Consumidor do interior quer comprar perto de casa
Pesquisa da Kantar mostra que o interesse em lojas de vizinhança cresceu 4%, no interior paulista, em 2016, enquanto os supermercados tiveram queda de 8%. Melhora no serviço, no preço e no mix de produtos são algumas das razões

Os percalços experimentados pelo varejo nos últimos quatro anos abalaram algumas empresas e motivaram outras a criar alicerces para crescer durante a crise.
É possível dizer que os pequenos mercados de bairro localizados no interior de São Paulo são um bom exemplo de varejistas que se reinventaram para sobreviver, e até crescer.
Com tamanho reduzido, esses “mercadinhos” são cada vez mais valorizados pelos consumidores que optam por frequentar lojas perto de casa ou do trabalho.
Em 2016, a preferência por esse tipo de varejo cresceu 4% no interior de São Paulo, de acordo com uma pesquisa da Kantar Worldpanel. Em contrapartida, os supermercados apuraram queda de participação de 8% nesta mesma região.

Outro levantamento da GFK mostra que abastecer a despensa nos mercadinhos de bairro ficou mais barato do que se dirigir a um supermercado, em todo o interior do País, em 2016.
A pesquisa aponta que os pequenos comerciantes sacrificaram sua margem para não perder clientes durante a crise econômica.
Quando se considera o preço médio de uma cesta básica com 35 produtos, a diferença entre pequenos e grandes mercados é de apenas alguns centavos. Nas grandes redes, a compra sai por R$ 247,16 ante R$ 247,34 nos mercadinhos de bairro.
O QUE ACONTECEU?
Tiago Oliveira, gerente de soluções para varejo, da Kantar Worldpanel, aponta que o bom atendimento é uma especialidade do varejo de vizinhança, que em geral, se revela como uma experiência mais completa no interior de São Paulo.
Enquanto na capital a relação é mais impessoal, Oliveira diz que os lojistas do restante do Estado oferecem treinamentos com mais frequência e desempenham um trabalho mais forte em busca de personalização.
Ele cita nomes como as redes Confiança, na região de Marília, e Pague Menos, na região de Campinas, como empresas com alto nível de atendimento.
Além disso, Oliveira destaca que as redes do interior têm investido mais que as da capital quando o assunto é inovação.
"O interior saiu na frente, por exemplo, com os caixas de autoatendimento e serviço de compre e retire. Os programas de fidelidade e otimização de CRM também são bem mais eficientes", diz.

A combinação de insegurança no emprego com recessão fez, por exemplo, o analista de sistemas Rafael Cordeiro, 27 anos, trocar a variedade de hipermercados de Piracicaba, como Pão de Açucar, Carrefour e Walmart, pela conveniência e melhores preços dos mercadinhos perto de sua casa.
Cordeiro constatou que, quando fazia compras de reposição nos minimercados, os preços não eram tão diferentes, e aos poucos, foi diminuindo sua compra do mês.
"Percebi que perdia o foco dentro dos supermercados e enchia o carrinho. Agora, faço compra semanal e saio com duas sacolinhas. Também economizo tempo, combustível e estacionamento".
O QUE ELAS ESTÃO FAZENDO
A busca cada vez mais intensa por lojas de vizinhança é decorrente de um conjunto de estratégias adotadas por esses pequenos mercados.
Na contramão das grandes redes, essas lojas menores sacrificaram sua margem de lucro para priorizar preço e atendimento, de acordo com Luiz Baruzzi, diretor comercial da Rede São Paulo Supermercados, associação que reúne seis empresas do setor no interior paulista – Pague Menos, Sempre Vale, Shibata, Comper, Jaú Serve e Confiança – todas classificadas como varejo de vizinhança.
Baruzzi diz que a relação de proximidade com o cliente que envolve do caixa ao gerente também traz ganhos para o lojista.
Além disso, há uma equipe de funcionários dando suporte nos corredores das lojas e maior número de caixas abertos. O mesmo ocorre nos açougues e padarias desses estabelecimentos.

"O atendimento é bem mais ágil e bem feito. Não houve tantas demissões no setor, como nas grandes redes que estão desfalcadas".
Atendimento - Foi ouvindo o cliente e trocando informações na fila do caixa, que Henrique Biguzzi, 43 anos, gerente do supermercado Coruja, em Limeira, distante 140 quilômetros de São Paulo, adotou a divulgação semanal de ofertas por whatsapp e trouxe novas marcas, consideradas premium para as prateleiras do negócio.
Desvendar o hábito de consumo do seu público ajudou a pequena rede a oferecer produtos de acordo com o perfil e as necessidades de quem compra nas duas unidades da empresa.
Mesmo sem revelar o faturamento, Biguzzi diz estar satisfeito com o desempenho do negócio, que concorre com redes do porte do Walmart na cidade.
Preços competitivos - Bem mais distante da capital, o Iquegami Supermercados é um dos que mais se destaca na região de Barretos, a 630 quilômetros de São Paulo.
Em 2016, a rede que possui oito lojas passou por uma reformulação e teve crescimento de 8,7% em vendas reais, de acordo com Márcia Heloisa Iquegami, diretora administrativa e financeira.

Márcia diz que com a crise, a área comercial da empresa conseguiu melhores negociações, além de parcerias com os fornecedores. Isso permitiu à rede trabalhar com maior variedade de itens a preços bem mais competitivos.
Com a inclusão de novas marcas, a rede passou a oferecer um mix de 20 mil produtos e deslocou uma equipe do setor administrativo para analisar o desempenho desses novos produtos com a missão de ajustar o estoque e reduzir a ruptura.
REFLEXOS
Em Piracicaba, a preferência por esse tipo de compra causou reflexos no número de vagas de emprego na cidade.
Os pequenos estabelecimentos foram responsáveis pela geração de 181 postos de trabalho formais no mês de junho, de acordo com a FecomercioSP.
Segundo a avaliação da entidade, o bom desempenho está intimamente ligada aos pequenos supermercados. Somente a categoria de mercadinhos e vendas alavancaram o índice com a abertura de 98 vagas, no período.
Paulo Roberto Checoli, presidente da Acipi (Associação Comercial e Industrial de Piracicaba), analisa que no caso de Piracicaba, o maior trunfo dos minimercados seja o fato de ao longo dos anos, ter construído uma cultura de fidelização com seus clientes.
"O comércio, principalmente de bairro, possui grande diversificação e atende bem nossos moradores, e trazem desenvolvimento para essas localidades. São vitais para o varejo da cidade".
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