Trump seria uma tragédia internacional. E também para o Brasil
Magnata republicano defende o protecionismo e despreza as relações com a América Latina. Barack Obama disse nesta terça (2/9) que ele não está qualificado para governar
Imaginemos que Donald Trump seja o vencedor das eleições presidenciais dos Estados Unidos. Seria uma péssima notícia para a América Latina.
Por mais que ele não tenha elaborado nenhuma proposta específica com relação ao Brasil, é inevitável que os interesses brasileiros sejam prejudicados no mesmo pacote de preconceituosas intenções.
É possível a vitória do milionário republicano e adversário da democrata Hillary Clinton.
A última pesquisa de intenções de voto da rede CNN, divulgada nesta segunda-feira (1/8), coloca Trump oito pontos atrás de Hillary (45% a 37%). Mas são os efeitos publicitários da convenção democrata realizada em Filadélfia na semana anterior.
Por enquanto, a ex-secretária de Estado e mulher do ex-presidente Bill Clinton também desfruta de uma vantagem nas projeções sobre as oscilações futuras do eleitorado.
A pesquisa da Fivethirtyeight diz que ela tem 61,8% de chances de vitória. A Upshot, do jornal New York Times, puxa essa preferência para 70%, enquanto nas bolsas de apostas ela obtém 69,2%.
De onde vem, então, o otimismo dos partidários de Trump?
Eles acreditam na força numérica do eleitor profissionalmente menos especializado, que teme o desemprego como consequência da globalização (empresas que emigram para outros países) e que, ainda, acreditam que a concorrência de produtos estrangeiros enfraquece a economia norte-americana.
Há nisso um miolo irracional do isolacionismo. Trump diz que, caso se feche em si mesma, a economia se fortalece com base no mercado interno. As importações e os investimentos externos se transformariam em pecados a serem evitados.
Essa maneira de pensar atinge sobretudo as relações econômicas dos Estados Unidos com a Europa, China e Japão.
Mas afeta também, em proporção menor, a América Latina, com a qual os norte-americanos construíram nas últimas três décadas uma relação madura de interdependência, não mais baseada apenas na compra de matérias-primas e na venda de industrializados.
Mas o latino-americano, e o brasileiro por extensão, também compõe uma multidão de 11,3 milhões de imigrantes que se fixou nos Estados Unidos. Eles têm sido até agora o alvo preferencial da retórica de Trump.
Visando sobretudo os mexicanos, o candidato os qualifica como imigrantes ligados ao tráfico, ao estupro e à prostituição. Também os culpa pela baixa qualificação profissional que achata os salários como um todo.
Trump também prometeu que expulsaria todos os imigrantes ilegais. Na medida em que um quinto dos chamados latinos não estão em solo americano com documentação regular, é fácil imaginar a dimensão apocalíptica que levaria ao repatriamento forçado de quase 3 milhões de pessoas.
O mais grave, no entanto, está nas questões de comércio. Trump disse que retiraria os Estados Unidos da OMC (Organização Mundial do Comércio). E que romperia com os acordos que integram seu país ao Canadá e ao México (Nafta).
Não permitiria a instalação da Comunidade do Pacífico – feita com 12 países para isolar a China, e que teria, ao lado da Austrália e Canadá, o Japão, o México, Peru e o Chile.
O desmonte dessas organizações multilaterais teriam como efeito imediato a redução do comércio internacional. É claro que os Estados Unidos seriam os primeiros a sair perdendo. Mas também perderiam seus múltiplos parceiros, entre eles o Brasil.
Em 2015, o Brasil exportou para os Estados Unidos US$ 24 bilhões, e importou US$ 26 bilhões.
Mas há nesse raciocínio algo que não funciona na cabeça de Donald Trump. Em junho, o presidente Barack Obama disse que ele conhecia pouquíssimo de questões internacionais. Não sabia direito onde se localizavam os países e não tinha sequer ideia de quais deles tinham arsenais nucleares.
Nesta terça-feira (2/8), Obama disse que Trump não estava qualificado (“unfit”) para governar.
Caso ele seja eleito, seu desconhecimento poderia até ser compensado por esse corpo de excelência que são os cerca de 8.000 diplomatas norte-americanos que trabalham em Washington e em 180 países.
No entanto, faltaria a Trump uma visão geral, capaz de fixar diretrizes, escolher prioridades, reconhecer alianças históricas ou atritos ainda por resolver.
Existe, por fim, uma última vertente sobre o perigo de o exemplo Trump contaminar democracias latino-americanas, entre elas o Brasil. É um raciocínio exposto pelo Buenos Aires Herald, um dos melhores jornais de língua inglesa do continente.
O temor, diz o jornal, está na possibilidade de lideranças populistas crescerem com base num discurso fundamentado no medo. E, diante de um perigo artificialmente construído, essas mesmas lideranças se ofereceriam como salvadoras da pátria.
Esse cenário tem muitos exemplos históricos produzidos pelos próprios latino-americanos. Mas o perigo se ampliaria exponencialmente caso Trump se transforme num modelo a ser copiado. Sobretudo em países sem um Congresso independente ou instituições manipuláveis.
FOTO: Wenn/Estadão Conteúdo