Conheça as vantagens e cuidados ao adquirir uma franquia de repasse
Clientela estabelecida, estudo de desempenho pronto e zero custo com obra são alguns dos principais pontos positivos de se comprar uma operação já em atividade
Adquirir uma franquia já em atividade é uma boa opção para empreendedores que buscam um novo negócio. Trata-se de uma prática legalizada comum adotada no mercado de franchising há vários anos e não apenas no Brasil.
O repasse pode ser uma oportunidade para ambos os lados, tanto para o franqueado que quer seguir outro caminho ao invés de encerrar as atividades da franquia e ainda ter o lucro da venda dos seus direitos de marca, quanto para o outro empreendedor que queira investir e já pegar o negócio em andamento, testado, com clientela estabelecida e sem custo com obra.
Para as franqueadoras, o repasse é o principal instrumento para manter uma unidade ativa sob nova direção.
No último relatório divulgado pela Associação Brasileira de Franchising (ABF), em 2022, o índice de repasse de franquias era de 2,5%.
Para Eduardo Yamashita, COO da consultoria de negócios Gouvêa Ecosystem, uma das principais vantagens do repasse de franquias está no fato de o mercado já estar testado naquele local, sendo que o risco fica minimizado.
“O empreendedor pula algumas etapas de quando abre uma franquia do zero, como a implementação do negócio, as reformas do local, a redução de gargalos burocráticos e recebe de bandeja a aceitação já estabelecida do produto ou do serviço pelo consumidor. Do lado do vendedor, as principais vantagens são que ele evita demitir funcionários e consegue recuperar, pelo menos, uma parte do investimento realizado”, explica Yamashita.
Mas há quem pense que comprar uma franquia de repasse pode ser um tiro no pé porque o dono anterior já atestou que o negócio não deu certo. Se esse for o caso, as franqueadoras costumam oferecer vantagens a quem quer comprar uma franquia com dificuldades financeiras. Entre elas, pode haver descontos no valor da compra, isenção de parte das tarifas – como taxa de propaganda e taxa de franquia – e até um prazo maior de carência de royalties.
Se a questão não é financeira, há diversos outros motivos que podem levar um franqueado a pensar no repasse, além do baixo desempenho.
De acordo com Adriana Auriemo, vice-presidente da ABF, alguns empreendedores investem em uma franquia e, com o passar do tempo, não se identificam com o negócio ou então possuem uma atividade paralela que impede que atuem em ambos os trabalhos.
“Também existem situações de aposentadoria ou até de falecimento do franqueado que não tem herdeiros que queiram assumir o negócio. Pode acontecer ainda de o empresário ter conseguido outra oportunidade profissional melhor, precisar mudar de cidade, estado ou país, estar passando por problemas familiares, pessoais ou de saúde, entre outros motivos”, explica.
Adriana lista o que pode soar como desvantagem neste tipo de negócio. “Quando se acessa uma unidade já em operação, algumas decisões já estão tomadas, como localização do ponto e o design da loja. Sempre é possível mudar, mas isso gera custos adicionais. Além disso, em algumas situações, reverter uma percepção negativa do consumidor é um desafio, mas um desafio possível”, avalia.
CUIDADOS
“Repasse de franquias é um mercado em ascensão. Mas o investidor deve avaliar qual a situação de outras unidades daquela franqueadora, qual a análise da saúde financeira da franquia, dívidas trabalhistas, enfim, todos os detalhes”, aconselha Yamashita.
Já as dicas da ABF para o investidor que pretende comprar uma franquia em operação estão divididas em dois momentos. O primeiro é avaliar o potencial da marca, incluindo estudo do mercado, ver o contrato de franquia, conversar com franqueados e ex-franqueados, checar a concorrência e os riscos, conhecer o sistema de franchising a fundo e analisar a COF (Circular de Oferta da Franquia).
O COF é um documento produzido pelo franqueador que apresenta todas as informações e dados do negócio, como as obrigações, os deveres e as responsabilidades do franqueador e do franqueado, entre outros detalhes.
O segundo passo é a análise da unidade em questão, o que exige uma visita presencial minuciosa, uma conversa com as lideranças e com a equipe local e, quem sabe, até com consumidores da região para descobrir o desempenho e o potencial da loja. “O objetivo aqui é justamente identificar se há algum ponto a ser melhorado e como se poderia agir sobre ele”, afirma Adriana.
PAPEL DA FRANQUEADORA
O empreendedor que quer vender uma franquia pode procurar um comprador interessado no empreendimento sem muitas burocracias, mas vale lembrar que cabe à franqueadora o aval final, já que apenas ela poderá aprovar o perfil do novo franqueado.
“Geralmente, se o perfil é bom, a chance é grande porque é sempre interessante para a franqueadora aprovar o repasse porque isso evita a mortalidade da unidade”, diz o consultor Yamashita.
Na hipótese de uma transferência da unidade ou tentativa de repasse sem o conhecimento e aprovação do franqueador, ocorre uma grave violação do contrato de franquia, com a aplicação de multas e medidas para evitar que isso ocorra, podendo resultar na rescisão do contrato e no pagamento de perdas e danos pelo franqueado.
E aí surge a pergunta: é possível o vendedor ter ajuda da franqueadora para fazer o repasse? Segundo a ABF, a resposta é sim. É comum que a própria franqueadora faça a intermediação desses repasses caso não parta diretamente do franqueado. Já é comum dentro das empresas que têm franquias ter áreas de expansão que desenvolvem carteira de pontos novos ou de repasse.
