas de outras marcas do grupo.
Quando foi lançada, em 1999, a Lefties tinha esse estigma de ser uma espécie de ponta de estoque da Zara e de outras marcas do grupo. Sem uma tradução exata, em português o nome Lefties remete ao termo "sobras", ou "algo que foi deixado ou esquecido". Os anos foram passando e o negócio tomou outro rumo.
Hoje, entrar em uma loja da Lefties já não significa mais ver o vestido da Zara de duas estações atrás. Trata-se de uma marca com design, identidade e coleções próprias, embora ainda haja muita semelhança entre as peças ofertadas nas duas redes.
Assim como a Zara, a Lefties vende para todos os públicos e idades. São seções de adulto e infantil/bebê, que também contam com linhas de calçados e acessórios. Além das coleções esportivas, itens de casa e roupa íntima.
A principal diferença entre as duas marcas da Inditex é o preço, que na Lefites costuma ser pelo menos 30% menor que o encontrado na Zara. Há épocas do ano em que a rede aposta em uma ala da loja remarcada como Remate Final, com itens sendo vendidos a 1,99 euros.
Ao mesmo tempo em que atrai uma enxurrada de clientes para dentro de suas lojas físicas, o e-commerce descomplicado e os preços reduzidos no on-line também contribuem para equilibrar a competitividade com gigantes asiáticas, como a Shein, que faturou US$ 30 bilhões em 2023 e detém um quinto das vendas de roupas e acessórios em todo mundo.
O e-commerce da Lefites entrou no ar em 2020 e, desde então, não para de crescer com foco declarado na Geração Z e com uma vantagem adicional em relação à Shein: o tempo de entrega. Enquanto a Shein entrega um pedido em até duas semanas, a Lefties não demora mais do que dois dias. No mais, uma calça jeans não sai por mais de 17,99 euros, um vestido, por 7,99 euros, e bolsas, por 5,99 euros.
Diferentemente da Shein, a Lefties diz se concentrar em garantir práticas de produção éticas e de qualidade. Ao enfatizar a sustentabilidade e o fornecimento responsável, a Lefties pretende causar um impacto positivo no ambiente e na indústria da moda como um todo.
Também não há um apego em seguir regras tradicionais da moda quando o assunto é publicidade. Suas campanhas parecem mais uma ligação de vídeo entre amigas mostrando o closet. É tudo muito atual e descontraído.
A FÓRMULA
Para André Romero, consultor de varejo, a fórmula é quase infalível. Parcerias com grandes estilistas, tendências propagadas por influenciadores, looks do dia no Instagram, liquidações com preços muito convidativos e formas de pagamento que permitem maior volume de compras de uma só vez.
Algo que não seria tão fácil de sustentar, por exemplo, no Brasil, explica Romero. A complexidade tributária somada a uma logística cara e pouco eficiente são as explicações mais óbvias. Mas além de estarmos em um país com a carga elevada - o que dificulta a inserção de multinacionais conhecidas por preços baixos -, essas varejistas sabem o quanto o brasileiro valoriza esse tipo de experiência quando viaja e o quanto gasta com elas.
Nas palavras do consultor, o status e o discurso de "comprei fora do Brasil" se tornou praticamente um estilo de vida e, por isso, para muitas marcas seria mais interessante manter o consumidor de classe média alta sustentando esse comportamento.