Por que tanto boato sobre a prisão de Lula?
Petistas fizeram vigília na madrugada de segunda-feira (17/10), no prédio do ex-presidente. Mas a Polícia Federal não chegou. Presidente nacional do PT diz ter informações de que prisão já foi decidida
O boato circulou pela última vez a partir da sexta-feira (14/10). Lula seria preso pela Polícia Federal na madrugada de segunda (17/10). Não foi.
Mas se tornou tão intensa a velocidade dos rumores, dentro do Partido dos Trabalhadores e nas redes sociais que, mesmo para os incrédulos, era muita fumaça para nenhum fogo.
Um grupo de simpatizantes se reuniu na madrugada de segunda-feira junto ao prédio em que Lula tem apartamento, em São Bernardo do Campo, dispersando-se apenas por volta das 7h, quando se evidenciou que a Polícia Federal não viria mais buscá-lo.
A mobilização para barrar a prisão partiu de um blogueiro pouco conhecido, chamado Eduardo Guimarães, e de um site menos conhecido ainda, chamado Por Nocaute. Mas teve o apoio do escritor Fernando Morais.
A credibilidade sobre a iminência da prisão ganhou força pelo pedigree petista daqueles que a comentaram.
Rui Falcão, presidente do Partido dos Trabalhadores, durante o fim de semana, disse o seguinte em reunião com militantes:
“A informação que eu tive é de uma fonte respeitável, mas evidentemente não tem uma precisão de data. Existe a suspeita de que pode acontecer na segunda-feira, mas essa decisão de prender o Lula já teria sido tomada.”
Até Fernando Henrique Cardoso tirou sua casquinha, ao ser abordado por jornalistas nesta terça-feira (18/10).
"Eu não gosto de ver ninguém na cadeia, muito menos o Lula. Se vai eu não sei, tomara que não. Mas é o juiz que vai ver. Às vezes, a pessoa faz coisas tão inacreditáveis que o juiz não tem escolha.”
Dilma Rousseff também havia se manifestado, mas no curso de uma boataria anterior, no final de setembro.
Em emissora do governo petista da Bahia, eis a declaração da ex-presidente. "Não acredito que eles cometam esse absurdo. Não porque sejam bons, mas porque acredito que também não são burros."
A PREVISÃO DE UM HABEAS CORPUS
A burrice em questão pode ser entendida de muitas maneiras, do improvável efeito imediato da prisão – multidões indo às ruas e convulsionando o país com a exigência de soltura –ou à própria crença de que Lula seria solto, em poucas horas, por iniciativa judicial.
Esse é um dos nós da questão. Lula é réu por enquanto em três processos, todos eles em primeira instância. Dois estão em Curitiba, com o juiz Sérgio Moro, e um terceiro, em Brasília, na 10ª Vara Federal, cujo titular é o juiz Ricardo Leite.
Bastaria um pedido consistente de habeas corpus, em segunda instância ou em tribunal superior, para que Lula saia da cadeia como um herói injustiçado, e saiam desmoralizados a Lava Jato e o processo de Brasília, no qual o ex-presidente é acusado por obstrução de justiça.
A propósito, o ex-presidente montou para sua defesa uma força tarefa formada por oito conhecidos escritórios de advocacia, que mobilizam em São Paulo, Brasília e Curitiba algo em torno de 20 advogados.
Esse grupo de defensores se reuniu com Lula há algum tempo, em Brasília, justamente para discutir uma reação coordenada em caso de prisão.
Diante de tão espessa barreira, montada junto à trincheira da defesa, uma provável ordem de prisão precisaria de um embasamento de consistência muitíssimo sólida.
Em outras palavras, a prisão de Lula não pode ser intempestiva, um gesto irresponsável e efêmero.
INDÍCIOS E NÃO PROVAS
A defesa aposta na tese da inexistência de provas. É o que diz o próprio Lula, em longo texto publicado na Folha de S. Paulo desta terça-feira (18/10). “Estão à procura de um crime, para me acusar, mas não vão encontrar”, diz ele.
A prova em questão seria aquilo que no direito criminal norte-americano os advogados chamam de “smoking gun”. Ou o revólver fumegante, pouco depois de o homicida puxar o gatilho.
No caso de Lula seriam papéis assinados, em que reconhecesse que o sítio de Atibaia, o apartamento do Guarujá e o guarda-móveis de sua mudança de Brasília foram pagos por empreiteiras, em troca de favores que ele prestou quando presidente.
Ora, essas provas não existem, e a Lava Jato sabe disso. O que existem são os numerosos indícios – segundo a mesma lógica das sentenças do Mensalão - que formam, em conjunto, a convicção de que o réu chefiou ou participou de uma organização criminosa que sangrou a Petrobras.
O nervosismo dos advogados de defesa de Lula está no fato de tais indícios serem cada vez mais numerosos. Um dos últimos exemplos está na recente boa vontade de Emílio Odebrecht para com os promotores de Curitiba.
Pai de Marcelo Odebrecht, preso desde junho do ano passado, o patriarca Emílio entregou o sigilo de seus e-mails e mensagens por celular, em que se menciona perto de 50 vezes um personagem designado como “O Amigo”.
A Polícia Federal chegou a 100% de certeza de que se trata justamente de Lula, uma conclusão agravada pelo fato de “O Amigo” ter recebido R$ 23 milhões em propina.
Digamos que é uma quantia bem maior que o valor dos dois imóveis (o apartamento do Guarujá e o sítio de Atibaia) que desencadearam a curiosidade da polícia, na investigação sobre as relações de Lula com empreiteiras.
Ou então no que está saindo do monitoramento que a polícia e o Ministério Público estão concluindo sobre os negócios da Odebrecht em Angola, a partir de quantias que a empreiteira destinou – sem razões técnicas que as justifiquem –a Taiguara Rodrigues, sobrinho da primeira mulher de Lula. O passo seguinte seria supor que Taiguara foi um simples laranja do ex-presidente.
FOTO: Alex Silva/Estadão Conteúdo