Gastos com servidores são o maior peso das contas públicas
Pesquisa mostra que aumentos salariais e pensões do funcionalismo pesam no orçamento nacional tanto quanto investimentos em saúde e educação.
Os salários médios do funcionalismo público subiram, em termos reais (acima da inflação), 33% entre janeiro de 2003 e janeiro de 2016, enquanto na iniciativa privada esse aumento foi de 10%, segundo pesquisa do consultor legislativo do Senado, Marcos Köhler.
Como reflexo desses aumentos, houve um crescimento real de 64% dos gastos com o pagamento das aposentadorias e pensões dos servidores estaduais entre 2009 e 2015, de acordo com levantamento feito por Ana Paula Vescovi, secretária do Tesouro Nacional.
MELHORES SALÁRIOS
Os resultados do estudo de Köhler sobre salários, feito com base em cruzamento de dados oficiais, confirmam as queixas do governo federal, governadores e prefeitos sobre o crescimento do custo da folha salarial dos servidores nas despesas públicas.
Em 13 anos, pulou de cerca de R$ 880 para R$ 1.650 a disparidade média entre o que ganha um funcionário do Estado e um profissional do setor privado, desmontando um dos mitos alimentados em relação à carreira pública.
O governo do presidente Michel Temer tenta aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que limita os gastos públicos a fim de atrelar o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.
A medida tem por objetivo impedir, entre outras questões, aumentos reais do crescimento da folha de pagamento do serviço público, contendo assim a explosão dos déficits orçamentários que vem sendo registrada nos últimos anos.
O estudo comparativo de Köher, com dados compilados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que o rendimento mensal médio em 12 meses do funcionário público era de R$ 2.897 no início de 2003.
O crescimento, quase linear, só registrou três quedas no período, nos anos de 2004, 2014 e 2016, quando atingiu R$ 3.860 - alta de 33,24%. Na iniciativa privada, por sua vez, o crescimento dos salários foi mais lento e menor, subindo de R$ 2.012 no início de 2003 para R$ 2.210 em janeiro deste ano, um aumento de 9,84%.
DIFERENÇA CRESCENTE
O levantamento indica que a diferença entre o rendimento médio do setor público e o privado entre 2003 e 2016 quase dobrou, com intervalos de queda no segundo ano do governo Lula, em 2004, e no início do segundo mandato de Dilma Rousseff, em 2014. A diferença salarial entre as categorias de trabalhadores atingiu 75% - era de 44% no início da série.
Outro dado ilustra o peso do custeio dos servidores. Os empregados das 10 categorias com maiores vencimentos no setor público, que somam um contingente de 255 mil pessoas - nas três esferas de governo - ganham em média R$ 272 mil anuais. Os cerca de 36,8 milhões de empregados da iniciativa privada recebem por ano R$ 23,3 mil em média.
Para o consultor, o calcanhar-de-aquiles dos problemas fiscais que a União e os Estados enfrentam é a questão salarial do funcionalismo. Há um impacto direto na previdência pública, já que o benefício da aposentadoria é pago, de modo geral, em sua integralidade.
Köhler defende que a medida mais eficaz para acabar com os sucessivos déficits orçamentários seria o congelamento temporário de aumentos de servidores, a fim de reduzir o endividamento público.
OPOSIÇÃO
Uma mudança constitucional que contemplasse essa medida, destacou o consultor, seria politicamente mais simples de aprovar. Ele argumenta que a oposição à PEC do Teto usa a alegação de que haverá redução de investimentos também nas áreas da Saúde e de Educação com sua eventual introdução.
"A regra (do congelamento salarial) seria mais simples, não teria oposição popular e seria mais fácil verificar o cumprimento dela, além de ser menos injusta e menos perigosa", avaliou Kölher. O consultor foi cedido para atuar no gabinete do senador José Aníbal (PSDB-SP).
GASTOS SALTAM DE R$ 47 BI PARA R$ 77 BI
Passando por crise financeira sem precedentes, os Estados tiveram de arcar com o crescimento real de 64% dos gastos com o pagamento das aposentadorias e pensões de seus servidores entre 2009 e 2015.
O levantamento, apresentado pela secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, foi feito a partir de dados encaminhados ao Ministério da Fazenda pelos próprios Estados.
A secretária reforçou a necessidade "inexorável" de controle dos aumentos salariais, que "trazem impactos atuariais" nem sempre percebidos. Ana Paula lembrou que, na média, o número de servidores ativos nos Estados permaneceu estável entre 2009 e 2015, mas as despesas com inativos saltou de R$ 47 bilhões para R$ 77 bilhões no período.
A explosão do déficit previdenciário está no centro da crise estrutural que os governadores estão tendo de administrar em meio à recessão da economia, que derrubou a arrecadação de impostos.
Os secretários de Fazenda dos Estados já começaram a discutir, nos últimos dias, medidas que possam ser adotadas para retardar a aposentadoria de seus servidores e restringir os benefícios, além de alternativas para aumentar a receita. Os números compilados pelo Tesouro mostram que as despesas dos Estados com os inativos são, em média, 2,01 vezes superiores à arrecadação previdenciária anual.
No Rio de Janeiro, Estado com a pior situação, os gastos superam em 3,39 vezes as receitas. De acordo com o Tesouro, ao longo desses anos, a folha dos Estados registrou um crescimento acima da inflação em 43%, enquanto o serviço da dívida subiu no período 15%.
A evolução dos gastos com pessoal aponta para forte aceleração nesses seis anos, saltando de 4,85% para 5,38% do Produto Interno Bruto (PIB).
"Os Estados estão preocupados em se voltar também para reformas estruturais, como a da Previdência. Temos preocupação de fazer convergir as regras", disse a secretária. "Existe, sim, um espaço para protagonismo estadual, e também municipal, nessas questões, e acho que isso tem de ser considerado."
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