Advogada transforma herança dos pais em negócio de sucesso
Importantes para o desenvolvimento da região Sudeste, as fazendas históricas encontraram uma vocação. Reinventadas como espaço de eventos, chegam a cobrar R$ 20 mil por cinco horas de festa
Quando os pais da advogada Lia Vergueiro da Silva Rosário, 38 anos, herdaram parte de uma fazenda histórica, no interior de São Paulo, há dez anos, ela decidiu que faria daquilo um negócio rentável à família.
Assim como tantas outras, a propriedade, datada de 1793, foi muito importante para o desenvolvimento do Estado quando o café era o maior produto da economia brasileira. Mas o tempo e as disputas familiares levaram o patrimônio rural ao completo abandono.
Lia, porém, estava convicta de que esse não seria o futuro das terras, onde ela passou a infância.
Mesmo envolvida com a intensa rotina de trabalho de um grande escritório de advocacia, ela arrumou tempo para fazer um curso de hotelaria e descobrir como era possível recuperar a fazenda deixado para sua família, em Itú, a 75 quilômetros de São Paulo.
Enquanto Gilberto Vergueiro e Maria Mercedes Pacheco Silva, pais de Lia, gastavam R$ 5 mil por mês para manter a fazenda, a advogada estudava conceitos e metodologias a fim de inaugurar uma espécie de hotel nas terras que pertenceram ao bandeirante Manuel de Borba Gato.
Com 110 hectares, a Fazenda Vassoural primeiro pertenceu a Beatriz de Borba Gato, avó do bandeirante, e segue sob posse da família até hoje, na condição de patrimônio histórico e cultural do Estado de São Paulo.
Originária do plantio de cana-de-açúcar e, posteriormente adaptada ao ciclo do café, o espaço também serviu, mais tarde, para a criação de gado e búfalos até se tornar um reduto histórico em ruínas.
Em 2006, oito irmãos, que representam a nona geração da família Pacheco Silva, herdaram o complexo – entre eles Mercedes.
Com a divisão da herança, coube ao casal um conjunto de 17 hectares, que se tornou objeto de estudo de Lia. A ideia era aproveitar o contexto histórico da propriedade para a construção de uma charmosa hospedaria.
“Cresci naquela colônia convivendo com italianos, e ouvindo o sino tocar às 5h30 para acordarmos, e às 11h para almoçarmos. Para mim, é muito representativo”.
Os quatro anos de pesquisa para o seu trabalho de conclusão de curso mostraram a ela algo inesperado.
Ocorre que a fazenda não tinha porte para o que ela queria. O plano de negócios não fechou justamente, pela falta de infraestrutura, e, sobretudo, pela baixa oferta de quartos.
Por outro lado, Lia identificou uma nova vocação, que se tornou uma tendência muito forte nesse tipo de construção histórica, nos últimos anos: um espaço para eventos.
Em Itatiba, a 70 quilômetros da capital, a Fazenda Vila Rica foi a primeira a recuperar sua estrutura de 1860 para essa finalidade, cobrando a partir de R$ 30 mil pela locação do espaço por cinco horas de festa.
A descoberta veio em 2010, na mesma época em que Lia estava em meio aos preparativos de seu próprio casamento.
“Convenci meu pai a reformar parte do conjunto para realizar meu casamento e testar o potencial da fazenda para esse mercado”.
O investimento de R$ 30 mil na recuperação da tulha - uma espécie de celeiro, onde se costumava armazenar feno e parte da colheita-, a reforma da cozinha e a construção de dois banheiros ficou a cargo de Gilberto.
Lia arcou com a festa e provou que seu plano fazia sentido. Logo após seu casamento, a advogada começou a divulgar a Fazenda Vassoural em sites especializados.
Mas foi exatamente nessa etapa, que a dupla enfrentou o maior obstáculo. Ainda sem contatos no mercado e em busca de parcerias, Lia chegou a pagar R$ 12 mil para que o negócio fosse divulgado em um blog de casamento.
O investimento não gerou o resultado esperado, e naquele ano, eles conseguiram fechar apenas cinco contratos.
Por acaso, as fotos de um deles viralizou na internet, abrindo as portas do mercado para o negócio da família, que vingou em 2013, se tornando um dos espaços mais disputados também para eventos corporativos.
A essa altura, Lia não teve outra opção. Passou a se dedicar integralmente à atividade, com a ajuda de seus pais.
Hoje, são realizados na fazenda cerca de oito eventos por mês, além de festas infantis aos domingos, e ensaios fotográficos –cinco por semana, em média cobrados a R$ 320 por hora ou R$ 6 mil a diária.
Para manter uma boa margem de lucro, eles mantêm uma equipe enxuta de apenas seis funcionários – dois jardineiros, um caseiro, um auxiliar de manutenção e dois auxiliares de serviços gerais.
"Nossos gastos são mínimos, com salários, produtos para piscina e manutenção do jardim", diz.
Além disso, não oferecem nenhum tipo de serviço adicional, como buffet ou decoração – apenas a locação do espaço que sai por R$ 18 mil.
ESPAÇO AGORA É LOCADO POR R$ 18 MIL
Com o sucesso do negócio, Lia apostou também na recuperação do casario (14 chalés) que até o fim de 2016 poderão ser alugados por um valor adicional durante a realização de eventos.
O próximo passo é tirar do papel outro projeto: a recuperação do engenho para a abertura de um restaurante focado em receber famílias com crianças.
Dos primeiros tempos da velha fazenda ainda sobrevivem a senzala, moenda, terreiro, casa-grande e colônia.
O investimento de R$ 400 mil envolve também a construção de um grande parque com brinquedos lúdicos e educativos, que coloquem as crianças em contato com a natureza.
Sem revelar o faturamento, Lia indica que a transformação da fazenda garante uma boa renda para a ela e seus pais, que sonham com a possibilidade de comprar outros lotes do complexo, que seguem abandonados pelo restante da família.
“Encontramos uma maneira de rentabilizar bem algo que poderia ser um peso e sinônimo de despesas”, diz.