Candidatura presidencial de Lula é escudo à Lava Jato
Ex-presidente quer manter o debilitado PT em evidência ao bater na tecla de que é vítima de uma conspiração da Polícia Federal, do MPF e do Judiciário
A história está sendo contada da seguinte maneira: Temer e os “golpistas” afundaram o país na crise, e apenas Lula, na presidência do Partido dos Trabalhadores e candidato a um novo mandato ao Planalto, terá meios para reverter essa trágica situação.
É no mínimo bizarro. Mas é justamente essa a linguagem pela qual o ex-presidente da República e Rui Falcão, o ainda presidente nacional de seu partido, fazem o diagnóstico da etapa atual da crise.
Com uma agravante: já que Lula é réu em cinco processos, três deles em Curitiba, uma candidatura presidencial serviria como freio aos supostos desmandos persecutórios da Lava Jato.
O enrosco judicial de Lula justificaria a antecipação da candidatura. Ela poderá se oficializar entre 7 e 9 de abril, quando o PT fará seu 6º Congresso partidário.
Pelo calendário gregoriano e eleitoral, lembremos, a sucessão de Temer será disputada apenas em outubro de 2018, com a oficialização das candidaturas no mês de junho.
Há nesse comportamento duas pressas embutidas uma na outra. A primeira e mais simples está no projeto petista de lançar uma candidatura própria, rejeitando a possibilidade de apoiar alguém como Ciro Gomes (PDT).
A segunda pressa é mais complicada. Procura manter o PT unido, evitando uma debandada semelhante à que ocorreu com o Mensalão. Procura também evitar que alguma liderança interna possa crescer, ao acusar Lula pela implosão ética do partido, após os desvios da Petrobras.
E, sobretudo, há a ideia estapafúrdia de que, unido em torno de Lula, o PT dissuadiria a Justiça Federal em Curitiba e Brasília de uma ou muitas condenações, que, se confirmadas em segunda instância, bloqueariam a candidatura, em razão da Lei da Ficha Limpa.
UMA "CONSPIRAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS"
Vejamos de que maneira se constrói a narrativa segundo a qual Lula é vítima de uma conspiração, liderada por setores do mercado e da mídia que agora reagiriam às políticas de inclusão social praticadas em 13 anos pelos dois presidentes petistas.
Na penúltima quarta-feira (11/01), em ato convocado em Salvador pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Lula anunciou que exortaria deputados e senadores petistas a investigarem a “acusação” de que os Estados Unidos estavam por detrás das operações da Polícia Federal e do Ministério Público que tentam pegá-lo.
Essa teoria da conspiração não tem nem pé, nem cabeça. Mas ela faz sentido na cabeça de militantes amestrados.
Lula poderia ser mais explícito sobre as informações que supostamente dispõe. Por exemplo, em entrevista coletiva aberta à grande mídia – e não apenas aos blogueiros petistas que costumam entrevistá-lo.
Mas o ex-presidente deixou de conversar com a mídia não-engajada em setembro de 2013. Foi quando eclodiu o escândalo por tráfico de influência envolvendo Rosemary Noronha, ex-chefe do gabinete paulistano da Presidência e, segundo a Folha de S. Paulo, amante do próprio Lula.
Ela é hoje réu por improbidade administrativa e está com os bens bloqueados. Mas na época os advogados de Lula recomendaram que, para que o caso fosse esquecido, a cortina de silêncio precisaria ser absoluta.
Com a operação bico fechado, Lula desde então não foi entrevistado por repórteres de grandes jornais, sites apartidários ou emissoras de televisão.
Essas mídias passaram a ter como única opção a cobertura de atos públicos dos quais Lula participa. E nessas ocasiões, diante de uma plateia favorável, ele simplesmente pode dizer o que bem entende, sem ser contestado.
É MUITO MALUCO QUERER PRESSIONAR O JUDICIÁRIO
Vejamos a candidatura presidencial como pressão sobre o Judiciário. A hipótese de tal pressão produzir bons resultados é um antigo atavismo petista.
A versão mais caricatural quase surgiu em 2013, com a prisão de José Dirceu, ex-presidente do PT e ex-ministro da Casa Civil. Os advogados dele conseguiram abortar a ideia maluca de uma manifestação militante, que cercaria o Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir a suspensão de sua pena no Mensalão.
Em outras palavras, e em termos atuais, uma candidatura precocemente lançada de Lula não intimidaria juízes federais. Como também não o faria caso ele fosse candidato a secretário geral das Nações Unidas ou ao papado da Igreja Católica no próximo conclave.
Qualquer plano eleitoral mais ambicioso estaria desencorajado pelas eleições municipais de outubro último, quando o PT, com a sangria eleitoral provocada pela recessão de Dilma e pela Lava Jato, conquistou apenas 256 das 630 prefeituras que tinha.
Mas esse profundo pessimismo deu uma virada em 12 de dezembro último, com uma pesquisa do Datafolha na qual Lula aparece com 25% das intenções de voto no primeiro turno das eleições presidenciais de 2018.
Ele seria apenas derrotado, no segundo turno, por Marina Silva. Venceria no segundo turno os três nomes fortes do PSDB.
O único e grande senão: Lula é rejeitado por 44% dos entrevistados. São os que não votariam nele “de jeito nenhum”.
A única interpretação na época cabível era de que o PT, sem ter sido beneficiado por eventos de mérito próprio, beneficiou-se da impaciência dos brasileiros com a lentidão pela qual Michel Temer está tirando o país da crise econômica.
Com um quadro de crescimento da economia, a preferência por Lula voltaria a afundar. É por enquanto o grande ponto de interrogação que serve de apoio para todas as conjecturas.
FOTO: Marcelo Casall Jr / Agência Brasil