Brasil é rebaixado mais uma vez pela Standard & Poor's
A agência avalia que o país deve ter um ano de forte contração econômica. Economista diz que o Brasil regrediu uma década em dois anos
A agência de classificação de risco Standard & Poor's (S&P) anunciou nesta quarta-feira (17/02) que rebaixou novamente a nota de crédito de longo prazo do Brasil - o rating, ou a classificação de risco de crédito do país - desta vez de BB+ para BB, e manteve negativa a perspectiva da nota brasileira.
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Este foi o segundo rebaixamento de nota que a agência dá para o país em um menos de seis meses, já que em setembro foi a primeira a retirar o grau de investimento do país (que funciona como garantia de que o país não dará calote na dívida pública ou um selo de bom pagador). Na ocasião, a S&P colocou o Brasil em perspectiva negativa.
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Desta vez, ao rebaixar a nota do país mais uma vez, a agência manteve a perspectiva negativa, que na prática significa que um novo rebaixamento deve ocorrer, com "probabilidade maior que uma em três", informou. E cita como fatores negativos o risco de reversão de políticas importantes em meio à dinâmica da política brasileira, além da falta de iniciativas políticas consistentes.
A perspectiva da nota do Brasil pode ser revisada para estável "se as incertezas políticas no Brasil forem revertidas para que a execução da política seja consistente e melhore as perspectivas para o crescimento do PIB", afirmou a S&P.
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"Esperamos que estas melhorias possam apoiar um retomada mais rápida que leve o Brasil a sair da atual recessão, o que facilitaria a performance fiscal e daria mais espaço de manobra em meio a choques econômicos".
A nota de crédito do país regrediu uma década em dois anos, disse Carlos Kawall, economista-chefe do banco Safra. "O rebaixamento é muito ruim e o processo de volta ao grau de investimento deve levar 3 ou 4 anos", disse. "Com isso, fica mais urgente a necessidade de serem realizadas reformas estruturais, especialmente relacionadas à área fiscal."
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Na avaliação de Kawall, "com o quadro atual, são maiores de 50% as chances da Argentina ter um rating melhor do que do Brasil em 1 ou 2 anos. O economista leva em contra a possibilidade de o país vizinho concluir acordo com os chamados fundos abutres relacionados à sua dívida, o que o deve mudar sua classificação de "default seletivo" pela S&P e entrar numa escala de notas, com tendência provavelmente ascendente.
Para Newton Camargo Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, o novo rebaixamento veio "bem antes do esperado". "Dentro do quadro de deterioração fiscal e incertezas políticas, havia a expectativa de rebaixamento mais à frente, até junho, mas o corte agora é uma surpresa", disse.
Para o especialista, devem ter pesado para a decisão o quadro fiscal "bastante frágil" e a intenção do governo de instituir uma banda fiscal, de modo a acomodar um novo déficit primário das contas públicas.
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Em termos práticos, Camargo Rosa considera que o novo rebaixamento pela agência, que já considerava o Brasil grau especulativo, adia as condições de recuperação da economia do país. "Isso pode gerar um aumento dos custos para financiamento de investimentos no exterior, o que atrapalha as chances de retomada da economia", avaliou. Para ele, em um cenário otimista, a economia nacional permanecerá estagnada por algum tempo.
O economista-chefe da SulAmérica Investimentos considera que, apesar de alguns indicadores sugerirem que o Brasil atingiu o ponto mais grave da crise, o novo rebaixamento pode forçar a continuação da queda da economia.
EFEITOS
Luis Fernando Horta, economista-chefe da Kinea Investimentos, acredita que apesar de o rebaixamento ter vindo antes do esperado, os efeitos devem ser limitados no mercado.
"Isso pode ter algum impacto na Bolsa, com alguns estrangeiros realocando recursos, mas para juros e câmbio o efeito é pequeno. O que está guiando o mercado local agora é agenda de reformas que poderia ocorrer este ano, mas que na minha opinião tem uma chance muito pequena de sair do papel", comenta.
Para ele, a decisão da S&P não aumenta a pressão sobre o governo da presidente Dilma Rousseff.
"O que pressiona o governo é a atividade fraca e a inflação elevada", afirma. Na avaliação de Horta, o efeito sobre a economia real também é pequeno. "O necessário para a gente sair da recessão é a inflação cair", comenta.
MOTIVOS
Na nota em que informou a decisão de rebaixar mais uma vez a nota do Brasil, a agência avalia que o país deve ter mais um ano de forte contração econômica.
"Com o déficit do governo e a dívida líquida, respectivamente, em cerca de 7% e 60% do Produto Interno Bruto (PIB) durante o período entre 2016 e 2018, acreditamos que não há mais flexibilidade política suficiente para distinguirmos entre os ratings em moeda local e estrangeira no Brasil", disse a agência.
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Na mesma decisão, que ocorre cinco meses após o último rebaixamento, a S&P reduziu também o rating de longo prazo em moeda local de BBB- para BB e rebaixou o rating de curto prazo em moeda local do Brasil de A-3 para B, enquanto a nota de curto prazo em moeda estrangeira permaneceu B. O rating em escala nacional foi rebaixado de brAAA para brAA-. A perspectiva é negativa.
A nota diz ainda que os desafios políticos e econômicos enfrentados pelo Brasil continuam consideráveis e que a S&P agora espera um processo mais longo de ajuste, o que significa uma correção mais lenta na política fiscal.
As agências de classificação de risco de crédito vêm alertando o país em relatório sobre os desafios. A Moody's, que ainda mantém o Brasil com o grau de investimento, esteve recentemente no país para avaliar se houve mudança no cenário político e econômico e pode ser a próxima a alterar a nota brasileira. A Fitch foi a segunda a retirar o grau de investimento do Brasil em dezembro.
O QUE O GOVERNO DIZ
O novo rebaixamento do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor's não alterará a perspectiva de recuperação da economia brasileira no médio prazo, informou há pouco o Ministério da Fazenda.
Em nota, a pasta reafirmou que continua trabalhando para alcançar o reequilíbrio fiscal e criar condições para a retomada do crescimento e assegurou que o governo mantém a capacidade de honrar os compromissos.
A nota destacou que o governo está empenhado na aprovação de mudanças que melhorarão as contas públicas. Para este ano, ressaltou o ministério, as prioridades são a votação das propostas de emenda à Constituição que desvincula parte do Orçamento Federal e que recria a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
A pasta reafirmou o compromisso de enviar uma proposta de reforma da Previdência Social até o fim de abril.
Além das reformas estruturais, o ministério informou que elabora uma proposta que cria um limite para o crescimento das despesas primárias no médio prazo. O ministério também informou que está comprometido com medidas que visam a melhorar a competitividade do país. A pasta cita o aperfeiçoamento de marcos regulatórios e o leilão de concessões em empreendimentos de infraestrutura que pretendem atrair investimentos importantes para a recuperação da economia.
FOTO: Thinkstock
*Com Estadão Conteúdo e Agência Brasil
Atualizado às 19h30