Aécio Neves é agora pouco mais que um cadáver político
Entre os tucanos, a decisão do STF que suspendeu o mandato do senador fortalece os que querem desembarcar do governo Temer. No PT, esta terça-feira registrou carta duríssima de Palocci contra Lula e condenação maior de José Dirceu
O senador Aécio Neves foi rebaixado à condição de quase cadáver político. E sua queda contamina seriamente todo o seu grupo no PSDB.
Recapitulando. Mesmo rejeitando o pedido prisão contra ele, feito pela Procuradoria Geral da República, a primeira turma do STF decidiu nesta terça-feira (26/09), por três votos a dois, que o senador perderá o mandato, terá seu passaporte recolhido e deverá cumprir, no período noturno, o regime de recolhimento domiciliar.
Minutos depois da decisão do STF, o ex-ministro Antonio Palocci, preso em Curitiba, divulgava carta na qual anunciava a desfiliação do PT e descarregava seus cartuchos contra o ex-presidente Lula, de quem foi amigo e próximo colaborador.
Disse que Lula "sucumbiu ao pior da política" e reiterou a acusação, feita no início de setembro em depoimento ao juiz Sérgio Moro, deque o ex-presidente coordenou pessoalmente a corrupção na Petrobras.
Lula determinou que a venda de sondas para o pré-sal financiasse a campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010.
Quanto a Aécio, cabe lembrar, ele chegou ao segundo turno na eleição presidencial de 2014 e obteve 48,3% dos votos. Era uma virtual alternativa à então presidente Dilma, que já no início de seu segundo mandato entrou em forte declínio, por fazer o oposto - política econômica do ministro Joaquim Levy - do que havia prometido.
A queda do senador tucano foi agora mais abrupta e dolorida. Independentemente de citações ao seu nome em delações premiadas da Lava Jato, sua reputação entrou em colapso em maio último, com o vazamento de conversa telefônica na qual ele pedia R$ 2 milhões para Joesley Batista, a fim de supostamente pagar seus advogados de defesa.
Liberado pelo corruptor, o dinheiro teve a movimentação monitorada pela Polícia Federal, e foi parar numa empresa de um forte aliado de Aécio em Minas, o senador Zezé Perella.
Na corda bamba e com seu mandato suspenso uma primeira vez por decisão do ministro do STF Edson Fachin, Aécio acreditou que deixaria se se afogar por meio de uma corda política. Aliou-se, então, ao presidente Michel Temer e passou a liderar a ala dos tucanos que procurava permanecer no governo.
O adversário interno dele passou a ser, por isso, o governador paulista Geraldo Alckmin, que, por força da gravidade, aliou-se ao senador Tasso Jereissati, que assumiu a presidência interina do PSDB, por defender o desembarque do governo.
Por mais que no Senado alguns nomes de peso pretendam atacar o STF e insistir na tese de que de que só o plenário teria o poder de decidir sobre Aécio Neves (é o caso do desgastado Renan Calheiros, do PMDB), é difícil evitar que, judicialmente, a única instância de recurso para o senador encrencado passe a ser, agora, o pleno do Supremo, com a decisão submetida aos 11 ministros reunidos.
Enquanto isso, a imagem de Aécio irradia um forte cheiro de contaminação. Por se opor circunstancialmente a Geraldo Alckmin, seu padrinho político e também pretendente à candidatura presidencial do PSDB, quem leva por enquanto a pior é o prefeito paulistano João Doria. Recentemente, ele fez alogios hiperbólicos ao senador.
ROUPA SUJA NO PT
Mas voltemos ao PT e à carta de desfiliação de Palocci. Ele foi extremamente duro nos termos que escolheu. "Pude acompanhar de perto nossa deterioração moral", afirmou. "Até quando vamos acreditar na autoproclamação do "homem mais honesto do país", enquanto os presentes, os sítios, os apartamentos e até o prédio do Instituto Lula são atribuídos à dona Marisa."
Embora não fale apenas em nome da moralidade - o interesse dele é cumprir pena menor em Curitiba - o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil tende a provocar um novo desgaste ao ex-presidente. "Afinal, somos um partido político ou uma seita criada por uma pretensa divindade?"
A direção do PT, como era de se esperar, divulgou nota em que acusa Palocci de "fraqueza de caráter" a ataca a "forma desrespeitosa" com que ele se refere a Lula, aliás já condenado em primeira instância na Lava Jato e réu em seis outros processos.
Ainda no campo petista, esta terça-feira foi trágica para José Dirceu, outro ex-ministro e outro ex-homem de confiança de Lula. O Tribunal Regional Federal de Porto Alegre, que é a segunda instância dos processos julgados por Sergio Moro em Curitiba, ampliou de 20 anos e dez meses para 30 anos a pena que ele deverá cumprir por desvios de dinheiro apurados pela Lava Jato.
Dirceu já esteve preso entre 2015 a maio passado. Voltará à prisão apenas -dizem seus advogados -, se o mesmo tribunal rejeitar os recursos que deverão apresentar em 48 horas.
Essa nova condenação compromete o argumento reiterado há anos pela direção do PT, segundo a qual José Dirceu seria vítima da teoria do "domínio dos fatos" (seu único crime seria o de ter sido superior hierárquico dos que verdadeiramente atuaram em seu nome). As provas para a ampliação da pena foram consideradas inegáveis e robustas.
Mas as sentenças de Porto Alegre também deixam um segundo pacote de dúvidas. Nessa terça, o tribunal absolveu, de um dos processos a que responde, o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto, "por falta de provas".
Moro o havia condenado, nesse caso, com base em delações premiadas, não comprovadas por documentos ou movimentações bancárias.
O sinal amarelo emitido pelos desembargadores é muito claro. Palocci deverá apresentar provas concretas, e não apenas declarações bombásticas, caso queira se ver livre de suas próprias condençaões, com o paralelo emporcalhamento da ficha judicial de Lula.
A verdade, no entanto, é que esta terça-feira terminou com mortos graúdos no campo de batalha. E por mais que os interessados pretendam argumentar em sentido contrário, a política brasileira deixou de ser exatamente a mesma.
FOTOS: Agência Brasil e Estadão Conteúdo