Eles sonham com o fim do desemprego e a volta da confiança
Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza, e Natale Dalla Vecchia, da Lojas Cem, revelam o que gostariam de ganhar de presente no Dia do Comerciante, comemorado hoje (16/07)

Juntos, eles possuem pouco mais de mil lojas no país, faturam perto de R$ 14 bilhões por ano e empregam aproximadamente 31 mil pessoas, número equivalente à população de muitas cidades do interior paulista, como Guararapes e Cachoeira Paulista.
Em meio à maior crise da história brasileira, o que dois dos maiores empreendedores do varejo de eletroeletrônicos do país, Luiza Helena Trajano e Natale Dalla Vecchia, gostariam de ganhar de presente no Dia do Comerciante, comemorado hoje (16/07).
“A volta do nível de confiança do consumidor na economia. Sem confiança, as pessoas não compram e as vendas e o emprego caem”, afirma Luiza Helena, presidente do conselho de administração da rede Magazine Luiza, com 783 lojas espalhadas em 16 Estados brasileiros.
“O fim ou pelo menos a redução do desemprego. Nós iniciamos 2015 com 11 mil empregados. Hoje, estamos com um pouco mais de 9 mil. É lamentável. A que ponto chegou este país!”, diz Natale Dalla Vecchia, sócio-proprietário da Lojas Cem, rede com 238 lojas no interior de São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Os dois empresários atuam em um dos setores que mais sofreram com a crise. Últimos dados do IBGE mostram que, em maio, o volume de vendas do comércio de móveis e eletrodomésticos caiu 14,6% em relação a igual mês de 2015. Na média de todo o varejo, a queda foi de 9%, no período.
Desde que a crise começou a dar as caras, o consumidor reduziu significativamente a compra de bens mais caros, como fogões, geladeiras, lavadoras de roupas, televisores e móveis, como reflexo da queda da renda e também do crédito mais restrito.
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Não será fácil, portanto, atender aos pedidos de Luiza Helena e Natale, de acordo com economistas consultados pelo Diário do Comércio.
O índice de confiança é um dos mais baixos da história. E a taxa de desemprego tem batido recorde todo o mês. Pior, não há sinais de inversão deste cenário no curto prazo.
O Índice Nacional de Confiança da Associação Comercial de São Paulo (INC/Ipsos) atingiu 70 pontos em junho. A escala vai de zero a 200 pontos. De zero a 100 pontos, o índice está no campo do pessimismo e, de 100 a 200 pontos, do otimismo.
O índice de junho subiu quatro pontos em relação ao registrado em maio, uma boa notícia. Porém, está 30 pontos abaixo do de junho de 2015. Só como base de comparação, em junho de 2012, antes das manifestações da população, o indicador estava na casa dos 150 a 160 pontos e, em junho de 2015, em 100 pontos.
“Com o afastamento da presidente Dilma melhorou um pouco a confiança do consumidor, mas, dificilmente, o índice volta para 100 pontos neste ano. Para a confiança melhorar, é preciso ter uma queda continua no número de demissões”, afirma Emílio Alfieri, economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
A taxa de desocupação no Brasil ficou em 11,2% no trimestre encerrado em maio deste ano, de acordo com a Pnad Contínua/IBGE. Em igual período de 2015, a taxa estava em 8,1%.
“Com a criação de postos de trabalho, mesmo que seja ao redor de mil vagas, é possível que o consumidor entenda que o pior já passou e volte a comprar mais. A expectativa é que, até a virada do ano, a confiança atinja um nível neutro, ao redor de 100 pontos”, diz Alfieri.
Se a confiança do consumidor estivesse alta, muito provavelmente, as vendas da rede Magazine Luiza estariam, atualmente, pelo menos 20% maiores, de acordo com Luiza Helena. No ano passado, a rede faturou R$ 10,5 bilhões.
Se o desemprego não estivesse tão elevado, a Lojas Cem iria fechar este ano com faturamento de quase R$ 2 bilhões a mais, de acordo com Natale.
A Lojas Cem deve fechar 2016 com vendas de 3,8 bilhões. Eram R$ 4,5 bilhões dois anos atrás. A empresa estava preparada para faturar R$ 5,5 bilhões neste ano, se não fosse a crise.
Não há salário e crédito suficientes para sustentar o varejo, especialmente de empresas que atuam no setor de eletroeletrônicos e móveis, na avaliação de Fábio Silveira, sócio-diretor da consultoria MacroSector.
A massa real de salários deve cair 6,5% neste ano e o volume real de crédito, 6%, de acordo com o economista. O nível de emprego deve continuar caindo pelo menos até agosto.
“Mas é fato que o varejo vive de expectativas e, se a taxa de juros cair, e as dívidas das famílias forem renegociadas, o desempenho de alguns setores pode até melhorar”, diz. É o caso do setor no qual as redes Lojas Cem e Magazine Luiza atuam, fortemente dependentes de crédito.
CARGA TRIBUTÁRIA
Redução de impostos seria também um presente muito bem-vindo para o varejo, de acordo com Luiza Helena. Concorda com ela Romeu Zema, sócio-diretor da Zema, rede mineira de eletrodomésticos e móveis com 523 lojas e faturamento anual de R$ 1,3 bilhão.
“O maior presente que um comerciante poderia receber seria todos serem submetidos às mesmas regras e impostos, assim prosperaria o mais eficiente, e não o que mais tem vantagens tributárias, sonega, faz contrabando e adultera", diz ele.
O Brasil possui uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo – corresponde a 36% do PIB (Produto Interno Bruto).
Como base de comparação, no Chile, os impostos representam 21% do PIB. No Uruguai, 26%. Na Argentina, 31%. Nos Estados Unidos, 25%. Na Suíça, 27%.
A participação de impostos no preço de uma televisão, um dos produtos mais relevantes no mix das redes Magazine Luiza e Lojas Cem, chega a 44%.
No caso de telefones celulares e notebooks, perto de 40%, de acordo com José Vanildo Veras da Silva, vice-presidente da Aescon (Associação das Empresas Contábeis do Estado de São Paulo).
O sonho de muitos comerciantes de ver uma redução de impostos no Brasil está bem longe de se realizar, na avaliação de Veras da Silva. O governo, na verdade, ameaça aumentar impostos como forma de ajudar a diminuir o déficit fiscal bilionário.
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"Antes de fazer uma reforma tributária o país precisa passar por uma reforma administrativa", diz ele. O tributo serve para sustentar o governo em suas instâncias, para suprir suas ações. É preciso pensar na questão tributária do ângulo do tamanho do Estado.
“Empreendedores como Luiza Helena e Natale não precisam de nada do governo. Mas o governo precisa dar condições para que eles cresçam, empreguem e paguem tributos que sejam possíveis de pagar. Hoje, esses empreendedores e muitos outros estão sendo punidos.”
Um tributo que não está diretamente ligado às empresas e que afeta consideravelmente, não somente as grandes redes, é a contribuição previdenciária, na análise de Veras da Silva.
“Os empreendedores pagam 20% de contribuição previdenciária para os funcionários. Ocorre que, ainda assim, eles precisam providenciar planos de saúde para os empregados porque o sistema do governo não funciona.”
Ações do governo para reduzir impostos podem ser o início de um movimento para que o país volte a ter a credibilidade que precisa para atrair investimentos de empresários brasileiros e de fora com impacto positivo na economia.
“Não dá para estourar champanhe para comemorar o Dia do Comerciante”, diz Natale.
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Fotos: Fátima Fernandes e Divulgação