Empreendedor terá dificuldades para conseguir crédito em 2015
Incertezas políticas e instabilidade econômica vão piorar – e muito – a condição do crédito para pessoas jurídicas no próximo ano
Todos já sabiam que 2014 seria um ano difícil – a Copa do Mundo e as eleições já eram motivos suficientes para uma freada mais brusca na economia nacional. Os números estão ainda piores, agravados pelos problemas fiscais do governo: o país deve crescer apenas 0,2% neste ano, segundo as últimas expectativas do mercado, divulgadas no Boletim Focus desta semana.
No entanto, mesmo que haja motivos para comemorar o fim do tumultuado 2014, novas razões para temer 2015 começam ganhar relevância. Uma delas é a disponibilidade de crédito, tanto para pessoas físicas como jurídicas. “O ambiente econômico está pior e até mesmo os bancos públicos, que puxaram uma queda nos juros, estão chegando aos seus limites”, diz Miguel de Oliveira, diretor executivo de estudos financeiros da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade).
A semente dessa questão está na taxa básica de juros, a chamada taxa Selic. Determinada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, essa é a taxa que baliza todo o mercado de crédito nacional. A cada 45 dias, especialistas do Banco Central se reúnem para discutir as condições econômicas do país e então definir o número mágico.
Uma alta na Selic representará aumento nos juros praticados aos clientes – sejam pessoas jurídicas ou pessoas físicas. Foi exatamente isso que aconteceu na última reunião do Copom, no dia 29 de outubro, quando a autoridade monetária elevou a Selic de 11% a 11,25% ao ano. A ascensão da taxa básica deve continuar ao longo do próximo ano.
Forçar a alta da Selic pode ser considerada uma iniciativa de proteção da economia nacional. Mas também pode ser interpretada como preocupação. A taxa de juros é um dos mecanismos do governo mais eficientes para controlar a inflação, por meio de uma retração no consumo.
Os juros altos forçam a retração do consumidor que, por sua vez, compra menos. Com demanda menor, os preços tendem a cair. Fica então, teoricamente, menos ameaçador o fantasma da inflação. Na outra ponta quem sofre é o varejo, que vende menos, e o empresariado perde parte da sua capacidade de investimento e crescimento.
É exatamente este cenário que Oliveira, da Anefac, prevê para 2015. “As condições de crédito vêm piorando gradativamente nos últimos meses”, diz.
Isso porque quando as instituições financeiras escolhem emprestar dinheiro, elas estão de olho no futuro. Quanto mais claro e estável o cenário, maior a quantidade de dinheiro que os bancos estão dispostos a emprestar – e menores os juros.
O conturbado processo eleitoral, o cenário político coalhado de denúncias pondo em risco o alto escalão de Brasília e a inflação longe do centro da meta são motivos mais que suficientes para que todos, inclusive os bancos, ponham o pé no freio. “Nesse ambiente, o risco de crédito sobe muito”, diz Oliveira.
MICRO E PEQUENAS EMPRESAS SOFREM MAIS
Em um cenário como este, quem tem menos poder econômico, inevitavelmente, sofre mais. Ou seja, quanto maior a empresa e maior o caixa, menores serão as restrições para a tomada de crédito. Naturalmente, as micro e pequenas acabam em piores condições.
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Ao mesmo tempo, pelo lado da demanda, essas também são as que mais penam. Com o cliente inseguro e desestimulado, surge a necessidade de ofertar melhores condições para aquisição de bens e serviços. Se faltar robustez e dinheiro no caixa, não há muito que se possa fazer para continuar vendendo sem reduzir suas margens.
A propósito, o consultor e educador financeiro da Academia do Dinheiro, Mauro Calil, aconselha aos empreendedores para que nunca reduzam margens, especialmente em momentos como esse. “Não faça nenhum negócio que te dê prejuízo, mesmo se houver os chamados ‘ganhos de visibilidade’”, diz. Apertar os cintos também significa produtividade máxima com custo mínimo. “Seja mais empresário e menos comerciante.”
Calil espera em 2015 uma “quebradeira” de micro e pequenas empresas justamente por esse aperto econômico. “A indústria demite, então o bar na frente da fábrica terá queda de frequência e quem fornece para o bar terá redução nos pedidos, e por aí vai.”
Uma parte das restrições de crédito às micro e pequenas empresas tem a ver com a desorganização e com o pouco profissionalismo das empresas. O presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) disse, em evento recente, que o Brasil ainda enfrenta problemas com o perfil de crédito das micro e pequenas empresas.
João Carlos Natal, consultor financeiro do Sebrae, concorda com Coutinho. “Os bancos endurecem o acesso ao crédito a grupos com alta inadimplência”, diz. “Sabemos que as micro e pequenas acabam encontrando mais dificuldade para conseguir se financiar.”
Por isso nada melhor que se munir das melhores informações para bater na porta de uma instituição financeira em busca de crédito. “A negociação é injusta, os bancos têm todas as informações e, no desespero, o empresário acaba assinando qualquer oferta, que nem sempre é boa para ele.”