Escassez de crédito e vendas em queda fecham mercadinhos
Levantamento do Sincovaga, entidade que reúne pequenos comerciantes paulistas de alimentos, revela que 719 estabelecimentos encerraram as atividades neste ano
O crédito escasso e caro e a queda acelerada nas vendas estão levando ao fechamento de mercearias e mercadinhos, os representantes do pequeno comércio de alimentos.
Levantamento do Sincovaga, sindicato que reúne os pequenos comerciantes paulistas de alimentos e bebidas, mostra que 719 estabelecimentos encerraram as atividades de 2 de dezembro de 2014 a 5 de novembro deste ano.
Esse número, que representa 1,8% do total de empresas paulistas cadastradas nesta categoria econômica (39.300), surpreendeu a diretoria do Sincovaga. Historicamente, esse percentual não ultrapassava 1,5%.
Aproximadamente 80% das empresas que entregaram literalmente os pontos estão concentradas em São Paulo e na Grande São Paulo e 90% delas possuem um ou dois funcionários.
É bom lembrar que, normalmente, as pequenas empresas costumam informar aos órgãos públicos que encerraram as atividades depois de um tempo de terem baixado as portas.
Isso quer dizer que, não necessariamente, as empresas fecharam as portas exatamente naquele período.
A percepção do Sincovaga, porém, é que, neste ano, o fechamento de mercearias e mini mercados supere 719.
“Os pequenos comerciantes de alimentos estão fragilizados e fecham as portas porque não têm caixa para comprar mercadorias”, afirma Álvaro Furtado, presidente do Sincovaga.
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Com um faturamento de R$ 72 milhões e 4 mil clientes, a atacadista Tardelli, com sede em Franco da Rocha (SP), informa que cerca de 5% dos clientes (200 pequenos comerciantes) interromperam as compras da empresa neste ano.
“Nossa equipe de vendas informou que esses clientes simplesmente encerraram as atividades”, afirma Carlos Lima, diretor jurídico administrativo da Tardelli.
A paranaense Destro, que possui um centro de distribuição em Jundiaí (SP), também registrou fechamento de clientes no Estado de São Paulo.
“O faturamento desses pequenos comerciantes, muitas vezes, não está cobrindo os custos. E eles não têm alternativa se não fechar as portas”, afirma Emerson Luiz Destro, diretor geral da empresa.
Outro sinal da precariedade financeira dos pequenos comerciantes de alimentos, de acordo com o Sincovaga, é o atraso no pagamento da mensalidade do sindicato, de R$ 50.
Das cerca de 2 mil empresas que pagam a mensalidade 600 estão com dois meses de pagamento em atraso, um movimento que começou a se intensificar há quatro meses.
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O colapso de pequenos mercadinhos não se limita ao território paulista.
A atacadista Nordece, da Paraíba, por exemplo, costumava ter cerca de dez clientes em cada pequeno município do Estado. Hoje, possui nove, em média.
E os comerciantes que mantêm as portas abertas reduziram as compras. O tíquete médio da Nordece, de R$ 200, caiu para R$ 180.
“Os pequenos comerciantes estão sem crédito. Os que têm menos estrutura estão sofrendo mais”, afirma José Veríssimo Diniz, proprietário da Nordece.
José Paulo Vendruscolo, diretor presidente da Norte Sul Real Distribuidora, de Cuiabá (MT), que possui uma carteira com 4 mil clientes, constatou que os comerciantes que estão saindo do mercado são, principalmente, os que possuem até cinco checkouts.
Vendruscolo também observa que muitos clientes não estão conseguindo pagar as mercadorias na data do vencimento. O atraso no pagamento chega a cinco dias.
COMPETIÇÃO COM GRANDES REDES
A queda de consumo, como resultado do aumento do desemprego, dos preços e dos juros é o principal responsável pelo fechamento do pequeno comércio. Há outros motivos, de acordo com consultores do varejo.
O que também está abalando o segmento, na avaliação de Maurício Morgado, professor da FVG, é a concorrência com os pequenos formatos de lojas de grandes redes, como a Express, do Carrefour, o Pão de Açúcar Minuto e a rede Dia.
“Esses grupos possuem fôlego para aguentar a recessão. O pequeno quebra porque não tem capital de giro”, afirma Morgado.
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Para ele, nada indica uma inversão dessa situação no curto prazo. A confiança do consumidor continua em queda, assim como os índices de emprego e a renda. “E emprego e renda determinam quase 90% do desempenho do varejo”, diz.
Para Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), mais do que a queda de vendas, o que tem abalado fortemente os pequenos comerciantes é a falta de crédito.
“O consumo de alimentos diminuiu, talvez, não a ponto de quebrar as empresas. O que quebra é a falta de crédito”, diz.
Numa situação de consumo retraído, como esta, as dicas dos consultores para os pequenos comerciantes que tentam driblar a crise são: prestar mais atenção no fluxo de caixa, manter produtos em promoção, evitar rupturas de produtos, deixar a loja limpa e atraente e ter vendedores bem humorados.
No mesmo período em que ocorreu o fechamento dos pequenos comerciantes de alimentos, outros 1.349 abriram as portas no Estado, de acordo com o Sindicovaga. Este número já chegou a passar de 3.000 em um ano.
A má notícia é que, de acordo com o sindicato, boa parte dessas empresas, mesmo quando o mercado está aquecido, não sobrevive mais de três anos.
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Demissões nas grandes redes expõem o tamanho da crise
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