Um exemplo é da Via Certa Educação Profissional - que tem atuação no mercado de cursos profissionalizantes. Décio Marchi, diretor executivo da empresa, explica que o novo candidato terá seu perfil avaliado pela franqueadora e, depois que finalizado o novo contrato, ele terá que passar por treinamento para que consiga conduzir a operação corretamente.
“Sempre que existe um repasse, o primeiro procedimento do nosso lado é levantar o valor do negócio (valuation) e reunir dados e imagens da unidade para que o time de expansão possa oferecer informações precisas aos novos candidatos”, conta.
No caso da Via Certa, o franqueado deve pagar 50% no valor atual da taxa de franquia no repasse e receberá todo treinamento como se fosse um franqueado novo.
COMO TRANSFERIR UMA FRANQUIA
Vale lembrar que toda venda deve respeitar as regras da franqueadora. Segundo a ABF, há ao menos duas formas de formalizar o repasse de uma franquia: por meio da compra pelo adquirente das quotas sociais da empresa pela qual é exercida a franquia ou mediante a aquisição apenas do estabelecimento comercial.
No primeiro caso, os sócios da empresa cedem, por meio de contrato de compra e venda de quotas, a totalidade das quotas sociais. A franqueada continua a ser a mesma empresa, apenas alterando as pessoas de seus sócios.
No segundo caso, haverá uma alteração com relação à empresa que exerce a franquia, uma vez que somente o estabelecimento comercial é cedido, o que se dá por meio de contrato de compra e venda de estabelecimento comercial (chamado de trespasse). A associação destaca que, neste caso, devem ser celebrados outros dois instrumentos: de distrato entre a franqueadora e a empresa alienante do estabelecimento e da franquia com a empresa adquirente do mesmo.
CASES DE SUCESSO
A Magnólia Papelaria, marca de papelaria organizacional que está no mercado há cinco anos, sendo dois deles em um cenário de pandemia, alcançou o marco de 73 quiosques e um faturamento superior a R$ 28 milhões. As previsões para 2023 são ainda mais animadoras: a franqueadora almeja chegar a 95 operações e um faturamento de R$ 36 milhões.
Um dos franqueados, Georges Bou Maachar Neto, possui cinco lojas em shoppings de São Paulo, sendo duas delas adquiridas por meio de repasse: a do Morumbi Town, em setembro de 2022, e a do Center Norte, em abril de 2023. As demais foram implementadas do zero e estão localizadas nos shoppings Villa Lobos, Eldorado e Cidade Jardim, todas na capital paulista.
“Como tenho outras unidades da Magnólia que foram abertas por mim, entendo que as principais vantagens em adquirir uma nova loja por meio de repasse estão no fato de que não é necessária qualquer negociação com o shopping center com relação ao ponto a ser locado, além do valor de aluguel e outras burocracias existentes do ramo. Isso permite ao negócio começar a andar imediatamente”, diz o empresário.
Além disso, toda a parte de projeto e confecção do quiosque também já está superada com uma unidade de repasse, uma vez que ele já está montado e em plena operação. “Esse conjunto acaba ajudando no tempo que se ganha desde a assinatura do contrato até a abertura da loja”, avalia Maachar Neto.
“Entendo que a única coisa que daria para citar como desvantagem, se assim podemos chamar, a meu ver, é o fato de o repasse perder o efeito novidade no shopping, uma vez que a operação já estava rodando em momento anterior. Mas, não vejo isso como um grande problema”, comenta.
De qualquer forma, antes de abrir uma unidade nova ou assumir uma existente, Maachar Neto sempre faz estudos minuciosos em cada centro de compras. “Isso serve para entender melhor o público, o poder econômico do local, o fluxo de pessoas, o ponto dentro do empreendimento, o valor do aluguel e a existência de eventual concorrência dentro do próprio shopping. Fora isso, costumo sempre conversar com outros lojistas para saber todos os detalhes do local”, diz.
Nas duas unidades que adquiriu via repasse, Maachar Neto revela que a loja do Shopping Morumbi Town teve seu faturamento bruto dobrado em relação à operação conduzida pelo franqueado anterior. Já no Shopping Center Norte, esse faturamento quase triplicou.
Outra experiência de sucesso com repasse de franquias é a de Denis Arruda e da esposa Vannina Arruda, casal que tem oito lojas da Anjos Colchões & Sofás no estado de São Paulo. Fundada no Paraná, em 1990, a rede tem atualmente mais de 270 lojas em 21 estados brasileiros e cinco unidades no Paraguai. Das oito lojas de Arruda, quatro são de repasse e ficam em Marília, Piracicaba e duas em Bauru, todas no interior paulista.
“Eu já abri lojas da Anjos do zero, escolhendo o ponto e tudo mais. E metade das minhas lojas hoje são de repasse. Entendo que a facilidade que isso traz na parte burocrática é grande, porém a principal vantagem é a carteira de clientes que vem com o pacote, seja ela grande ou pequena. O retorno é muito mais rápido porque você já entra faturando”, avalia o empresário.
Arruda revela também que sempre faz um estudo de ponto, de público, de custo e outras vertentes antes de comprar uma nova loja. “Sinceramente, não vejo desvantagem em adquirir um repasse e esse mito de que pode ser um negócio falido não é tão real. Muitas vezes, o dono anterior não queria mais trabalhar no ramo, se aposentou ou não se adaptou ao modelo de franquias. Aí decide vender e pronto. Não quer dizer que o negócio ia mal.”
No caso das franquias de repasse de Arruda, duas lojas já registram um faturamento muito maior do que o conseguido pelo dono anterior. E nas demais unidades, o resultado já está um pouco acima do que antes. “Com nossa experiência de sucesso em outras lojas, já estamos trabalhando nessas para alcançar patamares bem maiores”, conclui.
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