Eleições provocam um brutal emagrecimento do PT
Partido elegeu 265 prefeitos, em vez dos 634 em 2012. Eleitores rejeitaram a tese do "golpe" e responsabilizaram os petistas pela corrupção e pela crise econômica
Ao fechar os cálculos sobre o desempenho dos partidos na noite deste domingo (02/10), a Justiça Eleitoral possibilitou uma única e dolorosa conclusão: as eleições municipais foram desastrosas para o Partido dos Trabalhadores, que perdeu quase 60% de suas prefeituras. Passou de 634, em 2012, para 265.
Nenhum outro partido teve prejuízos tão eloquentes. Nos mais de 5,5 mil municípios brasileiros, o PSDB elegeu 15% a mais de novos prefeitos, o PTB, pouco mais de 12%, o PSD, 8,5% e o PR, 7%. O PMDB continua o partido com mais prefeituras (1.029), ligeiro crescimento de 1,2%.
A tragédia petista não está apenas nos números. Está sobretudo no peso político que eles representam. Foi um único prefeito de capital, Marcus Alexandre, na pouco significativa Rio Branco (AC), em lugar das quatro em 2012.
Das 55 cidades que disputam o segundo turno no próximo dia 30, o PT estará numa única capital, Recife, mas apenas como figurante, já que o primeiro colocado, Geraldo Júlio (PSB) já tem 49,3% dos votos assegurados.
O Nordeste era a região de maior implantação petista. Recebeu durante a campanha a participação pessoal do ex-presidente Lula. Entre as capitais com candidatura própria, no entanto, em Fortaleza e Natal o partido ficou em terceiro lugar. Em Maceió, ficou em quinto.
Outra base regional histórica do PT é o ABC paulista, agora também com péssimos resultados. Ficou de fora do segundo turno em São Bernardo e está em situação desconfortável em Santo André. Eram duas de suas prefeituras. Diadema não terá petista na votação do dia 30.
E há sobretudo o caso óbvio de São Paulo, onde o candidato à reeleição Fernando Haddad teve a pífia votação de 16,7%.
Em resumo, a queda da penetração eleitoral do PT foi imensa e, com certeza, prenuncia maus resultados em 2018, quando serão eleitos governadores, deputados e senadores.
Mas há outras circunstâncias importantes. A tese do “golpe”, como sinônimo do impeachment de Dilma Rousseff, simplesmente não prosperou. Se fosse o caso, a sociedade teria manifestado um comportamento eleitoral oposto, votando maciçamente em solidariedade ao partido que teria sido a suposta vítima.
Existe em seguida a falta crônica de humildade, que bloqueia, dentro do PT, qualquer operação coletiva de reconhecimento dos erros.
O principal deles está na longa recessão, com 12 milhões de desempregados, a inflação agora decrescente e a perda por três anos consecutivos do dinamismo econômico (PIB estagnado em 2014 e em crescimento negativo em 2015 e 2016).
Nenhuma declaração ou documento - do Planalto, da equipe econômica ou da direção do partido - evocou as barbaridades cometidas na economia ou assumiu a responsabilidade por elas.
A linguagem tem consistido, ao contrário, em atribuir a crise a fatores externos (preço do petróleo, crescimento menor da China) que outros emergentes absorveram sem maiores traumatismos.
E existe, por fim, o longo capítulo da Lava Jato, sobre o qual o PT reage de duas maneiras inapropriadas e politicamente desonestas.
Diz que as acusações são seletivas e unilaterais, porque atingem preferencialmente o PT ou seus dois ex-aliados (PMDB e PP), quando deveriam também varrer do horizonte o PSDB e outras siglas da antiga oposição.
É um argumento desonesto e falacioso. Há 28 meses as investigações de Curitiba estão centradas na Petrobrás, que foi em 2003 tomada de assalto por um grupo do qual os tucanos e associados estavam ausentes.
A outra reação à Lava Jato consiste em considerá-la como uma conspiração do Judiciário contra o partido e contra os planos de levar Lula novamente em dois anos à Presidência da República.
Dentro dessa conspiração estariam também a grande mídia, a “elite rentista” e os setores da sociedade supostamente inconformados com a ascensão social de 37 milhões de brasileiros arrancados da pobreza.
É claro que ninguém admite que a recessão mandou esses brasileiros de volta à situação anterior.
O que as eleições municipais demonstraram é que o Partido dos Trabalhadores construiu essa complexa retórica para uso exclusivamente interno. Ele gostaria que a sociedade também comprasse suas versões, mas ela não as comprou.
A sociedade aproveitou a primeira oportunidade – as urnas – para transmitir sua mensagem de descontentamento. E, por meio dos resultados eleitorais, transformou o PT de grande partido em partido de porte médio, que poderá minguar mais ainda, caso seus dirigentes não façam a recalibragem radical na maneira pela qual enxergam a sociedade e a si mesmos.
FOTO: Ricardo Trida/Estadão Conteúdo