Arco Íris, a loja que “colocou cueca em índio”, vai fechar as portas

Queda de vendas, elevada carga tributária e aumento de custos levam a família Parseghian a abandonar, após sete décadas, o atacado de meias e lingeries

Fátima Fernandes
20/Jul/2015
  • btn-whatsapp
Arco Íris, a loja que “colocou cueca em índio”, vai fechar as portas

Na semana passada, quando se comemorou o Dia do Comerciante (16/07), a reportagem do Diário do Comércio contatou Roberto Parseghian, 45 anos, herdeiro da Arco Iris, em busca de informações a respeito dos planos da septuagenária empresa fundada por seu pai, Sarkis.

Um livro contando a história da empresa,  pioneira no ramo de distribuição de meias e lingeries no país, será publicado em breve. Descendente de armênios, Sarkis tornou-se um comerciante bem-sucedido, reinvestindo no negócio e na aquisição de imóveis e no ramo da distribuição de meias. Costumava dizer que a loja, estabelecida na região central, era tão antiga e tradicional que "colocou cueca em índio".

“Você conhece a marca Trifil?", indaga Roberto. Foi a Arco Íris que comprou a primeira máquina para que o imigrante alemão Ludwig Heilbeg, iniciasse a produção de meias no Brasil, em 1963. A Trifil começou pelas mãos da Arco Íris. Ponto.”

O assunto principal da conversa, porém, foi outro. Roberto falou, em tom de desabafo, que até o final de agosto a empresa, localizada há 66 anos em uma das regiões mais populares do comércio de São Paulo, na rua Barão de Duprat, vai fechar as portas.

PARSEGHIAN, DA ARCO ÍRIS: 70% DO ESTOQUE JÁ FOI VENDIDO

"Pretendo liquidar tudo até lá", disse Perseghian, sem disfarçar a frustração. "Cerca de 70% do nosso estoque já foi embora nos últimos três meses.”

A decisão de fechar o que foi a primeira e a maior distribuidora de meias e lingeries do país não foi fácil. “Era um assunto que vinha me assombrando há mais ou menos dois anos. Meu pai faleceu há 20 anos. Tive de tomar a decisão sozinho.”

SARKIS, O FUNDADOR, NA GALERIA LAFAYETE, EM PARIS

 

Ele conta que, aos poucos, foi amadurecendo o lado emocional. “Meu lado racional já tinha decidido que o melhor a fazer era fechar a empresa”, diz. Roberto tem duas irmãs que não atuam no negócio.

A Arco Íris possui cerca de 12 mil lojistas cadastrados em todo o país. Mas, nos últimos tempos, somente somente 980 estavam ativos. “Os clientes vêm diminuindo ano a ano", disse.

Foi quando concluiu que legar o negócio para os dois filhos, de 9 e 13 anos, não seria um bom negócio. “Nenhum pai quer deixar um problema como herança para o filho. Nosso setor, do ramo de atacado, desaparecerá neste país.”

A forte retração de consumo contribuiu para a decisão radical, tomada no início deste ano, tal como ocorreu com outros lojistas que, literalmente, entregaram os pontos neste ano em São Paulo.

LEIA MAIS: Loja de bijuteria no centro de São Paulo anuncia falência

O que prejudica fortemente o setor, segundo Roberto, é a elevada carga tributária, que beira os 40% sobre o preço de um par de meia, impedindo a competitição com produtos importados, principalmente da China.

O governo paulista reduziu a  base de cálculo de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de alguns produtos, incluindo meias, fazendo com que a incidência de ICMS reduza de 18% para 7% sobre as vendas, exclusivamente para a indústria. A redução não contemplou atacadistas e varejistas.

A medida, que vigora há anos, e para vários setores, foi uma tentativa de evitar a fuga de indústrias de São Paulo por conta de atraentes incentivos fiscais oferecidos por outros Estados.

Para Roberto, o fato de a redução de ICMS não ter compreendido a cadeia da produção até o lojista, "criou uma verdadeira bagunça tributária" nas relações de compra e venda e não reduz o preço para o consumidor final.

“Se compro um lenço da Presidente, que fica aqui perto, em Mogi-Guacu (SP), a empresa me manda o produto com 7% de ICMS. Se enviar o mesmo lenço, no mesmo dia, para um cliente que fica do lado da Presidente, terei de recolher 18% de ICMS. Isso faz algum sentido?”

Os aumentos de custos para manter a loja aberta também pesaram na decisão de Roberto. De 2009 para 2015, o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) da loja, com cerca de 2 mil metros quadrados, subiu 1.000%. “Foi essa a inflação no Brasil no período? É por causa de tudo isso que estamos fechando a loja”, questiona Roberto.

A boa notícia, segundo ele, é que o ponto comercial pertence à família. No local, o empresário vai erguer um shopping e se dedicar ao ramo imobiliário. Na década de 1980, os negócios da família ocupavam 10 mil metros quadrados na região, entre depósito central e loja. Roberto também chegou a ter meia dúzia de lojas em shoppings e um ponto na rua Oscar Freire.

Roberto possui ainda uma importadora. Da China ele traz meias e lingeries com as marcas próprias Bio Fresh, Bel Cook e Kite Surf. “Nem sei se vamos continuar com a importadora, com esse dólar a R$ 3...”

LEIA MAIS: As lições de uma loja que completa 60 anos na Rua 25 de Março

O Diário do Comércio permite a cópia e republicação deste conteúdo acompanhado do link original desta página.
Para mais detalhes, nosso contato é [email protected] .

 

Store in Store

Carga Pesada

Vídeos

Alessandra Andrade é o novo rosto da SP Negócios

Alessandra Andrade é o novo rosto da SP Negócios

Rodrigo Garcia, da Petina, explica a digitalização do comércio popular de São Paulo

Alexandra Casoni, da Flormel, detalha o mercado de doces saudáveis