Cassação de Temer pelo TSE é tragédia que não vai acontecer
Tribunal começa nesta terça (04/04) julgamento da ação que acusa a chapa Dilma-Temer por abusos nas eleições de 2014. Herman Benjamin (à dir.) é o relator do processo
O Tribunal Superior Eleitoral começa a julgar, a partir desta terça-feira (04/04), o processo que pode, teoricamente, cassar o presidente Michel Temer e tirar os direitos políticos da ex-presidente Dilma Rousseff.
Mas nada disso deverá por enquanto acontecer. A cassação de Temer geraria uma intensa tempestade institucional.
Pela Constituição, seu sucessor deveria ser escolhido pelo Congresso, onde hoje a prioridade é escapar com vida à Lava Jato. Leia-se: as composições por um sucessor seriam orientadas pela necessidade, do ponto de vista deles, de anistiar a corrupção.
É justamente o que não interessa a ninguém. Nem mesmo ao ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, segundo informou nesta quinta-feira (30/03) a blogueira Helena Chagas, que foi ministra da Comunicação de Dilma.
O que ela escreveu: Lula “torce para que o TSE mantenha Temer onde está. Ainda que não admitam, os estrategistas do PT acham que a cassação do peemedebista nos próximos meses embaralharia de tal forma o jogo político que até as eleições de 2018 entrariam em zona de risco.”
Foi mais ou menos o que também escreveu na véspera, em O Globo e na Folha de S. Paulo, o influente colunista Elio Gaspari.
Para ele, destronar antecipadamente Temer despertaria a sanha de soluções políticas aventureiras que poderiam ameaçar até o calendário da sucessão presidencial de 2018.
O próprio Temer tem abertamente declarado que, em caso de decisão a ele desfavorável no TSE, ainda caberiam a seu favor muitos recursos.
AS CARTAS NA MANGA DE TEMER
Mas o presidente traz certas cartas na manga e saberá usá-las no bom momento. Vejamos o próprio TSE, que é formado por sete ministros, três dos quais (Gilmar Mendes, Luís Fux e Rosa Weber) são também ministros do STF.
Pelas previsões do Planalto, já seriam quatro os votos contra a cassação. Seriam os votos dos três ministros do STF e de Napoleão Nunes, ministro do STJ alçado àquele tribunal em agosto do ano passado.
Quanto aos dois outros ministros –eles têm, estatutariamente, um mandato de dois anos -, Henrique Neves deixa o cargo no próximo dia 16, enquanto Luciana Lóssio, considerada petista e próxima de Dilma, sairá no início de maio.
Então, no capítulo dos jeitinhos, Temer já indiciou para o lugar de Henrique Neves o especialista em direito eleitoral Admar Gonzaga, que havia anteriormente passado pelo TSE (2013-2015).
O presidente do tribunal, Gilmar Mendes, é visto como um simpatizante ativo da tese de que Temer não pode ser afastado, bem mais por questões de estabilidade política e não tanto pelas pendências sobre o financiamento da campanha dele e de Dilma em 2014.
Gilmar estava sendo pressionado a não postergar o início do julgamento. O relator da matéria, ministro Herman Benjamin, causou recente furor ao interrogar Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira de mesmo nome, e obter detalhes sobre o Petrolão que não haviam ainda vazado dos inquéritos hoje no STF, em mãos do ministro-relator Edson Fachin.
A AÇÃO DE SUSPENSE NO DRAMA DO TSE
A impressão até há pouco generalizada era a de que o relator do processo, Herman Benjamin, tendia a pedir a cassação pura e simples da chama Dilma-Temer, e que era este o fio condutor das 1.086 páginas do relatório que ele distribuiu aos demais ministros na semana passada.
Mas eis que, na edição desta quinta (30/03), a Folha de S. Paulo traz reportagem baseada em ministros que já leram o documento e que informam algo inusitado.
Herman Benjamin, dizem eles, afirma não ter elementos para acusar Dilma e seu vice de saber que parte do dinheiro repassado para a campanha vinha de caixa dois.
Por isso, sugere que a ex-presidente e seu sucessor sejam punidos, mas não tenham os direitos políticos cassados.
Os advogados de Dilma esforçam-se para demonstrar que a campanha presidencial de 2014 teve um só orçamento para a chapa vencedora nas urnas.
É uma maneira de dizer: se for para Dilma afundar, que Temer também afunde junto.
Os esforços dos advogados de Temer vão, como era de se esperar, em sentido oposto. Argumentam que a ex-presidente e seu vice tiveram, cada um, sua própria campanha. Com isso, empurram para o colo de Dilma o que se constatou de comprometedor.
Exemplos: os R$ 16 milhões em caixa dois para o marqueteiro João Santana, os R$ 50 milhões da Odebrecht como “pagamento” pela Medida Provisória sobreo Refis (dívidas tributárias após a crise de 2008) e, sobretudo, a acusação de que Dilma e o PT receberam em caixa dois R$ 25 milhões para “comprar” os partidos que integrariam a coalizão e dariam a Dilma mais tempo de TV.
Temer tem como argumento em sua defesa o duplo estatuto que exerceu em 2014. Se de um lado ele foi o vice de Dilma, de outro ele continuou como presidente do PMDB. E foi com esse estatuto que ele pediu dinheiro para todos os candidatos do partido, inclusive para Paulo Skaf, que teria recebido R$ 4 milhões em caixa dois, ao concorrer a governador em São Paulo.
Foi exatamente a mesma função exercida pelo senador Aécio Neves, também em 2014. Foi candidato à Presidência e adversário de Dilma, mas também pediu dinheiro para o PSDB, partido do qual era e ainda é presidente.
É por isso que o procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino – e a informação está nesta quinta na Folha de S. Paulo – diz não existirem elementos para afirmar que Temer cometeu atos ilícitos ou que esteja vinculado às informações entregues ao ministro Benjamin por Marcelo Odebrecht.
Em novembro de 2014, derrotado por Dilma, Aécio Neves entrou no TSE contra a chapa vencedora, acusando-a de abuso econômico que finalmente a Lava Jato comprovou, mas em termos bem mais dramáticos: a Petrobras foi saqueada em nome da manutenção do projeto político do PT.
Agora, o PSDB – que é o autor da ação – argumenta em suas considerações finais que Dilma pecou, o partido ressalva que ela não envolveu Michel Temer no pecado.
Qualquer que seja o desfecho do caso, é possível que ele seja empurrado até 2029 ou mais que isso.
Os advogados de Dilma querem se manifestar sobre os depoimentos de Marcelo Odebrecht, e os advogados de Temer acreditam que alguns ministros pedirão vistas do processo. Sem prazo regimental para formar opinião e devolvê-lo.
Estamos, então, diante do roteiro de uma tragédia política – a queda de um segundo presidente no mesmo mandato – que tem tudo para não acontecer de verdade.
FOTO: Valter Campanato/Fernando Frazão/Agência Brasil