País está sob ameaça de outro rebaixamento e governo não reage
Para a agência Fitch, a probabilidade do Brasil perder o selo de bom pagador é maior do que 50%. Ministro da Fazenda diz que medidas para equilibrar as contas dependem do Congresso
Após a perda do selo de bom pagador pela agência internacional de classificação de risco de crédito Standard & Poor’s (S&P) na quarta-feira (09/09), o governo ainda não anunciou um plano detalhado de corte de gastos e de aumento das receitas por meio de impostos.
Em entrevista coletiva nesta quinta-feira (10/09), o ministro da Fazenda Joaquim Levy disse que as medidas dependem de conversas com o Congresso e devem ser votadas até o fim de setembro.
Antes, a diretora-gerente de ratings soberanos da S&P, Lisa Schineller, disse, em teleconferência que a proposta de Orçamento, contendo déficit primário em 2016, enviada pelo governo ao Congresso há dez dias, foi a peça-chave para a decisão da agência de rebaixar ontem o rating soberano do Brasil de BBB- para BB+, mantendo a perspectiva negativa da nota.
Segundo ela, a agência continua a ver aumento da dívida e maior deterioração fiscal no país, o que poderia levar a um novo downgrade. "Mas podemos mudar a perspectiva para estável quando tivermos menos incertezas", afirmou Lisa.
A diretora de ratings soberanos para a América Latina da agência de classificação de risco Fitch Ratings, Shelly Shetty, disse que a perspectiva "negativa" para a nota do Brasil - que ainda é de grau de investimento - indica que a probabilidade de rebaixamento é "superior" a 50%.
Em coletiva, Levy disse que manterá a meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) em 0,7% do PIB (Produto Interno Bruto, soma de riquezas do país) em 2016. O problema é que ainda não se sabe como isso será feito na prática.
“A maneira de alcançarmos esse resultado virá de conversas e um processo de consulta no Congresso, com as lideranças e a comissão mista de orçamento”, disse Levy.
Cobrado sobre medidas imediatas, principalmente a respeito de quanto pretende arrecadar com impostos (novos ou com aumentos de alíquotas de existentes) e de quanto serão os cortes de gastos do governo, Levy disse que não tem números para compartilhar.
“O governo vai fazer uma iniciativa na área de gestão e vamos ter um conjunto de ações divulgadas e prontas para votação no Congresso até o final de setembro”, disse.
O ministro disse que neste ano o governo “já está cortando na carne” e vai economizar R$ 80 bilhões acima do que foi aprovado no orçamento de 2015. E que no orçamento de 2016 já houve esforço de corte de despesas, inclusive obrigatórias.
Na ocasião, evitou comentar sobre se o governo espera rebaixamentos de outras agências de classificação de risco de crédito – já que o Brasil continua seguro para investidores estrangeiros de acordo com as notas da Moody’s e da Fitch.
Mas disse que o rebaixamento pela S&P pode ajudar o Congresso e a sociedade compreenderem a importância de construir a sustentabilidade fiscal.
“Foi o que aconteceu nos Estados Unidos, em 2011, quando o Executivo e o Legislativo não chegaram a um acordo sobre o teto da dívida pública. A mesma agência (S&P) fez uma avaliação política na época e reduziu a nota, como fez agora no Brasil. O movimento acabou catalisando uma dinâmica positiva nos Estados Unidos, que reduziu o déficit”, afirmou.
Levy reconheceu que a perda do grau de investimento trará impacto negativo nas condições de crédito e na capacidade das empresas se financiarem, crescerem e empregarem.
“Sabemos que o mercado não se tranquiliza com palavras, só com ações”, disse. O ministro afirmou que haverá mudanças no seguro-defeso e venda de imóveis do governo.
REPATRIAÇÃO E IMPOSTOS
O ministro afirmou que haverá reformas estruturais e que mesmo empresários estariam dispostos a pagar impostos para ajudar o Brasil ficar mais forte do ponto de vista fiscal.
Ele comparou a um investimento, no qual a sociedade pagaria um percentual em impostos para receber o retorno quando o PIB voltar a crescer.
Nesse sentido, o que está mais adiantado, segundo Levy é o projeto de lei que regulariza a repatriação de recursos de brasileiros enviados para o exterior.
“Foi enviado ao Congresso e a expectativa é que a votação seja relativamente rápida. O projeto foi construído com cuidado para garantir a proteção de contribuintes que aderirem ao programa, mas também específico sobre o tipo de anistia penal que prevê”, afirmou.
O projeto deve permitir a repatriação de recursos enviados de forma de forma irregular, que não foram declarados, mas não os tenham saído de forma criminosa. A estimativa, segundo o ministro, é que esse montante seja de dezenas de bilhões de reais, que serão tributados em 17,5%.
Depende da aprovação desse projeto o desentrave de outro – que é a reforma do ICMS. Isso porque o dinheiro arrecadado com a tributação de recursos repatriados financiará a transição das alíquotas de ICMS, que hoje é dividida entre os estados.
Com a reforma do ICMS, o governo quer convergir as alíquotas do tributo para o destino, de forma que o imposto que o consumidor paga fique no estado onde ele reside. Desta forma, essa receita estadual pagaria despesas públicas com segurança, educação e saúde e destravaria os investimentos em infraestrutura.
“É uma reforma boa para empresas porque ataca o risco jurídico que as empresas enfrentam, por causa de antigos benefícios fiscais que estão sob a mira do Supremo Tribunal Federal”, disse.
Ele disse que outra reforma importante é a que simplifica o PIS e a Cofins, um imposto indireto federal que atinge todas as empresas e é complicado de ser pago.
“Essa reforma vai atingir três objetivos: a neutralidade fiscal, a simplificação dentro da rotina das empresas, que gastarão menos horas para pagar o imposto e a segurança jurídica, o que fará com que não gere dúvidas”, disse.
A ideia, afirmou, é que esses tributos gerem créditos financeiros aos setores, de forma transparente, que permitam realocação de capital e de mão de obra entre os setores, com neutralidade tributária.
Foto: Agência Brasil
*Com informações de Estadão Conteúdo